"There's a fear I keep so deep / Knew it name since before I could speak (...) If some night I don't come home / Please don't think I've left you alone"- Keep The Car Running, Arcade Fire

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Allen

Hoje, Woody Allen faz 75 anos. É o meu cineasta preferido. Que me perdoem Almodóvar, Tarantino, Bergman, Scorsese, Lynch e Eastwood, outros favoritos por aqui, mas nenhum outro diretor conseguiu tantos filmes geniais e que mexessem tanto comigo quanto Allen.

Muitos o consideram repetitivo e até entendo este argumento. Realmente, vários de seus filmes passam pelo protagonista classe média, geralmente com algum pendor artístico, problemas emocionais, em crise, buscando um sentido para a vida. O que estes detratores não entendem é que é exatamente isto que nós – fãs de Woody Allen – procuramos a cada novo lançamento.

Simplesmente porque nenhum outro nos faz rir com tantas tiradas geniais, mas não um riso esfuziante, exagerado. E sim um riso que mal esconde ora uma amargura, ora uma ironia, ora melancolia e até – por que não? – o riso do desespero da falta de sentido da vida.

Não há um filme ruim em sua filmografia, mesmo um Allen menor é melhor do que 98% da produção cinematográfica atual.  Manhattan (1979) é o meu preferido, devo ter assistido, sem exagero, umas quinze vezes, linda fotografia, trilha sonora perfeita, uma Nova York idealizada, é um compêndio sobre as relações humanas, sobre o quanto somos todos tão complicados. A cena de Isaac Davis listando o que faz a vida valer à pena, terminando citando o rosto da mulher amada, é espetacular.

Annie Hall (1977), traduzido toscamente no Brasil como ‘Noivo neurótico, noiva nervosa’, é top 3 na minha lista de ‘filmes de relacionamentos’. Cenas antológicas, ousadias narrativas – ainda mais se levarmos em conta o ano de lançamento -, é um clássico com C maiúsculo. Em qualquer época da humanidade vai haver casais que se identifiquem com Singer/Annie.

Desconstruindo Harry (1997) é outro que adoro, principalmente por tratar de forma brilhante da construção literária. Zelig (1983) e Poucas e Boas (1999), falsos documentários geniais, este último com atuação perfeita de Sean Penn. Seus diálogos com Dostoievski em Crimes e Pecados (1989) e Match Point (2005) beiram a perfeição, filmes irrepreensíveis. Amo a fase bergmaniana, Interiores (1978) é deslumbrante, pesadíssimo, mas espetacular, um filme que considero subestimado em sua carreira. Outro pedaço de perfeição é Hanna e suas irmãs (1986), um filme mais “aberto” (não me perguntem), com excelentes atuações e citação de meu poema preferido de e. e. Cummings. A volta ao passado de A era do rádio (1987), o exercício sublime de metalinguagem em A rosa Púrpura do Cairo (1985), o ousado e perfeito Memórias (1980), a agilidade e roteiro perfeito de Tiros na Broadway (1994).

Enfim, são filmes que mudaram – e continuam mudando – a minha vida, pois não canso de revê-los e, cada vez que os assisto, uma nova cena, um novo diálogo, ou os mesmos deslumbramentos de sempre iluminam a minha vida, trazendo-me um pouquinho de sentido a essa existência absurda. O sentido que estes personagens, como amigos de uma vida toda com quem compartilho minhas angústias e inquietações, tanto procuram. 

Por Ricardo Pereira
Play it Again, Woody

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