"There's a fear I keep so deep / Knew it name since before I could speak (...) If some night I don't come home / Please don't think I've left you alone"- Keep The Car Running, Arcade Fire

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Foi assim: Festival Internacional de Benicàssim, 2010

Sou fanático por música. Você que acompanha o blog já deve saber, é claro. E para pessoas como eu, o paraíso tem nome. Na verdade, nomes: Coachella, Reading Festival, T in the park, Glastonbury, Lollapalooza e FIB, entre outros. Os famosos festivais de verão da Europa e dos Estados Unidos atraem aficcionados do mundo inteiro que, ávidos por novidades e nomes já consagrados do cenário musical mundial, aceitam passar por inúmeros perrengues, roubadas e similares. Tudo pela música, camarada. O resto é resto.

Acampei na cidade de Benicàssim, na Espanha - 3 horas de Barcelona -, durante 5 dias, em 2010 - 14, 15, 16, 17 e 18 de julho. O Festival Internacional de Benicàssim, FIB, naquele ano, era encabeçado por nomes como Kasabian, Vampire Weekend, The Prodigy e Gorillaz, além de outras dezenas de bandas e artistas interessantes - Ray Davies, Hot Chip, The Specials, Pil, Echo & The Bunnymen, Julian Casablancas, Brendan Benson, Foals, Ash, The Cribs, Two Door Cinema Club, Klaxons, Charlotte Gainsbourg e mais umas sessenta atrações.

Minha ideia inicial era dar um pulo nos States, para montar acampamento em pleno deserto e curtir o também mundialmente famoso Coachella. Chamei um grande amigo da faculdade, Roberto Lestinge, para me acompanhar nessa eletrizante empreitada. Inicialmente ele topou. Falou que estava mesmo com vontade de viajar e, como ele conhecia Los Angeles de forma profunda - havia trabalhado lá por muito tempo -, seria legal dar um pulo no evento e curtir o show de várias bandas. Mas aí, não rolou. Roberto me ligou e disse que tinha duas notícias para me dar. Uma ruim, e a outra, boa. "Olha, não vou poder ir ao festival porque acabei de ganhar uma bolsa de estudos em Barcelona. Mesmo assim, tenho uma notícia boa: que tal você aparecer por lá e assistir a algum festival de verão na Europa? O convite está feito".

Mal sabia o "Mané Pereira" na merda em que ele estava se metendo. Convite aceito.

Estávamos em fevereiro, e até julho, foquei minha vida naquela viagem. Tirei o passaporte, fiz as contas - grana sempre contada -, acertei as minhas férias para o período da viagem e comprei os ingressos para o FIB. A felicidade de pegar o comprovante dos tickets nas mãos era imensa; a insegurança de fazer a primeira viagem para a Europa também - iria sozinho.

Eis que chega o grande dia. Depois de uma cacetada de horas dentro de um avião - do Rio de Janeiro a Madri, mais de 10 horas -, chego ao aeroporto e me preparo para a imigração espanhola, conhecida como uma das mais rigorosas do mundo. Molezinha. "Estou aqui de férias. Vou ficar 12 dias. Sim, tenho lugar para ficar". E aí, o carimbo da felicidade! Agora era só pegar um voo rápido de Madri a Barcelona, encontrar com o meu amigo e curtir a cidade, antes de seguir para o evento musical. Foram os 50 minutos mais tensos da minha vida. Turbulência do começo ao fim. Minha mãe havia me dado uma folhinha com uma oração, para os momentos dificeis. Eu deixei ela no bolso, e caso sentisse a necessidade, daria uma lida. Com cinco minutos de decolagem eu tirei o papel da calça e comecei a ler, sendo que, ao meu lado, no mesmo momento, uma mulher sacou a bíblia e começou a orar. "Vou morrer antes de ver o guitarrista dos Smiths ao vivo!", pensei. Sacanagem, pensei nada. Só queria chegar inteiro. E consegui. Thanks, god!

Depois, só alegria. Apesar de estar muito cansado da viagem, fui observando a cidade durante o trajeto de ônibus do aeroporto de Barcelona para a Plaça de Catalunya, onde Roberto estaria me esperando. Metrópole linda. Limpa, organizada, sistema de transporte impecável e uma multidão de gente bonita como eu nunca vi na minha vida. Ao chegar ao local marcado, encontrei meu amigo, que já disparou. "Cara, que barriga é essa?". Gargalhadas. Saimos de lá e seguimos direto para o apartamento dele, a uns 15 minutos de onde estávamos. Apartamento simpático, sofá confortável e cervejas na geladeira. Sorriso no rosto... Além de suor, muito suor. Um calor infernal na cidade, tão intenso quanto o verão do Brasil. Nada é perfeito, certo? Estava valendo. Valeu.

Depois de ficar uns cinco dias em Barcelona - assunto para outra postagem -, viajei para Benicàssim. Estranho estar num ônibus com gente que você nunca viu na vida e que não fala a sua língua, passando por lugares igualmente desconhecidos. Estranho, mas agradável. Ao chegar no local do festival, uma surpresa desagradável: um termômetro marcava 40º graus. Eu, cheio de bagagem - barraca, colchonete, roupas, máquina fotográfica, documentos etc -, só sentia vontade de chorar. De emoção? Nada: de calor. Achar o local do acampamento, arrumar um espaço para a barraca e retirar a pulseira que daria acesso ao festival foi fácil. Difícil foi descobrir que eu não conseguia me esticar dentro da minha barraca, e que a temperatura, dentro da "cabaninha", devia estar beirando uns 60º graus. Que vontade de ter reservado um quarto de hotel barato... Quem sabe na próxima vez?


Até as estátuas são modernas em Benicàssim... Elas usam piercings!

Pois bem: depois de montar minha barraca, ajudei um grupo de ingleses a montar a deles - emprestei um martelo que havia comprado. O cara me agradeceu muito e, por fim, me ofereceu um baseado gigante como sinal de gratidão  - aliás, acho que essa era a moeda de troca no local. Recusei no estilo Rita Lee. "Diga não às drogas, mas seja educado. Diga 'não, obrigado'". Acho que deveria ter aceitado e fumado de uma vez só, para tentar me livrar daquela sensação de calor horrível. O festival começaria no outro dia, e então, tirei o resto do tempo para descansar... Ou ao menos tentar, já que o clima no espaço dos campings era de festa interminável: gente urrando de alegria, gritando por causa do efeito de drogas e birita, enfim, era um festival de música, né? Se eu quisesse paz e tranquilidade, era melhor ir à missa, ou algo do tipo. Agora aguenta, coração...



O inferno é azul!


1º dia do festival
Dormi mal pra caralho. O calor, o barulho, o tamanho da barraca... Enfim, uma merda. Mas tudo ia melhorar, pois naquela noite, o som ia rolar. Fui dar uma volta pela cidade. Benicàssim parece um pouco com a Barra da Tijuca... Ah, parece nada, é bem melhor. Trânsito tranquilo, ambiente acolhedor, vários bares e restaurantes e o melhor: descobri um supermercado que tinha um banheiro limpinho, individual. Era ali que eu... Bom, acho que você já sabe, né? Corta para as praias. Mais de 20, acredito, uma pertinho da outra. Tomei umas cervejas, fiquei doidão sozinho e fui para o mar, curtir uma solidão até gostosa. Achei que as pessoas estariam completamente peladas, já que, ao visitar uma praia em Barcelona, 50% dos presentes estavam completamente nus. Nada: vi umas duas meninas fazendo top less, mas ficou nisso - não que eu tenha ido à praia para ver garotas nuas, mas por causa da nudez em Barcelona, achei que, no mínimo, iria encontrar casais trepando na areia, em Benicàssim. Ambiente familiar, isso sim. Voltei, tomei um banho, esperei dar o horário do festival e fui para o local dos shows. Emoção pra cacete ao entrar. Quatro palcos, dezenas de barracas vendendo tudo o que você pode imaginar - Cd's, comida do mundo inteiro, roupas, bebidas, etc - e um sentimento de estar no lugar certo e na hora certa. Consegui. O primeiro show que assisti - e gostei - foi de um trio chamado Puggy. Às vezes soando meio Franz Ferdinand, às vezes Keane, os caras fizeram uma apresentação bem divertida, e deixaram as meninas suspirando - todos pareciam modelos profissionais. A partir daquele momento, descobri que festival é correria - expressão usada pelo meu amigo André Banha. Você tem se deslocar a todo o tempo para ver os shows de sua preferência e, às vezes, não pode assistir as apresentações por completo, pois outra banda que você quer ver está tocando em outro palco. É triste, por exemplo, sair no meio do show do Vampire Weekend  - foda demais - porque o Peter Hook, ex-Joy Divison/New Order, está tocando no mesmo horário, num palco menor. Depois do Puggy assisti a um dos shows que mais queria ver, o do americano Brendan Benson. Mais conhecido como o parceiro de Jack White na banda Rancouters, Brendan lançou um dos discos mais legais de 2009, "My old, familiar friend" - pode baixar sem medo! -, e minhas expectativas eram as melhores possíveis. Não rolou. O show foi ruim, tenho que admitir. O cara foi apresentar suas canções num formato super reduzido, com três músicos no palco - contando com ele. Toda a sutileza das guitarras, cordas, backing vocals e teclados foi por água abaixo. O tecladista, que por sua vez também fazia as linhas de baixo num órgão, parecia perdido, olhando direto para Brendan, como se estivesse de olho nas notas que ele fazia em sua guitarra. A baterista do conjunto era até competente, mas aquele trio não ajudou. Mas tudo bem. Ainda assisti a shows razoáveis das bandas The Paris Riots e Southern Arts Society, além da apresentação divertidíssima de Jack L e seu vozeirão, mas a performance da noite foi mesmo a do ex-vocalista do Kinks, a lenda viva Ray Davies. Num mundo perfeito, a ex-banda de Davies teria o mesmo reconhecimento dos Beatles ou dos Rolling Stones, mas mesmo assim, o vocalista e guitarrista não parece guardar rancor. Escorado por uma banda afinadíssima, fez todos dançarem ao som de coisas como "You really got me", "Lola" e "Sunny afternoon", verdadeiros clássicos do rock inglês dos anos 60. Foi foda. Depois do show ia rolar a performance do Kasabian, hype inglês do momento, mas quem disse que eu aguentava ficar em pé? Ainda consegui pegar duas músicas, mas depois, coloquei a viola no saco e segui para o meu inferno particular - leia-se barraca pequena e calorenta. Até amanhã, malucões. Tô velho demais para a doideira alheia...



Puggy: banda divertida e competente




2º dia do festival
Acordei, como sempre, morrendo de calor. Comi um lanche que era vendido no próprio acampamento, tomei um banho e fui explorar Benicàssim. Conheci uns brasileiros que trabalhavam lá, e todos reclamaram muito da forma como eram tratados naquele país. "Isso não é vida", disse um rapaz do sul, que trabalhava como garçom. Uma outra menina, da Bahia, foi super atenciosa comigo, quando eu falei que era do Brasil. Comi um espaguete delicioso no local, e bebi algumas cervejas, é claro. Depois, praia, sol e água fresca - ok, nem tão fresca assim. Fiquei fazendo hora, esperando o festival começar. Às 18h, já estava na entrada do evento. E começou bem aquele dia. A espanhola - que canta em inglês - Alondra Bentley encantou a todos como a sua beleza, charme e musicalidade elegante. Teclado, violão, bandolin, baixo acústico, percussão e uma voz muito doce deixaram todos em estado de graça, até mesmo aqueles que não conheciam o trabalho da moça. Prometi que, quando retornasse a Barcelona, compraria o CD dela, e foi isso que fiz. Também assisti a algumas canções de Sr. Chinarro - legal - e Triángulo de Amor Bizarro - bem ruim -, mas o bicho pegou mesmo no palco principal. Que sequência de shows. Primeiro, o vocalista do Strokes, Julian Casablancas, organizou o "pula-pula roqueiro". Fosse quando tocava algo de seu primeiro disco solo ou quando fazia algum cover de sua banda - aliás, os momentos mais agitados -, ninguém deixava por menos, e as canções eram recebidas com urros de alegria. Julian, apesar de não falar muito, foi simpático. "Estou muito feliz por estar aqui... E daqui a pouco tem o show do Hot Chip!", disse ele, em certo momento. A apresentação esperada por Julian finalmente começou... E não decepcionou. Apesar do show curto, o grupo que mescla música eletrônica, rock indie e pop manteve o clima de diversão lá em cima. Também, o que falar de um show que oferece "Over and over", " (And I was a) boy from school", "One life stand" e, no grand finale, "Ready for the floor"? Falar nada... Apenas dançar! Já estava esgotadaço ao final da apresentação, mas aguentei firme até o último show da noite - no palco principal. O Vampire Weekend era o hype do momento. Segundo disco elogiadíssimo, clipes espertos e músicas que combinavam com o clima de verão do festival. Entrada triunfal: em vez de subirem ao palco num clima blasé, colocaram "Fight for your right (to party)", dos Beastie Boys, como música de fundo. Jogo ganho. Começaram com a música perfeita para a ocasião, "Holiday", do segundo disco, "Contra". E depois, com o público na mão, foram enfileirando hits indies com aquele toquinho "africano" que eles bem sabem como fazer. Resolvi sair na metade para pegar o senhor Peter Hook, ex-baixista do Joy Division/New order, tocando o primeiro disco da "Divisão da alegria" na íntegra. Foi até legal assistir algumas canções, mas como o cansaço já estava me vencendo, peguei o rumo de casa, quer dizer, da barraca, e resolvi tentar dormir. Isso mesmo, tentar. Dentro da barraca, de banho tomado, senti que, apesar de todas as dificuldades, era um privilegiado. Afinal, não é qualquer um que coloca a cabeça no travesseiro ouvindo ao fundo "Transmission", do Joy Division. Que venha o terceiro dia!



Alondra Bentley: o céu também é azul






3º dia do festival
Sabadão: dia de ver velhos heróis ao vivo. Ian Brown - ex-vocalista do Stone Roses -, Jonnhy Lydon - ex-vocalista do Sex Pistols, defendendo sua outra clássica banda, PIL -  e, ao menos para mim, acima de todos eles, o meu guitarrista preferido, Johnny Marr, o ex-parceiro de Morrissey no The Smiths - tocando agora no The Cribs. Tenso. O sol, como sempre, não dava trégua. O que me restava fazer? Praia e cerveja, o mais rápido possível. Sim, claro: ficar naquela barraca nojenta é que não dava. Então, vamos lá. À tarde, querendo descansar, resolvi imitar os doidões do festival e me joguei numa sombra, numa calçada de frente para um banco. Sozinho? Que nada: mais de 40 pessoas - homens e mulheres - me acompanhavam no "mendigo way of life", e os moradores de Benicàssim encaravam aquilo com a maior naturalidade. Avós brincavam com seus netinhos, amigos conversavam calmamente e, num canto, um monte de jovens jogados, querendo recarregar as energias para os shows da noite. Não ajudou muito, mas deu para colocar um sorriso no rosto... No rosto queimado de sol. À noite, rock and roll! Foi justamente o show do The Cribs que eu conferi por completo, logo de cara. Agitado, gritado e emocionante, como todo show de rock tem que ser. Fiquei bem perto de Johnny, e foi de chorar. Rockstar da cabeça aos pés, e isso é um elogio. Entraram ao som da música tema de uma série que eu adoro, "Twin Peaks" - quem matou Laura Palmer? -, e saíram com o som de palmas, muitas palmas. Vi um pouco do show do PIL - regular -, uma música do The Sunday Drivers - era o último show da banda que, infelizmente, só fui conhecer depois -, e curti uma banda de lá, o Gentle Music Men, meio Belle & Sebastian. Dois shows assistidos por inteiro: Ash e Ian Brown. O primeiro foi agitadão, bem indie/punk pop. "Girl from Mars" e "Shining light" mataram a pau; o segundo foi bem vagabundinho, mas era o Ian Brown, né? Todo mundo queria mesmo era ouvir coisas do antigo grupo do cara, Stone Roses, e ele só fez a vontade da galera no começo, com "I wanna be adore", e no final, com "Fool's gold". Mesmo assim, valeu. Depois, assisti ao Prodigy tocando umas três músicas e... Caminho de casa! Já falei pra você que eu sou velho, ranzinza e que estava morrendo de calor? Vai vendo...


Ricos e famosos repetem a mesma camisa... É cool!



4º dia do festival
It's the end of the festival as I know it... And I feel fine! Pois é: se eu falar pra você que fiquei triste com o final do evento, estaria mentindo. Estava feliz pra caramba. Depois de alguns dias dormindo mal, comendo mal e bebendo bem... Meu dinheiro chegou ao fim... Dali pra frente, iria, também, beber mal? É aí que a mão de Deus entra na história. Os primeiros shows que assisti, por inteiro, no último dia do evento, foram ótimos: I Blame Coco, banda da filha do Sting, é bem divertida de se ver ao vivo; Two Door Cinema Club, que vai tocar por esses dias, no Rio, é indie rock para continuar levando fé no estilo - imperdível - e o Efterklang, grupo de um país gelado desses, foi de chorar. Formação diferente, músicas que crescem demais ao vivo e uma simpatia entre público e banda que levou vários às lágrimas. Confesso: chorei discretamente, lembrando de todos que eu havia deixado no Brasil. Mas voltei a sorrir rapidamente, pois o show do Foals veio com uma surpresa muito agradável. Lembra que eu falei que estava sem grana, e que a "mão de Deus" apareceu no festival? Foi assim: a performance do Foals rolando - legal e só... Esperava mais -, e eu, daquele jeito, sem grana para beber. Aí, um cara chega do meu lado e pergunta que banda estava tocando. expliquei para ele que era um conjunto inglês, meio indie rock. Ele falou mais algumas coisas - em espanhol -, olhou para o lado, e se despediu... Deixando 3 tickets de cerveja para mim! Deus existe... E gosta de Heineken! Mas isso eu já sabia. Depois do Foals, um showzaço de rock com R maiúsculo: Echo & The Bunnymen. Achei que a apresentação da banda seria mais calminha, cheia de sutilezas... Nada! Foi rock and roll porrada, pra pogar mesmo. Ver "The Killing Moon" ao vivo foi das coisas mais legais do evento. No palco principal, o único show que vi foi o Gorillaz... Ainda assim, pela metade - o famoso cansaço/calor, e agora, acompanhado de assaduras gigantes. Foi justamente na hora do show do grupo liderado pelo ex-vocalista do Blur que eu encontrei com alguns brasileiros que estavam por lá. Ficou muito mais divertido assistir ao show - cheio de efeitos especiais e com a participação de Paul Simonon e Mick Jones, da lenda punk The Clash -, mas não aguentava mais, estava esgotado. "Galera, desculpe aê, mas vou partir". Tchau, Benicàssim! Até algum dia... Mas num hotelzinho com banho e cama confortável!


Two Door Cinema Club: indie rock ruleando




É o fim, é o fim
Segunda-feira de manhã e lá estava eu, voltando do festival, em direção a Barcelona. Ainda ficaria mais dois dias na cidade, mas o estrago, no bom sentido, estava feito. Ao chegar no Brasil, depois de mais uma cacetada de horas de viagem, ainda tive, acho eu, uma espécie de insolação tardia, com febrão e dor pelo corpo... Mas valeu. Minha história com o meu primeiro festival de verão europeu é esta. Foi assim.

Por Hugo Oliveira


Quando tudo acaba em "tapas" e cerveja... Temos um final feliz!



Borges II

Mais poemas de Jorge Luis Borges.


Louvação Da Quietude

Escrituras de luz investem na sombra, mais prodigiosas que meteoros.
A alta cidade irreconhecível avança sobre o campo.
Certo de minha vida e de minha morte, fito os ambiciosos e tento entendê-los.
Seu dia é ávido como o laço no ar.
Sua noite é trégua da ira do ferro, prestes a atacar.
Falam de humanidade.
Minha humanidade está em sentir que somos vozes de uma mesma penúria.
Falam de pátria.
Minha pátria é um lamento de guitarra, alguns retratos e uma velha espada,
a desvelada prece dos salgueiros nos fins de tarde.
O tempo está vivendo-me.
Mais silencioso que minha sombra, cruzo o tropel de sua exaltada cobiça.
Eles são imprescindíveis, únicos, merecedores da manhã.
Meu nome é alguém e qualquer um.
Passo devagar, como quem vem de tão longe que não espera chegar.


O Espelho

Quando menino, eu temia que o espelho
Me mostrasse outro rosto ou uma cega
Máscara impessoal que ocultaria
Algo na certa atroz. Temi também
Que o silencioso tempo do espelho
Se desviasse do curso cotidiano
Dos horários do homem e hospedasse
Em seu vago extremo imaginário
Seres e formas e matizes novos.
(Não disse isso a ninguém, menino tímido.)
Agora temo que o espelho encerre
O verdadeiro rosto de minha alma,
Lastimada de sombras e de culpas,
O que Deus vê e talvez vejam os homens.


Intimidade

 

Nem a intimidade de tua fronte clara como uma festa
nem o costume de teu corpo, ainda misterioso e tácito e de menina,
nem a sucessão de tua vida assumindo palavras ou silêncios
serão favor tão misterioso como olhar teu sonho envolvido
na vigília de meus braços.
Virgem miraculosamente outra vez pela virtude do sono que absorve,
calma e resplandecente como a alegria que a memória elege,
vais me dar essa margem de tua vida que tu mesma não tens.
Lançado no silêncio, fitarei essa praia última de teu ser
e hei de te ver pela primeira vez, quem sabe, como Deus há de ver-te,
a ficção do Tempo dissipada, sem amor, sem mim.


Despedida

Entre mim e o meu amor hão de se erguer
trezentas noites como trezentas paredes
e o mar será magia entre nós dois.

Nada haverá, senão lembranças.
Oh tardes que valeram a pena,
noites esperançosas de te ver,
campos de meu caminho, firmamento
que estou vendo e perdendo...
Definitiva como o mármore,
tua ausência entristecerá outras tardes.


Por Ricardo Pereira

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Solar



Já falei por aqui, Ian McEwan é o melhor romancista da atualidade. Além de extremo domínio da narrativa, é um grande contador de histórias, construtor de tramas. Consegue conciliar virtuosismo narrativo com uma falsa simplicidade que faz o leitor se prender aos enredos criados e não querer mais largar os livros.

Esta noite terminei de ler seu último romance, Solar. Normalmente, McEwan relata as desventuras de seus personagens associando-as a algum momento histórico relevante. Aqui, o pano de fundo é o aquecimento global. O protagonista, Michael Beard, é um cientista, ganhador do prêmio Nobel, que envelhece ‘encostado’ em suas glórias passadas e passa a se interessar por “salvar o planeta” quando percebe o quão lucrativo isso pode ser. Beard é um sujeito desleixado, obeso, abusa de álcool, comidas, sexo e sua vida pessoal é um caos. Vários casamentos terminados por seu egoísmo, infantilidade e infidelidade. É brilhante o quanto seu desleixo reflete nossa falta de preocupação com o mundo, como sua decadência - física, moral, sentimental – é metáfora da decadência do planeta. Mas isso tudo sem ser entediante ou panfletário, ao contrário, mostra o cinismo e os múltiplos interesses envolvidos nas questões climáticas.

Solar é o quinto livro de McEwan que leio, e mais uma vez é possível perceber um eixo recorrente, o quanto um fato pequeno, uma palavra mal/bem colocada, uma escolha, um mal entendido podem modificar nossas vidas, muitas vezes irreversivelmente. Há que se destacar o humor presente em várias situações no romance, muito mais do que nos densos Reparação e Sábado, por exemplo. E é de impressionar as descrições científicas, tanto no trabalho vencedor do Nobel, quanto no ‘seu’ projeto para salvar o mundo a partir da energia solar.

O livro é dividido em três fases da vida de Beard (2000, 2005 e 2009) misturadas a flashbacks de seu passado, através dos devaneios do protagonista. A única crítica a fazer é o ritmo no final do livro, que me pareceu meio corrido, a despeito de sua excelente última cena. O que não apaga o brilho de mais um grande romance de Ian McEwan, um escritor que vem construindo clássicos de nossa geração.

Ian McEwan

Por Ricardo Pereira

Borges I

O escritor argentino Jorge Luis Borges é um dos grandes gênios literários do mundo. Forma, junto com Guimarães Rosa e Garcia Marquez, a Santíssima Trindade da literatura sul-americana. Sempre me dediquei mais a seus maravilhosos contos e ensaios, mas recentemente ando encantado com o Borges poeta e compartilho com vocês algumas das que mais gosto.


Nosso

Amamos o que não conhecemos, o já perdido.
O bairro que já foi arredores
Os antigos que não nos decepcionaram mais
porque são mito e esplendor.
Os seis volumes de Schopenhauer que jamais terminamos de ler.
A saudade, não a leitura, da segunda parte do Quixote.
O oriente que, na verdade, não existe para o afegão, o persa ou o tártaro.
Os mais velhos com quem não conseguiríamos
conversar durante um quarto de hora.
As mutantes formas da memória, que está feita do esquecido.
Os idiomas que mal deciframos.
Um ou outro verso latino ou saxão que não é mais do que um hábito.
Os amigos que não podem faltar porque já morreram.
O ilimitado nome de Shakespeare.
A mulher que está a nosso lado e que é tão diversa.
O xadrez e a álgebra, que não sei.


Minha Vida Toda 

Aqui outra vez, os lábios memoráveis, coisa única - e semelhante a vós.
Persisti em me acercar do Bem - e fiquei íntimo das penas.
Atravessei o mar.
Conheci muitas terras; vi uma mulher e dois ou três homens.
Desejei uma moça altiva e branca e de quietude hispânica.
Vi um arrabalde infinito onde se consuma uma
insaciável imortalidade de crepúsculos.
Degustei inúmeras palavras.
Creio intensamente que isso é tudo o que não verei nem farei coisas novas.
Creio que meus dias e minhas noites
se igualam em pobreza e em riqueza àquelas de Deus
e às de todos os homens.


AFTERGLOW

O ocaso é sempre comovente
por mais pobre ou berrante que seja,
porém mais comovente ainda
é o fulgor desesperado e final
que enferruja a planície
quando o último sol mergulhou.
É doloroso manter essa luz tensa e diversa,
essa alucinação que impõe ao espaço
o medo unânime da sombra
e cessa de repente
quando notamos sua falsidade,
como cessam os sonhos
quando sabemos que sonhamos.


Ausência

Eu haverei de erguer a vasta vida
que ainda é o teu espelho:
cada manhã hei-de reconstruí-la.
Desde que te afastaste,
quantos lugares se tornam vãos
e sem sentido, iguais
as luzes acesas de dia.
Tardes que te abrigaram a imagem,
música em que sempre me esperavas,
palavras desse tempo,
terei de as destruir com as minhas mãos.
Em que ribanceira esconderá a alma
pra que não veja a tua ausência,
que como um sol terrível, sem ocaso,
brilha definitiva e sem piedade?
A tua ausência cerca-me
como a corda à garganta.
O mar ao que se afunda.




Por Ricardo Pereira

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Só na "prepareta"

Rapaziada golden: devo postar, no máximo até sexta, o maior texto que este blog já recebeu. Tudo bem que maior não quer dizer melhor, mas enfim... Será sobre a minha aventura na Espanha, no Festival Internacional de Benicàssim. Queria muito escrever que foram cinco dias de paz, amor e música... Mas, na verdade, foram dias de calor insuportável, zoeira interminável e, felizmente, música.

Eu só fiquei um pouco triste quando vi o line-up deste ano. Por enquanto, eles chamaram "apenas" as bandas mais importantes da atualidade. Não que o de 2010 tenha sido ruim, mas é aquilo: como diria uma amiga minha, "pobre só se fode".

Sinta o drama:

Neste ano eu vou... Continuar pagando a viagem do ano passado!

Até mais!

Por Hugo Oliveira

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Novas do R.E.M.

Mais três músicas do 'Collapse Into Now', próximo R.E.M:

"Oh My Heart"


"Mine Smell Like Honey"


"Uberlin"




ps: Uberlin havia sido retirada pela Warner, por isso repostei. As três estão com a letra nos vídeos!

Por Ricardo Pereira

Motivo

Melido foi amigo do meu avô e do meu pai, é uma figura, são várias as histórias engraçadas protagonizadas por ele. O Globo Esporte fez uma série de reportagens sobre os torcedores dos times do Rio e ao chegar ao Bangu, estavam lá Melido e Maria, fanáticos pelo clube, em uma linda matéria sobre amor, pelo Bangu e entre eles. Vale conferir!




Por Ricardo Pereira

domingo, 23 de janeiro de 2011

Scott Pilgrim - A era da Inocência

Scott Pilgrim contra o mundo, Edgar Wright

Não me considero nerd, mas gostei bastante de um filme que é nerd até a medula. Até por falta de conhecimento, não sou familiarizado com os quadrinhos. Mas esta adaptação transpôs o mundo dos quadrinhos para a tela de uma forma interessante. O filme é ágil, cheio de recursos gráficos interagindo com as cenas, como se estivéssemos lendo a revista. Gostei bastante das músicas (a cargo do produtor do Radiohead, Nigel Godrich), do ritmo frenético, do sempre ótimo Michael Cera, das citações a bandas e videogames. E me apaixonei pela Ramona Flowers, em uma atuação de Mary Elizabeth Winstead que me lembrou de certa forma a Clementine, de ‘Brilho Eterno...’, e não só pelo cabelo colorido... Mas procurei me afastar dela, pois é o tipo de mulher que destrói a vida de um homem. Na verdade, é um dos motes do filme, o quanto certas mulheres querem nos fazer estar sempre ‘lutando’, se esforçando, quando, na verdade, elas possuem implantado no cérebro o chip da escrotidão. É uma metáfora interessante, não sei se intencional.



A Era da Inocência, Denys Arcand

Denys Arcand é o diretor dos soberbos ‘O Declínio do Império Americano’ e ‘Invasões Bárbaras’. Ainda que não esteja no nível destes, ‘A era da inocência’ é outro grande filme, mantendo os 100% de aproveitamento dos filmes que assisti de Arcand. Acabei me identificando bastante com o protagonista, Jean-Marc Leblanc (em excelente interpretação de Marc Labrèche). Não trouxe tanto para a idade adulta, mas em minha infância, adolescência, vivia fugindo do mundo real através da imaginação. Me imaginava escritor famoso dando entrevista, líder de banda influente de rock, técnico de futebol, sonhava com mulheres perfeitas (pra mim) e podia passar horas nesses devaneios enquanto o resto do mundo vivia a vida. Jean-Marc é um sujeito frustrado, ignorado pelas filhas, casado com uma mulher workaholic, preso em um trabalho que detesta e que, para ter algum prazer, entrega-se a seu mundo imaginário. O filme dosa bem momentos engraçados, com a costumeira acidez crítica de Denys Arcand. Não vou estragar para quem quiser assistir, mas o final do filme me deixou com uma série de inquietações sobre como devemos encarar a vida.

Por Ricardo Pereira

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Um pouquinho de jornalismo - parte 3

Samba da superação
Profissional do esporte e do carnaval, o angrense Chidonga volta à ativa depois de vencer uma grave doença

Por Hugo Oliveira
Diferente do carnaval, período quase sempre marcado pela alegria, o futebol apresenta dois lados distintos: o da felicidade e o da tristeza. Sabe aquela idéia de que o esporte citado é uma verdadeira caixinha de surpresas? Pura verdade. Em 2008, mesmo já aposentado como jogador, o professor de educação física Vicente de Paula, popularmente conhecido como “Chidonga”, foi intimado a participar de um jogo onde o placar já começava com um gol de diferença para o time adversário, que poderia facilmente ser chamado de “Câncer Futebol Clube”. A partida foi complicada, e ao longo do primeiro tempo, Chidonga, de 45 anos, morador do Balneário, teve que abrir mão de uma das coisas que mais gostava: desfilar nos blocos carnavalescos da cidade, poupando forças à segunda parte do combate. Para alguém que diz respirar carnaval o ano inteiro, o preço a pagar não foi barato. Mesmo assim, correndo pelos misteriosos gramados da vida, o torcedor do Fluminense e atual presidente do Bloco Malhação, da Fortaleza, ousou misturar a ginga de mestre-sala ao verdadeiro arsenal ainda presente nos pés do ponta-de-lança – não africano, mas, angrense –, o que resultou numa vitória de virada contra a equipe rival.
Neste ano, Chidonga está de volta ao carnaval do município. Ele vai desfilar pelo Bloco da Imprensa com sua inseparável companheira, a porta-bandeira Bia. O gol que sofreu no duelo pela vida deixou algumas cicatrizes – precisa de uma operação para levar uma vida completamente normal –, mas ele não desanima: toca a bola pra frente com samba no pé e sorriso no rosto... E narra sua vitoriosa trajetória ao jornal Maré Alta.

Fora do campo – e da avenida
Chidonga deu um chute na doença; eu, mais humilde, mando um bico na imparcialidade jornalística: conversei com ele na última segunda, dia 2 de fevereiro, às 17h. O local escolhido para a entrevista – e para a sessão de fotos – foi o Estádio Municipal, que na ocasião, estava completamente vazio. Talvez o ex-atleta da bola não tenha percebido, mas assim que começamos a papear, o som característico de fogos de artifício ecoou forte, por todo o bairro do Balneário. Coincidência ou saudações divinas? Você é quem decide, caro (a) leitor (a). Pelo menos em relação a Chidonga, ele demonstra saber o quão importante foi o poder da fé em sua recuperação. “Primeiramente coloquei o meu problema na mão de Deus, depois, nas mãos dos médicos que me atenderam, e que foram guiados por ele”, declara. Tanto a descoberta da doença quanto a constatação de que não desfilaria no carnaval de 2008 foram momentos difíceis para o alegre entusiasta do samba, mas ele não abaixou a cabeça. “Foi difícil de lidar com o sentimento de não desfilar, mesmo assim, cheguei a declarar, em uma entrevista na época da doença, que ‘papai do céu vai me abençoar, e ano que vem estarei aí’”. Depois de uma longa cirurgia e de 30 longuíssimas – mas necessárias – sessões de quimioterapia, a profecia de Chidonga se cumpriu, e 2009 é o ano dele. “A expectativa para o carnaval deste ano é ótima. Espero que a gente fortaleça a festa deste ano, com muita paz, tranqüilidade e alegria”. Já no futebol, apesar de ainda não poder jogar, também existem motivos para sorrir, já que a atividade como professor continua, além do trabalho com o núcleo do Fluminense em Angra. Nada como um dia após o outro...



Surpresas, homenagens e “um abraço”
Um dos primeiros passos à volta de Chidonga ao carnaval foi dado no dia 30 de janeiro, no Armazen Angra. Durante o evento que escolheu o samba oficial do Bloco da Imprensa, ele mostrou que o gingado de mestre-sala não foi esquecido, e deu uma prévia de como será sua participação na festa, em 2009. “Senti uma emoção muito grande em participar do evento do Bloco da Imprensa. Eu estou preparando uma surpresinha para a avenida, mas o melhor será participar do evento estando bem, com alegria e emoção”. Falando em emoção, é ele quem informa sobre a homenagem que irá receber de uma das agremiações da cidade. “Vou ser homenageado pelo Bloco Sujos de Lama, e fiquei muito feliz por eles terem me procurado”. Chidonga é um cara simples, do tipo que ainda se empolga quando vê uma pipa avoada. “Aí, Leco, olha a pipa ali, cheia de linha... Vai, rápido, antes que a molecada pegue”, ele sugere ao amigo que estava ao seu lado, um pouco antes de nossa entrevista começar. A história dele com o futebol começou no bairro onde nasceu, ainda garoto, jogando num campinho de areia que não existe mais – onde hoje está localizado o Estádio Municipal. Depois vieram os jogos por times da cidade, a vitória em vários campeonatos e a passagem para o outro lado do esporte, quando começou a trabalhar como instrutor. Já o envolvimento com o carnaval vem de berço: desde pequeno gostava de sambar, e depois da primeira participação num um bloco de Angra, não parou mais. Em ambas as atividades, o que se destaca é o jeito tranqüilo de lidar com os problemas do dia-a-dia, típico de um sujeito que, ao vencer o câncer, declarou. “Ganhei de você. Um abraço”. 


 
 Por Hugo Oliveira




Um pouquinho de jornalismo - parte 2

... E eu o declaro Rei
Compositor que teria criado o famoso apelido de Roberto Carlos, Sebastião “Pilombeta” vive hoje em Angra e continua compondo

Por Hugo Oliveira
Segunda, 26 de janeiro, 15h30, Praça do Porto. No dia, horário e local citados, este que vos escreve marcou uma entrevista com uma figura aparentemente desconhecida no que diz respeito à música brasileira. Aparentemente. O contato que me levou a Sebastião Ladislau da Silva, hoje com 75 anos, foi seu próprio filho, o advogado Misael Silva, de 40, que há quatro, vive em Angra, e que há também quatro – não anos, mas meses –, conseguiu convencer seu pai, conhecido como “Pilombeta”, a residir no município. Apelido estranho, não? Vejamos. Ao consultar alguns dicionários na internet, eis a definição: pilombeta – palombeta – peixe pequeno. Seria, então, o negro baixinho, mas de voz e corpo forte, um “peixinho pequeno” no mar musical do país? Nem tanto. “Pila”, como era chamado por certo cantor que começou como um “jovem guarda” – e terminou como “o Rei” –, não era apenas um craque em escrever letras de canções, mas também, em criar apelidos. Foi assim que, em determinada ocasião, na gravadora CBS, no Rio, ele teria chegado a Roberto Carlos e, ao ser apresentado ao cantor, proferido a seguinte frase. “Ô Rei, que prazer em conhecê-lo”. Neste ponto, ele já residia no Rio, e inclusive, já havia cedido uma de suas composições, em parceria com Elias Soares, a outro rei, esse, do baião, Luiz Gonzaga – a música “Vitória de Santo Antão”, que seria gravada no disco “São João do Araripe”, de 1968. A amizade que nasceu do encontro fez com que o cabeludo de Cachoeiro de Itapemirim, Espírito Santo, viesse também a gravar uma música do risonho cidadão nascido em Glória do Goitá, em Pernambuco, “Escreva uma carta meu amor”, com Tito Silva, incluída no disco “Jovem Guarda”, de 1965. Mais do que isso: fez com que o leque de parcerias do compositor se estendesse, embora a carreira na Marinha também não fosse deixada de lado. Ontem, quase famoso; hoje, quase angrense. A trajetória de Pilombeta, seus antigos e novos planos, você confere agora. Ou quase, já que a memória musical do país é falha. A de “Pila”, apesar de todo o tempo de vida, ainda gera boas histórias, e é nela que resolvi apostar.

Fama e anonimato
“Nem sei por que eu o chamei de Rei. Era como se tivesse caído uma luz sobre mim, pedindo para que eu o chamasse de Rei”, conta Pilombeta, em tom empolgado – aliás, tão empolgado que, ao gesticular com os braços, derrubou o gravador que este jornalista segurava, fazendo com que boa parte da entrevista se perdesse. Independente do motivo que o levou a criar o definitivo apelido, a versão de Sebastião é amparada pelo livro “O Rei e eu” de 1979, escrito por Nichollas Mariano – editora Abril Press –, que havia sido secretário e mordomo de Roberto Carlos por mais de 10 anos. O trecho do volume que narra o encontro é este. “(...) Nessa ocasião surgiu outra figura incrível a começar pelo nome ou apelido: Pilombeta. Baixinho, gordinho, preto, sempre de terno e sorridente, a figura espalhafatosa do Pilombeta chamava logo a atenção onde quer que estivesse. Ao que parece ele era sargento reformado da Marinha e o nosso encontro foi na CBS, ele chegou para Roberto e falou: ‘Ô Rei, que prazer em conhecê-lo’. Foi o primeiro a chamá-lo de ‘Rei’ assim em público”. Rapidamente, se transformou em amigo de Roberto, conseguindo que o próprio gravasse duas de suas músicas, a já citada “Escreva uma carta meu amor” e “Tudo que sonhei”, incluída na coletânea “As 14 mais vol. XIX”, lançada em 1967, pela CBS. A chegada de Pilombeta ao Rio, segundo o próprio, foi ao menos parcialmente motivada por Luiz Gonzaga, que, ao visitar a cidade onde o jovem morava, ficou sabendo que ele tinha uma música muito boa. A canção era “Vitória de Santo Antão”, e de acordo com Pilombeta, ao ouvir a letra cantada por ele, o Rei do Baião lhe perguntou. “Você já andou de avião?”. Ao ouvir a negativa, o símbolo máximo do forró sentenciou. “Então se prepare, pois você vai ao Rio de Janeiro comigo, e eu vou gravar sua música”. Perguntado sobre as datas relativas a todo esse processo, Pilombeta respondeu. “Isso faz muito tempo, eu nem me lembro direito”. Cabe aqui a frase de Jim Morrisson, vocalista da banda americana The Doors. “O presente é abençoado; o resto, recordado”. Vamos à benção, então.


Parceria familiar
O tempo passou. Apesar de ter gravado um compacto como intérprete, em 1969, com as músicas “Mulher Bonita” e “Zé de Briga” – esta última, em parceria com Leônidas e um tal de “Di-cro”, que no futuro, seria um grande sambista, e até mudaria a grafia do nome, para “Dicró” –, Pilombeta não foi além, o que não o impede de, até hoje, receber direitos autorais por suas obras, e de ser relativamente conhecido no meio artístico, pelo menos, às gerações mais antigas. A trajetória de Sebastião poderia acabar por aí, com um final relativamente feliz e com um senhor cheio de histórias para contar, certo? “Senhor está no céu”, ele diz, sorrindo, dando a deixa para que seu filho, e agora parceiro musical, Misael Silva, falasse sobre seus novos projetos na área musical. “Eu estudava em Santa Cruz, e morava em Angra. Em muitas ocasiões, trazia meu pai à cidade, e nós vínhamos cantando no carro”, conta Misael. “Num belo dia, acordei com um estalo do tipo ‘vou resgatar o passado musical de meu pai’, e foi aí que tudo começou”. O “tudo” citado por Misael faz alusão à mudança de seu pai, que passou a morar em Angra, com a entrada dele numa banda na cidade, a FusiAngra, em dezembro de 2008, que conta com 11 integrantes – liderados pelo maestro Paulo César –, e com a composição de “Papai é teimoso”, uma marchinha que nasceu da parceria entre pai e filho – com arranjo do maestro e participação total do grupo. Nas palavras do próprio Pilombeta, a música poderá ser “um hino nacional”, ou seja, apresenta potencial para se transformar numa canção muito popular. Coisa de quem entende do assunto, mas, ainda assim, sabe das dificuldades do mercado fonográfico. “É interessante, mas eu não queria que o meu filho entrasse na música: o meu sonho era que ele se formasse em direito, e Deus me deu essa felicidade”, informa o compositor. E como o assunto é sonho, será que ele ainda tem algum a realizar? “Antes de Deus me escalar para o terceiro andar, eu queria regravar com um amigo meu, Julio Iglesias, a música ‘Tudo que sonhei’, que eu fiz para a minha senhora, já falecida”. Uma atitude honrada, “Pila”. Digna de um Rei.  


 Por Hugo Oliveira




Um pouquinho de jornalismo

Belezinha? Seguem alguns textos que escrevi enquanto era repórter do jornal semanal Maré Alta, de Angra dos Reis, Rio de Janeiro. As reportagens foram escritas entre 2007 e 2008. Ah, sim: como quase tudo nesse blog é conceitual, a maioria das matérias tem ligação com cultura. Se liga aê.

Sexo, violência e artes plásticas
Quadro causa polêmica ao receber faixa de “censurado”

Por Hugo Oliveira
Desde o dia 3 de fevereiro, quando a exposição “Te amo” entrou em cartaz na Casa de Cultura, a imagem de uma mulher exuberante, em preto e branco, vem causando reações variadas àqueles que vislumbram a obra.
Fruto da imaginação – e do trabalho genuíno – do artista plástico Ícaro, o quadro em questão acabou sendo parcialmente vetado ao público por aludir ao sexo, já que a linda moça representada na tela está a “cavalgar” sobre um pênis. Resumo da “caliente” ópera: uma faixa confeccionada pelo próprio artista, com a palavra “censurado”, foi colocada sobre a obra, na parte considerada inapropriada. Enquanto isso, outro quadro, onde se vê um assustador revólver disparando um tiro – e uma poça de sangue – segue normalmente em exposição, livre de qualquer obstáculo visual ou restrição.
Como alguns já devem imaginar, a ligação entre as obras não é gratuita, e faz parte de um conceito explicado por Ícaro no texto que acompanha as imagens – aqui divulgado com correções ortográficas próprias deste jornalista. “Vamos tentar mudar um pouco as censuras da nossa sociedade puritana, arcaica e viciada em religião? Talvez você esteja assistindo neste momento à novela ‘Caminho das índias’, e observando as barbaridades cometidas por suas posturas diante de outro ser humano. Aqui em nosso país não é tão diferente, a violência está nos horários de censura livre, e o amor, o carinho e o sexo em suas formas mais plenas, explícitas, lúdicas e divertidas são tratados como pornografia, coisa do diabo ou pejorativos que valham; mas a violência, essa é vista em qualquer horário, em qualquer vídeo-game. Fale a verdade: o que é mais feio para você? A vida ou a morte? A violência ou o amor? O sangue na calçada ou levar o seu amor a uma viagem ao paraíso, fazendo escalas nas galáxias?”, escreveu Ícaro.
Nada impede que a escolha de muitos já seja tomada a partir deste ponto do texto. Mesmo assim, as palavras daqueles que estão direta ou indiretamente envolvidos com o episódio poderão ajudar no que diz respeito a uma conclusão mais embasada. Pelo menos, na teoria...

O “telefone vermelho” e a ligação que não existiu
Por causa dos “anos de chumbo” – 1964 a 1985 –, termo criado para definir o tempestuoso período em que os militares tomaram conta do país – olá, ditadura! –, governando-o por meio de atos institucionais que censuravam e também proibiam jornais, programas de rádio e manifestações artísticas, entre outros, qualquer menção à palavra estampada na faixa do quadro de Ícaro ainda acaba causando repúdio e curiosidade às pessoas. Uniu a censura ao sexo e à violência? Pronto: está organizado o “ménage à trois da polêmica”. O artista plástico que o diga. “Eu não tinha a menor dúvida de que o quadro criaria polêmica, tanto que, quando a diretoria da casa disse que queria falar comigo, eu já desconfiei sobre o que era”, informa, dando prosseguimento. “Antes de fazer, eu já estava imaginando que tipo de tarja eu ia colocar, se eu colocava em cima ou se eu colocava em baixo. Basicamente, o que eu deveria escrever era ‘censura livre’ – para quadro da violência – e ‘proibido para maiores de 18 anos’ – para o quadro que apresenta sexo”.
Mesmo já prevendo o que iria acontecer, Ícaro não queria que a pintura sofresse censura, fosse ela oficializada por ele próprio ou por aqueles que forneceram a possibilidade de expor seu trabalho ao público. O telefonema da diretoria da casa – que o criador da exposição acabou não recebendo –, na verdade, era de Mário dos Anjos, presidente da Fundação Municipal de Cultura, a Cultuar. É ele, que também é artista, que explica o que ia fazer caso Ícaro não arranjasse uma solução quanto à tela. “Se ele não colocasse a faixa de ‘censurado’, íamos fechar a Casa de Cultura e restringir a mostra apenas a maiores de idade. A exposição ia acontecer de qualquer jeito”, declara Mário, antes de revelar o que pretendia falar com Ícaro pelo telefone. “Eu ia conversar com ele, até porque passam crianças ali. É um local público, e eu não posso proibir a entrada das pessoas. Em todas as manifestações que acontecem na Casa de Cultura, nas que não são cobrados ingressos, temos que ficar de olho na classificação etária”.

Conseqüências do sexo – quer dizer, do quadro
Parece que não apenas para o presidente da Cultuar, mas para muitos que passaram e continuarão passando pela Casa de Cultura, a mostra “Te amo”, em especial, o “quadro-coito”, ganhou outra dimensão após a inclusão da palavra “censurado” no corpo da obra. E passou a suscitar debates. “A gente pensa de uma forma, mas a sociedades e as leis funcionam de outra maneira, com seus conceitos e pré-conceitos. Temos que andar em harmonia com o que está acontecendo, e a exposição de Ícaro acaba sendo uma forma de questionar certas coisas, com a tarja de censura e a arma”, esclarece Mário. Mas como seria se a exposição fosse liberada a todos, independente de idade? O criador da própria é quem sugere o processo. “O adulto olha a tela e fecha os olhos, fica barbarizado, enquanto a criança, por sua vez, ri, e se for muito pequena, a ponto de não entender, ela vê que tem uma coisa bonita ali. A violência do quadro ao lado cria a ponte entre os temas: ela é liberada, em todos os sentidos, e o sexo, não, ele é banido e sempre apresenta muita confusão. Eu diria que se o indivíduo tivesse uma educação sexual diferente, principalmente no início da infância, ele com certeza, ao crescer, teria um casamento muito mais saudável, mais promissor”.
A mostra, que apresenta obras conceituais sobre o amor e a democracia, continuará aberta à visitação até domingo próximo, dia 15. Já a pintura debatida neste texto continuará, sim, com a tarja proibitiva – pelo menos na passagem pela Casa de Cultura. Para aqueles que ainda não analisaram o supracitado quadro, fica a sugestão... E a posterior questão: a sujeira está na tela ou na mente?

Retoques finais
Na última quarta, na parte da manhã, um novo quadro foi pintado a respeito da polêmica – metaforicamente falando. Ao adicionar um novo texto à exposição, Ícaro acabou tendo uma surpresa desagradável ao saber que o mesmo havia sido retirado da Casa de Cultura. Será que a “censura” do quadro específico acabou contaminando todo o ambiente? Mário dos Anjos, que estava no local da mostra, na hora do almoço, falou sobre o acontecido. “A exposição foi colocada de uma forma. Querendo ou não, isso aqui é um local público, e tem uma administração, então, qualquer mudança na exposição tem que ser comunicada antes à administração”. O motivo principal da retirada do texto, segundo o presidente da Cultuar, foi principalmente estético. “Temos que cuidar da parte estética: eu não concordo que colem qualquer coisa na parede, principalmente com durex, pois, quando ele é tirado, sobram resíduos de cola e a parede escurece, fazendo com que a parede tenha que ser pintada novamente”.
O novo texto produzido pelo artista plástico é este – aqui reproduzido de forma fiel, desta vez, sem correções ortográficas. “A pior casta de ladrão, é a do político. Você da poder a eles, salário de marajá, e ele deixa você na merda”. Questionado sobre o conteúdo político dos escritos, Mário dos Anjos deixou sua opinião. “Eu acho qualquer um pode se manifestar, só que tem o seu local”. Não seria a Casa de Cultura o local ideal, já que a arte quase sempre apresenta ligações com a política?, perguntei a ele, que me respondeu. “Pode até ter, mas nem todas são ligadas à política. Tem que ter o seu local. Isso não foi conversado. Imagina se qualquer um que chegar aqui quiser pintar a parede, tirar as luzes? Não pode, tem que ser conversado. Por isso, temos o pessoal daqui, que toma conta da casa, da agenda e de tudo mais”.
Aparentando nervosismo e indignação, Ícaro também foi ouvido pelo Maré, e deu a sua versão sobre o fato. “Foi um ato arbitrário da Casa de Cultura, sem me consultar nem nada, só por achar que o trabalho estava feio, escrito com letras não muito convencionais”, informou ele, antes de emendar. “No meu caso, acho muito convencional e pertinente, já que trabalho há mais de 30 anos com publicidade, e sei que, uma letra feita a pincel, acaba destacando o trabalho. É a mistura entre o primitivo e o moderno, que surte efeito”.
Nas palavras do pintor, o que ele vem fazendo agora é arte contemporânea, que abriga perfeitamente outras escolas artísticas, como música, teatro e texto, de um modo que o artista não fica restrito apenas à expressão visual – no caso de Ícaro. Sobre o texto específico, ele afirma que o protesto é amplo. “O texto tem a ver com a política universal, como um todo: eu não tenho partido”.
Até domingo, muita coisa ainda pode rolar. Mais do que uma confusão artístico-administrativa, o caso descrito nestas linhas só vem a confirmar uma coisa: a cultura, independente da época e da cidade em que ela é produzida, é de vital importância para entender a sociedade em que vivemos. Mas isto eu já sabia. Espero que você também, leitor.  




Por Hugo Oliveira 


quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Nowhere Boy - A Árvore


O Garoto de Liverpool, Sam Taylor Wood

Fraco, fraco... Arnaldo Bloch classificou o filme como “assistir à adolescência de John Lennon como se fosse uma boa novela das seis”. Discordo, foi como assistir a um rascunho de um artigo da Wikipedia sobre Lennon como se fosse uma novela mexicana. Ultradramático, exagerado, fundo musical meloso e apelativo. Quem já leu qualquer biografia mequetrefe de Lennon ou dos Beatles sabe que não foram bem desse jeito que as coisas aconteceram. Certamente John Lennon ficaria puto demais com esse filme. De bom só o título original (Nowhere Boy) e o outtake de ‘Mother’ que fecha o filme. Fujam!



A Árvore, Julie Bertucelli

Depois de assistir Charlotte Gainsbourg em um filme tão pesado e chocante como ‘O Anticristo’ foi bom vê-la em um filme tão bonito, tão delicado quanto este ‘A Árvore’. Saí do cinema encantado, a fotografia é linda, cenários, cores, enquadramentos. A história é uma beleza, trata da perda e das diferentes reações a ela a partir da morte de um homem e de como a família lida com o sofrimento. Uma das filhas (a lindinha Morgana Davies, em ótima atuação) imagina que a alma do pai está presente numa árvore que eles têm no quintal e conversa com o que imagina ser seu pai sobre os acontecimentos. Muito, muito bonito o filme, vale ver enquanto está em cartaz.

  
 
Por Ricardo Pereira

You make me real


2010 foi um ano estranho e agora já sei o porquê. É que ano passado não encontrei nem uma vez duas das minhas melhores amigas: Marcella e Ingrid. Provavelmente as duas pessoas que estiveram mais próximas a mim durante a faculdade, sem contar meu irmão, que morou comigo.

Conheci a Marcella na Letras em um dia muito doido e mal nos conhecemos, disputamos quem conseguia falar mais sacanagem. Assim, do nada. Fomos nos encontrando e nossa amizade se estreitou quando ela foi morar no Alojamento, vizinha da Patrícia, que já era minha amiga, trabalhava comigo. É praticamente tradição, saímos eu e Marcella juntos, ‘se tudo der certo, vai dar merda’. São milhões de histórias, festas doidas no alojamento, show bêbado do Los Hermanos, companheira no meu aniversário mais maluco, juntos num dos aniversários mais malucos dela (lembra o que a gente tentou organizar esse dia?? rs), por pouco não me viu desmaiar quando fomos doar sangue e, nesse dia, roubou lanche do velhinho (!!!!), cafés na cantina, me aturar com crise renal de manhã cedinho no quarto dela, confidências, esporros, crise de ciúme no show do Barão (e eu não peguei a amiga... mereci! rs), torcer junto com ela pro Fluminense - aliás não há como não pensar nela em cada vitória do seu Flu -, chopadas em que não se sabia quem tava tomando conta de quem e por aí vai...

Ingrid é quase o Ricardo de saias. Conheci no primeiro período da faculdade, primeiro tempo de aula, entrei e o professor não havia chegado. Sabe-se lá porque, empolgado com mais uma boa fase ilusória do Botafogo, escalei o time no quadro e comecei a traçar esquema tático para alunos atônitos, quando uma japonesinha morena fala: “ei, também sou botafoguense!”. Pronto, de Botafogo pros Beatles não durou cinco minutos e de identificação em identificação ficamos inseparáveis. Discos trocados, cervejas e mais conversas emocionadas no seu Ary, um período perdido de psicologia da educação em que saíamos pra reitoria toda semana (talvez um dos cursos mais produtivos da faculdade rs), show da Blackbird na Ilha, meu aniversário em Angra, filmes e leituras compartilhados, derrotas inexplicáveis e vitórias épicas do Botafogo, seu ‘Elis e Tom’ é meu ‘Chico e Bethânia’, quantos “ouvi uma banda que você precisa ouvir!!” de parte a parte, a mesma preguiça do mundo e vontade de se isolar às vezes e de repente querer fazer tudo e ver todo mundo ao mesmo tempo.

Essa semana consegui encontrar as duas. Segunda fui à casa da Marcella e entre histórias relembradas, atualização das novas histórias e muitos risos, pude conhecer sua filha, Julieta, linda, linda. Fiquei emocionadão de estar com a filha dela e nem falei na hora. Por que a gente é assim? Na terça encontrei Ingrid no Centro e, fora a saudade, é como se não nos víssemos há algumas horas, está tudo ali. Além de contar tudo (em detalhes, como ela gosta), os mesmos assuntos sob novas abordagens. 

Estaremos sempre juntos. Quero que a gente envelheça como a velhinha que encontramos uma vez em um dia inesquecível, de um show do Skank em Copacabana em que estivemos os três, Ricardo, Ingrid e Marcella. Conversamos, bebemos, nos divertimos juntos e uma senhora estava no bar quando chegamos, antes do show, e no pós, ao voltar, ela estava lá curtindo com as amigas. Cada vez mais, consigo nos imaginar velhinhos discutindo, sei lá, a monogamia ou a falta de sentido da vida.

Não fico mais tanto tempo sem encontrá-las, tendo visto as duas tenho certeza que 2011 será um ano melhor. Estar com elas me faz bem, cada uma de um jeito me faz enxergar as coisas como são, me dão força e conseguem fazer com que o Ricardo seja mais Ricardo, para o bem e para o mal. Não é pouco, vocês sabem.

on the way home
 Por Ricardo Pereira