"There's a fear I keep so deep / Knew it name since before I could speak (...) If some night I don't come home / Please don't think I've left you alone"- Keep The Car Running, Arcade Fire

terça-feira, 24 de novembro de 2015

Decemberists: dois álbuns e a mesma beleza

A partir de 2013, quando tive a “brilhante” ideia de abrir um bar em Angra dos Reis, meu já escasso tempo voltado à audição de discos e às sessões de cinema rareou de vez. Tantas coisas aconteceram nesse período que, curiosamente, o único hábito que consegui manter foi o da leitura. Mas não foi sem tristeza que aceitei a falta de condição em acompanhar o que vinha ocorrendo no cenário cultural. Principalmente na música.

Os poucos discos que ouvi entre 2013 e 2015, e que conseguiram prender minha atenção, foram trabalhos de assimilação imediata. Obras musicais de alto teor pop, ao menos, na minha concepção do que é pop. Neste sentido, os dois álbuns lançados pela banda americana Decemberists, The King Is Dead (2012) e What a Terrible World, What a Beautiful World (2015), renderam muitas horas de alegria e encantamento. E são, certamente, os “prediletos do triênio”.

Banda formada em Portland, nos Estados Unidos, o Decemberists apresenta uma sonoridade influenciada por Folk, Indie Rock e Pop. Liderados pelo vocalista, instrumentista e principal compositor, Colin Meloy, eles têm sete discos de estúdio no currículo, numa caminhada musical repleta de acertos e aprendizados. Ao que parece, os últimos trabalhos espelham toda a experiência adquirida durante a carreira, sobrando pouco espaço para arestas e exageros. Música simples, tocada com emoção e carregada de alguma pretensão artística. Parece Punk, mas não é.

Não conheço os primeiros trabalhos da banda, Castaways and Cutouts (2002) e Her Majesty The Decemberists (2003), e nem os EP’s e singles lançados pelo conjunto. O primeiro contato com o grupo se deu através do disco Picaresque (2005), que continha canções que me conquistaram já na primeira audição, caso de “Eli, The Barrow Boy”, “The Engine Driver” e a perfeita “We Both Go Down Together”. Seguiu-se um trabalho igualmente inspirado, The Crane Wife (2006), e uma quase “ópera Folk Indie”, The Hazards of Love (2009), que mostrava uma banda pretensiosa, mas menos pop do que nos trabalhos anteriores.

Em 2011, o quinteto juntou tudo o que tinha de melhor, chamou convidados do quilate de Peter Buck – R.E.M –, Dave Rawlings e Gillian Welch – os dois últimos, músicos com ótimos trabalhos voltados à sonoridade americana – e colocou todas as qualidades musicais e literárias de suas canções e letras a serviço de um álbum irrepreensível, The King is Dead (2011). O disco flagrou a banda em seu melhor momento, inspiradíssima, apresentando Folk e Country processados via R.E.M, Smiths e Waterboys. Chapéu de cowboy colocado na cabeça da geração do smartphone; bandolim, harmônica e violino compartilhados pela internet.



Nenhuma faixa sequer em The King is Dead pode ser considerada menos que boa. Do começo movido pela gaita de Colin em “Don’t Carry It All” e pela beleza acelerada de “Calamity Song”, passando pela linda “Rox in the Box” e pelo poderoso single “Down by the Water”, uma das canções mais emblemáticas da banda, nota-se que o conjunto queria, mais do que fazer um ótimo disco, transforma-se num oásis de boas canções àqueles que ainda acreditam que é possível soar pop, interessante e, sem qualquer traço de ironia, inteligente.

O disco foi o primeiro da banda a entrar na primeiríssima colocação da Billboard americana, relacionada aos 200 melhores álbuns no início de fevereiro de 2011. Revistas como a Uncut e a Rolling Stone colocaram o trabalho do conjunto entre os melhores do ano. As premiações e resenhas elogiosas iam crescendo na mesma medida que as expectativas ligadas ao próximo trabalho do grupo. O que viria depois daquele álbum tão redondo, tão perfeito?

Quatro anos depois, a resposta veio através de What a Terrible World, What a Beautiful World (2015), um disco tão bom ou até melhor do que o anterior. Gravado com o mesmo produtor do trabalho anterior, Tucker Martine, o álbum consegue soar um pouco mais refinado e diversificado do que The King is Dead, sem perder nada no quesito empolgação. A letra autoexplicativa de "The Singer Addresses His Audience", a dobradinha pop perfeito de “Calvary Captain” – minha música preferida – e “Philomena”, o single setentista “Make You Better” e a lindíssima balada “Lake Song” fazem parte apenas da primeira parte do disco. E não se engane: ele mantém a qualidade ao longo das 14 faixas.

E a banda segue incansável. Ainda colhendo os frutos do último álbum, resolveu lançar um EP intitulado Florasongs, com cinco músicas. Torço para que o conjunto se apresente no Brasil e, de preferência, realize ao menos um show no Rio de Janeiro. Enquanto isso não acontece, sigo ouvindo dois álbuns maravilhosos, repletos de canções memoráveis. Se eu fosse você, faria o mesmo.





Por Hugo Oliveira



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