O ano que está prestes a acabar foi muito proveitoso em se
tratando do tempo que tive para ler. Não vi muitos filmes e também não escutei
uma quantidade considerável de discos, novos ou velhos. Em compensação, devorei
uns 20 livros, de diversos gêneros. E a lista ainda pode aumentar.
Nesta postagem do Talk
About The Passion falarei sobre dois volumes. A morte do pai, do escritor norueguês Karl Ove Knausgard, e Ainda estou aqui, do brasileiro Marcelo
Rubens Paiva.
O primeiro livro, parte inicial de uma trilogia intitulada Minha luta, narra de forma autobiográfica
a infância, a adolescência e a vida recente do próprio autor, interligando as
diferentes fases através da morte do pai de Karl; o segundo traz à tona a
história de Eunice, mãe de Marcelo e esposa do deputado Rubens Paiva, este
último, desaparecido após ter sido preso por agentes da ditadura. As lutas de
Eunice, por respostas relacionadas ao paradeiro do marido e contra o Alzheimer,
são os pontos principais do volume, escrito através das memórias do autor de Feliz ano velho.
Em ambos, chama atenção o talento dos escritores quanto à
transformação das lembranças pessoais em documentos literários de primeira
grandeza. As particularidades de cada vida são colocadas a serviço da reflexão
e do deleite de milhares de leitores. Impossível não se identificar, em algum
momento, com as histórias oferecidas por Karl e Marcelo. E o motivo é simples:
eles estão falando de você.
Li os livros durante um período pessoal muito conturbado. Em
setembro de 2014, minha mãe adoeceu por conta de uma moléstia que, até agora,
ainda não foi descoberta. Eu poderia falar sobre milhões de sentimentos e
sensações que passaram e continuam passando pela minha cabeça; a respeito do medo
e da esperança que rondam sem parar, revezando-se numa velocidade alucinante.
Ainda assim, em vez de exercitar a mente sobre como vai ser o futuro, só consigo
olhar para trás. E acho que é lá onde dormem os monstros.
O passado é um camaleão. Ao mesmo tempo em que funciona como
o combustível de Karl e Marcelo nos dois livros citados, transforma-se em
freio, em curvas sinuosas e inesquecíveis, em números de uma quilometragem que
não para de aumentar. Trinta e sete anos e contando – eu; sessenta e duas
primaveras seguindo em frente – minha mãe. Quantos anos você tem, leitor?
Ainda que não estivesse passando por situações tão
delicadas, tenho certeza que os volumes não perderiam nada em matéria de
impacto emocional. Nossas trajetórias, embora aparentemente ordinárias, escondem
tramas e lances riquíssimos. Talvez, busquemos a ficção para emergir do fundo
do oceano de dores e felicidades tão fantásticas que guardamos no fundo do
peito nunca pacífico. Como que para buscar um pouco de ar e mergulhar
novamente.
No silêncio de cada um de nós.
Por Hugo Oliveira
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