"There's a fear I keep so deep / Knew it name since before I could speak (...) If some night I don't come home / Please don't think I've left you alone"- Keep The Car Running, Arcade Fire

segunda-feira, 28 de março de 2011

All That You Can't Leave Behind

Muita gente alardeou por aí. “É uma volta às raízes”; outros, mais comedidos, sentenciaram. “É apenas um bom disco”. Mesmo assim, o falatório em relação a “All that you can’t leave behind”, décimo álbum de estúdio do grupo irlandês U2, lançado em 2000, não chegou a lugar nenhum. Por quê? É um CD irregular, mas com algumas canções que conseguiram jogar – novamente – uma luz sobre a carreira do conjunto, sempre marcada pela renovação... Fosse ela verdadeira ou falsa.
O quarteto vinha de um álbum que, erroneamente, foi divulgado como eletrônico, “Pop”, de 1997. Ok, continha lá os seus “blips e poins”, mas, acima de tudo, apresentava faixas normais, orgânicas, prontas para alegrar tanto casaizinhos apaixonados como roqueiros ecléticos.
Mas o papo aqui é outro. Uma música, aliada a um clipe estiloso, acabou empurrando o disco para os holofotes da mídia: “Beautiful Day”, canção que abre o álbum. Começando com uma mistura de cordas e guitarras que parecem teclados – ou vice-versa –, logo a voz de Bono Vox e a batera simples de Larry Mullen Jr. Entram em cena, organizando as “preliminares musicais” para que, em seguida, o guitarrista The Edge e o baixista Adam Clayton deitem o cabelo num refrão explosivo, de levantar estádios – Não me deixe mentir, Morumbi! Posso estar errado, mas acredito que a canção não vai sair nunca mais do repertório da banda. Saca um hit planetário? Por aí. E tem outra. Pensando em se casar? Escolhendo canções da Celine Dion ou do “grande” Kenny G para a cerimônia? Esqueça. Uma linda faixa para um lindo dia. É disso que você precisa. Vai pelo tio Hugo aqui...
“Stuck in a moment you can’t get out of”, segunda música do álbum, é uma quase balada com acentos gospel. Não se assuste: o gospel aqui não é aquele praticado por religiosos malucos que conversam com Deus como se ele fosse surdo. Estamos falando da “Igreja Bono Vox da Santa Autoajuda” – entenda como quiser. Como pastor, Bono tem uma qualidade perigosa. Consegue convencer você sobre o que ele está pregando/cantando. “I'm not afraid of anything in this world/There's nothing you can throw at me that I haven't already heard/I'm just trying to find a decent melody/A song that I can sing in my own company”, declara ele no começo da faixa, sabendo que as ovelhas irão acompanhá-lo fielmente.  
Depois do momento fofo, duas canções prontinhas para os shows do quarteto. “Elevation” e “Walk on”. The Edge toca alto no refrão da primeira, que também serve para mostrar que o lado sexy da voz de Bono continua por aí, vivo e quicando. Barulheira sob medida para as boates mais ecléticas... E para todas as casas de strip-tease que tenham um DJ antenado com o que rola. Com “Walk on”, o lance é um pouco diferente. Bonita de cabo a rabo, a música é um exemplo do que o grupo pode fazer quando está muito inspirado: emocionar. Guitarras lindonas? Tem. Baixo e bateria preenchendo tudo com bom gosto? Yes, sir. Bono cantando pra cacete e presenteando os ouvintes com uma letra cheia de lirismo? Principalmente. “And love is not the easy thing/Is the only baggage that you can bring/Love is not the easy thing/The only baggage you can bring/ Is all that you can't leave behind". Vale mencionar que a banda fez um vídeo lindão da música, no Rio de Janeiro. Rapaziada “esshperta”, essa.
Confesso que “Kite”, próxima faixa do CD, não é das melhores, em relação ao instrumental do conjunto. Mas a letra é um achado, com uma bela mensagem sobre despedida. “I want you to know/That you don't need me anymore/I want you to know/You don't need anyone, anything at all/Who's to say where the wind will take you/Who's to say what it is will break you/I don't know which way the wind will blow/Who's to know when the time has come around/I don't wanna see you cry/I know that this is not goodbye”.
O disco termina com duas trincas de canções bem distintas. “In a little while”, “Wild Honey” e “Peace on earth” fazem parte do grupo das boas faixas. Na música que inicia a sequência,  uma letra de amor casa direitinho com a batida da canção – bem diferente em relação aos padrões U2, aliás. Na que vem em seguida, outra declaração de amor, mas com uma pegada mais descontraída. Deve ser uma ótima canção para ouvir dirigindo, “on the road”. A última, “Peace on earth”, é uma música que soa muito, muito sincera. Bono e a banda abandonam aquele tom grandioso presente em grande parte de sua obra e partem para um papo intimista com o ouvinte. O vocalista parece realmente cansado de tanta tristeza, tanta dor, e pede que Jesus transmita aos homens da terra uma simples – mas importante – mensagem: paz na terra. É pretensioso pra caramba, principalmente se você, assim como eu, interpretar que a mensagem divina é passada à humanidade através de Bono. Mas, tudo bem. Já que ninguém mais quer mudar o mundo através do poder de uma simples canção, o vocalista assume essa tarefa. Desta vez, com sucesso. Com o tom que um assunto como esse merece. Esqueça a ironia destes tempos, reflita sobre a faixa e responda a si mesmo: vale a pena se transformar em um monstro para que o monstro não o destrua?
“When I look at the world” apresenta aquela mesma batida manjada que Larry Mullen Jr. cisma em repetir. Por falar nisso, essas poucas audições que eu tive, em relação ao grupo, serviram para sacar que a força do quarteto está mesmo na guitarra de The Edge e na voz e letras de Bono. Larry e Adam Clayton, o baixista, ajudaram a criar o “som U2”, não há dúvidas. Mas na prática, são apenas ótimos coadjuvantes. Tudo bem que, em muitas situações, é melhor não tocar nenhuma nota do que tocar todas. Mas ficar sempre apagado também não é nada legal. Pode ser apenas um achismo bobo de minha parte. Mas que parece, ah, isso parece. “New York”, penúltima do álbum, começa como uma verdadeira homenagem ao “bardo maldito” de Nova Iorque – tem clichê maior do que este? –, Lou Reed, que já foi o homem de frente da banda Velvet Underground. Bono emula “tia Lou” na primeira parte da canção, de forma perfeita. Depois, a canção vai crescendo, até desaguar num refrão agitado. Mesmo assim, nada demais. Por último, temos “Grace”, faixa lentinha que propõe aos ouvintes uma dissertação poética sobre a palavra graça – seus significados, seu poder etc. Uma música com vibrações positivas, mas uma péssima escolha para fechar um CD.
“All that can’t leave behind” é um disco de boas intenções. Mas é aquilo: disso, o inferno está cheio.   
   


Rapaziada, é o seguinte: nossa próxima parada é o Brasil!

Por Hugo Oliveira







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