"There's a fear I keep so deep / Knew it name since before I could speak (...) If some night I don't come home / Please don't think I've left you alone"- Keep The Car Running, Arcade Fire

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Meu amigo Jim

Angra dos Reis, 28 de fevereiro. Quase 22h. Nada que preste na TV. Telefone fora de área. Sem saco para ler. Resolvi colocar uns discos antigos na vitrola, quer dizer, no PC. Escolhi vários. Todos do The Doors, grupo californiano nascido nos anos 60. A banda que me fez querer cantar. O conjunto que eu amei, e amo. A trilha sonora definitiva da minha adolescência.

Caralho... Como é bom voltar a esses caras!

Um quarteto. Um tecladista de formação clássica, que também fazia as linhas de baixo - nas teclas. Um batera simples, mas que sentia a música, participava das canções de forma conceitual. Um guitarrista que sacava tanto de flamenco quanto de "bottleneck", também conhecido como...

Só um instante: tocando "Indian Summer" agora, do disco "Morrison Hotel". Emocionante. Um monte de lembranças dançando ao som psicodélico/fofo da faixa. O dia em que eu conheci o Gláucio, futuro guitarrista da minha primeira banda. Ele trabalhava numa banca de jornais, e tinha uma pasta recheada de recortes do grupo. Amizade instantânea. Para o resto da vida. A ocasião em que eu ouvi algumas canções do box set do grupo, na casa do Ricardo - ele mesmo, o do blog! Meus olhos ficaram cheios de lágrimas durante uma versão mais jazz de "Queen of the highway". O momento em que eu adquiri a biografia "Daqui ninguém sai vivo", versão em português de Portugal - li numa tacada só... Começando de tarde e terminando à noite. Coisas simples. Nada de espetacular. Mentira. Tudo muito, muito especial. Nunca vou me esquecer. Nunca.

As pessoas são estranhas, companheiro (a). Estão sempre querendo dizer o que é realmente importante na vida. O que merece nossa atenção e nosso sagrado suor. Geralmente, isso não inclue as lembranças que eu citei no parágrafo acima. Inclue, sim, um carro do ano, uma casa com piscina e um punhado de notas de 100 na carteira. Cidadão modelo, burguês padrão. É bom. Eu também quero, claro. Mas não abro mão daquilo que me traz felicidade, que me faz sentir realmente vivo no meio desse monte de gente chata pra cacete.

Que ingenuidade a minha, não? O problema é meu. Ser ingênuo, num mundo de espertalhões, tem lá as suas vantagens. Não sei explicar como, mas tem. Eu sinto.

Faço 33 anos em maio de 2011. Escuto "People are strange" e pronto: tenho 23... E o mundo é meu de novo. Só meu.

Sei que nós, que trilhamos o caminho agridoce da música pop, também sofremos muito. Músico profissional, músico amador, crítico, fã... Todo mundo fodidão, em várias ocasiões. Emocionalmente, principalmente. Culpe a poesia, o lirismo, essa beleza assustadora que nos dá a ilusão de que vamos viver para sempre... E que a música nunca vai acabar.

A vida é chata, mas ser plateia é pior. Muito pior.

Meu show é esse: ser enganado conscientemente por canções de três minutos e meio. Levar a sério, muito a sério, obras cinematográficas de 1h30 de duração. Dedicar semanas - até meses, às vezes - a livros que a maioria das pessoas que eu conheço nunca vão ouvir falar. Sou um puta chato de galochas. Arrogante, pedante e bem ignorante, também - em todos os sentidos.

Foda-se. Sou eu quem paga. E não é barato.

Troco o CD. "The soft parade". Disco confuso. Mesmo assim, adorável.

Now, I'm gonna love you
'Til the heaven stops the rain.
I'm gonna love you
'Til the stars fall from the sky
For you and I


... Porque é importante ser doce nesses tempos tão cruéis.


Os Doors são sobre isso: crueldade e doçura. De vez em quando, na mesma canção.
E então chegamos a "The soft parade" - a música. Já não quero escrever mais nada. Ele chegou.


Arte do chá (Paulo Leminski)
   ainda ontem
convidei um amigo
   para ficar em silêncio
comigo

   ele veio
meio a esmo
   praticamente não disse nada
e ficou por isso mesmo  

Por Hugo Oliveira




3 comentários:

  1. Cara, foda seu texto! Não seria o que sou hoje se não fosse Doors, engraçado é que foi mesmo o elo de ligação da amizade entre você, Gláucio e eu inicialmente, o que nos aproximou na época.

    É uma banda que volto vez ou outra e o impacto é sempre o mesmo da época que descobri. Morrison é o rockstar perfeito, funde doideira, revolta e lirismo na medida certa, ou seja, sempre exagerando.

    E o décimo parágrafo poderia ser sobre mim.

    No more money, no more fancy dress
    This other kingdom seems by far the best
    until it's other jaw reveals incest
    and loose obedience to a vegetable law.

    I will not go
    Prefer a Feast of Friends
    To the Giant Family.

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  2. Muito Antes do Hugo.... há long, long time ago !!!!!!!

    Em meados de 1991/92 conheci um adolescente figura, um garoto de cabelos esquisitos e que curtia Gibis como eu, Bruno Ferraz, e junto com o Bruno vieram uma nata da mais pura nerdice e geração de "Curtidores" de Doors de Angra dos Reis, eu trazia o CD e uma fita vhs do filme do The doors (filme de 1991) na mochila e dissiminava aos meus asseclas uma cultura da trilogia Gibi, Rock e RPG ou seja uma cultura super NERD, os anos foram passando e eu a cada dia me afastando mais de Angra. Os anos passaram e me casei, tive filhos e o Bruno ficou... e nesse tempo surgiu Hugo, Skwit, Ricardo, Glaucio e outros que seguiam a vertente do Rock, levantando a bandeira de Jim Morrison e sonhando como eu sonhava ser uma astro do rock... rs.
    The Doors foi e é um marco, um início sim, na minha vida foi importante e dessa galera toda que veio depois de nós. Finalmente o Hugo escreveu algo do the Doors, eles estavam sem espaço e sem importância em seu Blog.
    Não analiso a musica, não quero saber de qual é melhor nem o pior disco, curto o JIM, o Doors como um todo com o poder que eles tiveram sobre mim e sobre uma porrada de gente.
    É claro que depois disso, as portas foram abertas e nós, cada qual no seu tempo, foi gostando e curtindo outras ondas musicais, mas nunca perdendo a ternura, nunca deixando de ter sempre no pensamento, o bom e velho The Doors.

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  3. Os Doors, pelo visto, têm influenciado várias gerações de roqueiros angrenses. Mas nada comparado ao que existe hoje, pois eu tenho a satisfação de trabalhar com o Gordim Morrison, vulgo André Banha.

    Mas aquele filme do Oliver Stones sobre a banda é uma merda. Nunca ví personagem tão caricato. Se Jim Morrison era mesmo daquele jeito, então ele era um grande idiota.

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