A notícia relacionada ao fechamento de vários sebos e
livrarias no Rio de Janeiro coloca em alerta máximo gente como eu, que não abre
mão de uma bela sessão de “garimpo” em qualquer estabelecimento do tipo. Só de pensar que gerações futuras poderão
perder a chance de percorrer esses verdadeiros labirintos, muitas vezes
empoeirados, de palavras e ideias, substituindo-os pela fria e impessoal compra
pela internet, já bate um medo danado.
Não que adquirir volumes pelo comércio digital seja ruim. A
grande disponibilidade de títulos, as promoções imperdíveis, a facilidade referente
ao processo, enxergo tudo de uma forma muito positiva. Mesmo assim, não existe
nada mais prazeroso do que vasculhar estantes recheadas de volumes ao vivo. Encontrar
aquele verdadeiro tesouro que, em muitas ocasiões, ainda pode vir recheado com
outros tesouros.
No começo de janeiro deste ano visitei uma feira de livros na
cidade onde moro, Angra dos Reis. Umas sete barracas lotadas de obras para
todos os gostos. Gastei R$ 20,00 e levei seis volumes. Três adquiridos por R$
5,00 cada, dois por R$ 2,00 cada e um Júlio Cortázar por R$ 1,00. Felicidade
total!
Ao voltar para casa, resolvo folhear melhor os livros,
examinar as lombadas, enfim, sentir o clima de cada um. Em dois deles, encontro
marcas das pessoas que, ao menos por algum tempo, estiveram diretamente ligadas
aos volumes.
No livro “Criaturas Flamejantes”, de Nick Tosches, quarto volume da Coleção Iê Iê Iê –
Editora Conrad –, existe uma dedicatória escrita logo na primeira página, assinada
por “Dani”, no dia 15 de maio de 2014 – foto abaixo. Arrisco-me a dizer que a
pessoa responsável pelas palavras já havia lido a obra e, encontrando algo
muito importante nela, resolveu presentar alguém ou até mesmo um possível
pretendente. Torço para que tudo tenha dado certo.
Em outro livro, “Música para Camaleões”, do jornalista e
escritor Truman Capote – Editora Nova Fronteira –, o tesouro é ainda mais
saudosista. E enigmático. Na página 59, acho uma foto de uma jovem com seus 16,
18 anos, em preto e branco – abaixo. Do lado de trás da fotografia, o dia e o ano em que
o retrato foi tirado, 17 de agosto de 1977, e o local, algo como Mauá Foto
Studio, na Rua Mariz e Barros, Tijuca, Rio de Janeiro.
Por que aquela foto estava ali? Estaria apenas marcando a
página em que o leitor havia parado ou teria um significado maior? Pertenceria
a algum rapaz apaixonado? Quem sabe teria sido colocada ali pela própria menina
da fotografia? Muitas hipóteses e nada de concreto. Um mistério delicioso e,
quem sabe, possível de resolver?
O livro custou R$ 5,00. Quer saber? Estou disposto a
entrega-lo à garota da foto, mesmo que ela não tivesse sido a real dona dele.
Abrir aquele volume e dar de cara com a fotografia em preto e branco foi ainda
mais mágico do que encontrar a obra por uma quantia módica. Se o leitor quiser
me ajudar nessa empreitada, é só compartilhar este texto. Quem sabe a menina
não aparece?
Aparecendo ou não, os questionamentos oferecidos pela
história já valeram. Não tem preço que pague essas marcas tão pessoais deixadas
nos livros. Lembrei-me de uma história ainda mais incrível, vivida pelo
companheiro de blog Ricardo Pereira. Vou tentar resumir: Ricardo e sua família
viveram por muito tempo no bairro de Bangu, no Rio de Janeiro. Conheceram Angra
dos Reis, se apaixonaram pela cidade e, no começo dos anos 90, vieram tentar a
vida no município famoso pelas 365 ilhas.
Ricardo era um adolescente quando veio morar em Angra. Após
terminar o segundo grau, voltou ao Rio, ao mesmo bairro em que vivia, para
fazer um cursinho pré-vestibular. Instalado na casa de uma conhecida de sua
família, resolveu passear pelas redondezas – arrisco dizer que para procurar
CD’s e livros. Em pouco tempo ele descobre um sebo. Lá dentro, já no processo
de garimpo, encontra o “Cem anos de solidão”, obra-prima do escritor Gabriel
García Márquez. Abre o livro e, pasmem, acha a assinatura do próprio pai.
Daqueles momentos para nunca mais esquecer.
Por Hugo Oliveira
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