"There's a fear I keep so deep / Knew it name since before I could speak (...) If some night I don't come home / Please don't think I've left you alone"- Keep The Car Running, Arcade Fire

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Outros olhos, outras lágrimas (para Letícia)

Revi na última semana, junto com minha esposa, o filme Alta Fidelidade, baseado no livro de mesmo nome do escritor inglês Nick Hornby. O longa foi lançado no Brasil em 2000, dois anos depois de a editora Rocco traduzir o best seller para o português. Uma década e meia entre a sessão inicial, numa sala do Cine Angra Shopping quase vazia, e a mais recente, no televisor da minha casa, fizeram com que eu assistisse ao filme com outros olhos, outras lágrimas.

A história é simples: Rob Gordon – John Cusack –, um quase quarentão fanático por música pop, entra em parafuso por conta de ter sido, mais uma vez, abandonado por uma namorada – Laura, interpretada por Iben Hjejle. Para tentar chegar ao âmago do problema, resolve questionar suas ex quanto aos rompimentos... Mas não gratuitamente. Louco por listas, ele vai procurar pelas “cinco separações memoráveis”, surpreendendo-se com o resultado da busca.

No filme, Rob divide seu tempo entre a resolução das questões de ordem afetiva e o trabalho na Championship Vinyl, loja de discos que mantém com a ajuda de dois funcionários tão exóticos quanto ele, Dick – Todd Louiso – e Barry – numa interpretação hilária de Jack Black. As partes do longa rodadas na Championship são engraçadíssimas e repletas de referências musicais. Smiths, Bob Dylan, Belle & Sebastian, Green Day… Eu me remexia na cadeira do cinema, emocionado pelas menções honrosas.  Além do mais, aquele cara tinha algo de mim.

Aos 22 anos, tudo o que eu sonhava em relação à vida estava diretamente ligado à música. A faculdade que eu começaria a cursar no início do outro ano era a de jornalismo, por conta da possibilidade de trabalhar com crítica musical. Continuava compondo e também ensaiando com bandas de garagem, com a cabeça no sonho e os pés bem longe do chão. Ah, e eu comprava CD’s desesperadamente, apesar de não ter muita grana. Aonde isso ia dar?

Quinze anos depois isso deu num cara que, de alguma forma, foi fiel à caminhada que se propôs. Escrevo sobre muitos assuntos neste blog, principalmente música, embora o que me sustente seja meu trabalho como assessor de imprensa; continuo compondo, e os ensaios são realizados junto com a minha esposa, Letícia, que é a outra parte do “duo de garagem” Feito Café; não compro mais CD’s desesperadamente: adquiro-os com alguma responsabilidade. Mas a paixão pelo assunto é a mesma, assim como o prazer em conversar sobre o tema.

Assistir ao filme pela segunda vez, num espaço significativo entre as exibições – 15 anos –, foi fundamental. Ao mesmo tempo em que me vi na pele de Rob em algumas situações, em outras, entendi que amadureci muito. E é reconfortante enxergar esse avanço. Para que isso acontecesse, não agi sozinho. Familiares, amigos, amores, colegas de trabalho, todos eles, de alguma forma, ajudaram no meu crescimento pessoal. E o mestrado de companheirismo e amor que venho cursando desde 2012, com a Letícia, tem papel importantíssimo nisso tudo.

Deixar a fantasia de lado e partir para a realidade de um casamento, de uma vida a dois, compartilhando felicidades e tristezas, não é tarefa fácil. É tão complicado quanto eleger o melhor dedilhado do Johnny Marr ou o melhor disco de rock psicodélico lançado em 1967; mais complexo do que escolher entre Pistols e Clash, Blur e Oasis. E minha esposa vem, na medida do possível, comandando esse show selvagem com o brilhantismo de um Freddie Mercury... Porque ela sabe que o espetáculo tem que continuar. E eu também.

Não sei se consegui me fazer entender ao longo destas linhas. Estaria eu propondo um texto sobre o filme ou a respeito de mim? Uma homenagem a Letícia ou uma revisão de pontos importantes da minha vida? Acho que tudo isso junto. O que não dá para negar é que as lágrimas escorreram timidamente pelos meus olhos quando, ao final do longa, Rob e Laura começam a dançar numa festa, felizes, ao som da banda de Barry.

Você não notou, Letícia. Mas eu estava dizendo que te amava naquele exato momento.


 
Rob e Laura ao som da banda Sonic Death Monkey





 Por Hugo Oliveira


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