David Bowie entrou na minha vida através da inesquecível
levada de bateria na introdução de “Five Years”, canção que abre o disco The Rise and Fall of Ziggy Stardust and the
Spider From Mars (1972).
Quando ingressei na faculdade de jornalismo, em
2002, os primeiros amigos que fiz no curso, Wagner Fester e Roberto Lestinge,
indicaram com certa urgência a necessidade de conhecer o trabalho do inglês que,
desde o final dos anos 60, vem deixando suas marcas não somente na música pop,
mas na cultura mundial.
Eu morava em Campo Grande, no Rio de Janeiro, na época do
curso de comunicação. Estudava em Ipanema. Pegava trem e ônibus para chegar ao
campus. Uma hora e meia para ir e umas duas para voltar. Mesmo com todas as
dificuldades, os primeiros dias no Rio foram fascinantes. Livrarias, lojas de
disco, pontos turísticos que só via pela televisão... Era um paraíso para um
garoto que cresceu em Angra dos Reis e que só saiu da cidade aos 23 anos.
Um dos lugares que costumava frequentar religiosamente era
uma banca que vendia CD’s importados na Uruguaiana, um grande camelódromo no
centro da cidade. Num belo dia, indo para a faculdade, resolvi dar uma parada
estratégica para saber se alguma novidade havia pintado. Dito e feito: uma
edição dupla comemorativa dos 30 anos do álbum Ziggy Stardust estava
disponível. Tremi nas bases. A capa, as músicas, o encarte grosso e as canções
extras fizeram com que eu retornasse a Campo Grande para desfalcar uma parte da
grana que meus pais enviaram a mim, investindo-a na compra do disco. Naquele
dia eu não fui à aula.
Assim que cheguei da rua, sentei no sofá e dei inicio ao
ritual. Rasguei o plástico do disco com cuidado. Folheei o encarte e peguei o
CD que continha o álbum remasterizado. Coloquei no Discman e pronto, fui capturado instantaneamente. “Five
Years”, “Ziggy Stardust”, “Lady Stardust”, “Hang On to Yourself”, “Moonage
Daydream”, “Suffragette City”, “Starman”, “Rock’n’Roll Suicide”… Canções
lindas, criativas e fáceis, no melhor sentido possível. Estava
convertido. E eu sabia que era para sempre.
Depois vieram outros discos. Diamond Dogs (1974), que ainda tinha muito da fase Glam e, ao mesmo
tempo, acrescentava sonoridades diferentes, como o soul poderoso de “1984”,
segue como um dos prediletos; Low (1977),
um álbum quase inclassificável, também merece devoção. Logo eu, que nunca fui
muito chegado a discos ditos difíceis, apaixonei-me de cara pelas faixas do CD.
O que dizer, por exemplo, de uma canção como “Warszawa”, trilha sonora do mundo
acabando e renascendo logo em seguida? Estupefação e beleza em doses cavalares.
Hunk Dory, Aladdin Sane, Pin Ups, Heroes, Station to Station, Young Americans e The Next
Day – este último, presente do grande amigo Ricardo Pereira, companheiro de
blog – completam a minha coleção particular, que ainda carece de títulos
importantes como Scary Monsters (and
Super Creeps), Lodger, Space Oddity, The Man Who Sold the World e Let’s
Dance e o próprio Black Star,
lançado dois dias antes da morte do artista.
A cultura pop tem uma grande dívida com Bowie. Punk, New
Wave, No Wave, Post-punk, nada disso existiria sem ele. Bandas como Suede e até
mesmo The Smiths, por exemplo, não teriam a mesma sonoridade brilhante; Lou Reed
e Iggy Pop não lançariam discos tão essenciais quanto aqueles que, de alguma
forma, têm a mão do camaleão. Até o
movimento gay precisa prestar reverência ao alienígena andrógino, pela
declaração, mesmo que baseada numa jogada de marketing, de que ele era
bissexual.
Eu também terei que pagar o que devo a Bowie, pelas
maravilhosas músicas criadas por ele e seus parceiros. Vou efetuar o pagamento
bem devagarzinho, parcelado, através da compra dos discos que ainda não tenho.
Assim, mesmo que ele já não esteja entre nós de corpo presente, cada nova
aquisição será saboreada como um disco inédito.
Assim, seguirei envelhecendo com a certeza de que Bowie ainda
está por aqui, e que a qualquer momento, eu e o Marcel, sentados na cama da
nossa mãe, vamos ouvir o Diamond Dogs e
pirar.
Don’t think
you knew you were in this song, “blódah”.
Turn and face the strange |
Por Hugo Oliveira (para Marcel Oliveira)
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