"There's a fear I keep so deep / Knew it name since before I could speak (...) If some night I don't come home / Please don't think I've left you alone"- Keep The Car Running, Arcade Fire

domingo, 31 de outubro de 2010

E hoje em dia, como é que se diz?

Ele sempre fora dramático e impressionável. Quando criança, constantemente sentia medo, quando seu pai se atrasava um pouco do trabalho, que ele não chegasse. As piores situações passavam por sua cabeça, os mais variados tipos possíveis de mortes, confusões, imprevistos. Isso ia crescendo e o angustiando, até seu pai aparecer no portão.

Anos depois, voltando da praia com seu afilhado, resultado talvez de umas cervejas a mais, não viu um carro vindo ao atravessar a rua e foi contido pela mãozinha do menino, que o puxou de volta para a calçada. Por essa situação banal, passou muitos anos imaginando o inferno que seria a vida sem o seu afilhado, talvez perdido por uma imprudência sua.

Mais tarde, Ela apareceu. Um namoro perfeito para alimentar sua melancolia e dramaticidade: um relacionamento à distância, pontuado por cartas melodramáticas em que ambos esmiuçavam cada encontro, aumentando a saudade e que tão bem combinavam com as canções que ele ouvia sozinho, a sete cidades de distância.

Uma vez, com a relação já estável e consolidada, os dois conversavam ao telefone, na véspera de um encontro, antecipando como seria bom estarem juntos novamente, e a ligação caiu, o telefone ficou mudo. Ele tentou ligar diversas vezes, o telefone chamava e nada... Esperou que ela retornasse o telefonema, os minutos, horas passavam e só o silêncio enervante do seu pequeno apartamento. Sua mente não perdeu tempo e produziu as piores circunstâncias. Quase não dormiu, e, no dia seguinte, tentou ligar seguidamente, chegando ao exagero de conseguir o telefone do prédio dela, ligar para uma vizinha ver o que havia acontecido. “Não há ninguém lá, chamei várias vezes...”

Foi a senha para a viagem mais tensa da sua vida, a certeza de que o pior havia acontecido o aterrorizava. A chegada no apartamento, três toques na campainha, a demora em atender, abuso de clichês cinematográficos, de repente Ela abre a porta e ele nunca esquecerá esta cena, sua beleza, seu sorriso e, mais do que qualquer coisa, o imenso alívio da constatação de que ela estava ali, viva, bem.

Mais um salto temporal, dessa vez maior. O tempo destrói tudo, não seria diferente com eles, irreversível. Nunca se desligaram completamente, e-mails, telefonemas esporádicos, raros – e excelentes – encontros, um respeito, carinho e orgulho do que construíram, mesmo que a vida os tivesse condenado à distância.

Um dia, num momento em que as circunstâncias os aproximaram, aconteceu novamente. Uma mensagem pela metade, a promessa de se falarem mais tarde, silêncio. Mensagem, telefonemas, e-mail, nada... Algo acontecera com ela, ele tinha certeza e essa certeza vinha do fato de Ele saber que provavelmente nada acontecera. Em sua mente doentia, se na época de namoro ele pensou o tempo todo no pior e não houvera nada, dessa vez, o fato de ele saber que ela devia estar bem era o indicativo de que, sim, algo de ruim estava acontecendo.

Essa noite, ele conseguiu dormir. Mas a manhã trouxe angústia e preocupação, não conseguia contato. Um relacionamento entre eles a essa altura da vida era algo improvável, mas a possibilidade de que ela não existisse mais nesse mundo o angustiava, o entristecia. Eram amigos, mas como ex-namorados, há sempre um ciúme presente. Ainda assim, o que ele mais desejava era uma mensagem, um e-mail, um telefonema dizendo que ela estava com alguém, feliz, divertindo-se, mas viva e bem.

A mensagem veio, não com esse conteúdo, apenas para informar que estava tudo bem. Mais uma vez, alívio imenso. No entanto, sem sua presença e beleza por perto. Mas a constatação de o mundo ser um lugar melhor para se viver com ela presente, de, mesmo nunca mais havendo nada entre eles, o simples fato de ela existir trazer mais sentido a sua vida, fez com que Ele pensasse que isso talvez fosse o que as pessoas tanto procuram e costumam chamar de Amor.

Por Ricardo Pereira

the importance of be god

É impressionante o quanto, cada vez mais, as pessoas se preocupam com imagem. Decidi raspar minha barba e deixar só o bigode e é engraçado notar a reação das pessoas. A maioria se incomoda bastante, alguns criticam pura e simplesmente, outros acham que é uma espécie de piada. Os alunos, então, são um capítulo a parte, tirando uma turma de nono ano, que aplaudiu efusivamente, os demais alternaram-se entre envergonhados e divertidos.

Fiquei pensando no porquê de o bigode ter perdido espaço em nossa sociedade. Talvez seja uma questão de ‘limpeza’ ou frescura no padrão de beleza atual. Na antiguidade, o bigode era sinônimo de poder, os grandes homens da história ostentavam uma bigodeira considerável. Nem preciso citar nomes, abra um livro de história e confira.

A barba completa goza de grande prestígio atualmente, seja por artifício usado para amenizar a feiúra, aumentando-a (??) ou para se ‘defender’ do mundo, escondendo-se. No Brasil, podemos perceber uma quantidade considerável de barbudos, vá para a Lapa à noite em qualquer fim de semana ou em um show de qualquer banda indie e repare, brotam fãs do Los Hermanos e os lamentáveis playboys socialistas dos centros acadêmicos universitários.

Até minha mãe criticou minha nova aparência - e olha que para mãe achar filho feio é porque o negócio é sério... –, argumentando que as pessoas da minha idade não usavam mais bigode, que eu estava parecendo velho e por aí vai. Não me importo, é só lembrar de Belchior, Valdir, Eufrasino, Seu Madruga e outros ídolos e notar que estou em muito boa companhia para seguir em frente, bigodeando por aí!

Por Ricardo Pereira

a hora e a vez do bigode crescer


sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Se for baixar um disco...

Título: My Maudlin Career

Banda: Camera Obscura

Ano de lançamento: 2009

País: Escócia

Som: indie pop

Sol a pino, com ausência de nuvens. Temperatura agradável. Descrição da previsão do tempo para esse fim de semana? Sim, caso você tenha em mãos – e nos ouvidos – o último álbum lançado pelo sexteto escocês Camera Obscura, “My Maudlin Career”. Guitarra, violão, baixo, teclado, bateria e metais... Tudo muito simples, mas com timbres e efeitos escolhidos quase que cirurgicamente. Orquestrações primorosas, de deixar os olhos embargados nos refrãos. Letras sobre relacionamentos, criadas a partir da ótica feminina. Uma voz cheia de fofura e charme, temperada com aquela melancolia que só o pessoal do velho mundo sabe dosar de forma certeira. O resultado? Um casamento entre o Belle & Sebastian dos primeiros discos, o Beach Boys dos últimos trabalhos e o Phil Spector de todas as épocas. É até chato destacar alguma coisa num disco como esse, mas a trinca inicial de canções – “French Navy”, “The Sweetest Thing” e “You Told a Lie” – é para transportar qualquer pessoa a um lugar maravilhoso, onde o sol brilha forte, o céu é sempre azul e os sorrisos são fáceis.

Ah, sim: nesse lugar, o amor continua sendo uma faca de dois gumes. Nada é perfeito.

Por Hugo Oliveira
Capa do disco "My Maudlin Career", do Camera Obscura
                                                     

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Azul celeste

Sete palavras:

Viraram mar

Estes meus sentimentos de cinzas

Mais abaixo, uma dedicatória:

p/meu pai

Foi assim que eu conheci o blog de uma colega, o http://andoando.blogspot.com/. Por causa dela, ou melhor, por causa dos vocábulos certeiros escolhidos pela Paula no haicai acima, eu me emocionei, e voltei a pensar na morte – aliás, um tema recorrente para mim.

Informações básicas: o haicai é um poema de origem japonesa, que chegou ao Brasil no começo do século 20. Peguei emprestado da internet algumas características/regras dele:

1 – Contém alguma referência à natureza – diferente da natureza humana.

2 – Faz referência a um evento particular – ou seja, não é uma generalização.

3 – Apresenta tal evento como "acontecendo agora", e não no passado.

Bingo. Um haicai. Um ótimo. Quando li o poema, não sabia que o pai dela havia falecido. Mas desconfiei. Depois de contar que gostei muito da obra que ela criou, Paula me mandou um recado pelo Orkut, devidamente reproduzido aqui. “É pro meu pai, que deve estar tomando uns gorós com Leminski, orgulhoso então”.

Paulo Leminski era escritor, poeta e tradutor. Escreveu os haicais mais bonitos que eu já li. Morreu em 1989.

Paula é uma colega um pouco distante – nos conhecemos por amigos em comum. Escreveu um dos haicais mais bonitos que eu já li. Está "Vivinha da Silva"!

Eu escrevi que este texto fala sobre a morte, certo? Errado. Esta postagem versa sobre algo maior: o poder de transformação.

A vida que se viveu, as boas lembranças, a ligação emocional com um ente querido... Tudo isso não impede que a morte faça o seu trabalho no momento em que tem que ser feito. Mas depois, quando a vida volta à primeira página, acredito que é aí que pinta a grande diferença.

A dor, imagino, deve continuar. Mas aquele “sentimento de cinza”, tão bem descrito pela Paula, vira mar. Foi-se a morte. Minguou. Morreu.

Agora, só um oceano de amor. Sempre em movimento, grandioso, vivo.

Azul celeste.

Dedicado a todos que, apesar da morte, não abrem mão da vida.

Por Hugo Oliveira 





quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Radiohead


Pedro Henrique, grande amigo, me pediu uma lista das canções do Radiohead que eu mais gostava para que ele pudesse ‘estudar’ a banda e, com isso, me entender melhor. Ideia meio maluca, no entanto interessante. Foi difícil demais fazer, pois tive que deixar muitas músicas importantíssimas de fora, mas consegui e vou deixar aqui. Pode ser útil para alguém que ainda não conhece a banda ou até para quem já conhece, mas está afastado.

Não coloquei nenhuma do primeiro disco, pois é o que menos gosto, apesar de algumas canções muito boas. Do segundo, ‘The Bends’ (1995), escolhi duas:

. Just – Canção poderosa, com excelente refrão e um dos melhores clipes que já assisti. Tocaram no show, não esperava, o que tornou tudo ainda melhor!

. Black Star – Taí uma canção que as pessoas quase não falam e que eu gosto demais. Trata de um relacionamento em estado de decomposição de uma forma amarga, como não poderia deixar de ser. A primeira estrofe é de arrebentar qualquer um.

(Deus me perdoe por ter deixado ‘Sulk’ e ‘Street Spirit’ de fora...)

‘Ok Computer’ (1997), um dos discos mais importantes da década passada, lindíssimo, um clássico, homem x máquina etc etc... Tudo verdade, mas só selecionei três – já estou me arrependendo dessa lista...

. Exit Music (For a film) – Triste de doer, uma das melhores interpretações vocais de Thom Yorke e outra letra de arrebentar. Desejo de fuga, inadequação ao mundo. Rolou inveja forte do povo de SP que viu ao vivo.

. Let Down – Uma das mais bem trabalhadas das canções da banda. Bela letra, harmonia vocal e arranjo lindíssimos!

. Lucky – Uma das músicas do Radiohead preferidas do Michael Stipe, inclusive é fácil achar versões com ele cantando com a banda, vale dar uma procurada!  Adoro o refrão e as guitarras!

everything in its right place (?)

‘Kid A’ (2000) é provavelmente meu disco preferido deles. A maioria das pessoas estranha de primeira, mas aí está um disco que vale a insistência. Daqueles para ouvir inteiro, sem pular nenhuma faixa, por isso foi difícil selecionar, mas fiquei com as seguintes:

. National Anthem – Introdução marcante de baixo e bateria, sopros atacando furiosamente no meio da música. Tem certeza que é a mesma banda? jazz? rock? arte. Ao vivo é acachapante.

. Optimistic – Depois de ‘um lado inteiro’ de estranheza, a canção que abre o lado b do disco é a mais palatável em uma primeira audição. “Olha, agora dá pra entender o que ele está cantando!! Acho que ouvi uma guitarra ali!” rs

. Idioteque – Não tem como deixar de fora. Um acidente de navio narrado, base eletrônica, interpretação intensa. Já pode chamar de clássica?


‘Amnesiac’ (2001) – Gravado na mesma sessão de ‘Kid A’, mantém a estranheza e a beleza (ok, para alguns, entendo quem não curte...):

. You and Whose Army? – Começa meio cabaré, vai mudando, crescendo. Desde a primeira audição fiquei encantado. Outra que rolou no show e eu não esperava.

. Life in a Glasshouse – Bem jazz, excelentes metais. Climão big band, fecha perfeitamente o disco!

‘Hail to the thief’ (2003) é um disco irregular, indeciso entre o Radiohead de antes e depois do Kid A. Mas, nesse álbum, o que é bom beira a perfeição.

. The Gloaming – Outra que quase ninguém gosta, mas que gosto demais. Bem eletrônica, hipnótica, vocal ‘desencontrado’. O que ele quer dizer na letra? Nem imagino, mas adoro! Se for procurar essa, prefira alguma versão ao vivo, que costuma ser melhor que a de estúdio, eles colocaram uma linha de baixo que fez a música crescer bastante.

. I Will – Baladinha simples e linda. Adoro a original e a Los Angeles Version.

. A Wolf at the Door – Política essa. Provavelmente o melhor momento da banda em estúdio, Yorke canta ‘vomitando’ a letra e a música crescendo absurdamente em um momento ímpar de angústia e beleza! Uma das que mais queria no show, mas não rolou...

E por fim, ‘In Rainbows’ (2008), a síntese perfeita de tudo o que a banda fez até hoje.

. 15 Step - Batidas eletrônicas abrem a canção (e o disco),  Thom yorke entra rasgando no vocal e a guitarrinha meio jazz que entra lá pelos 40 segundos é irresistível.

. Nude - Balada lindíssima, poderia estar no ‘ok computer’ fácil. Bem crua e com uma performance vocal impressionante! “Don’t get any big ideas, they’re not gonna happen...

. Faust Arp - Putaqueopariu, que beleza! Simples, curta, mas de uma beleza indescritível, só ouvindo. Agradeço todo dia a Deus por ter assistido ao vivo! rs

. Jigsaw Falling Into Place – Uma grande canção com vários andamentos, todos fodas! Lá pros 3 minutos fica mais que perfeita!

Alguém aqui ainda?

É obviamente um texto de fã, por isso tão repetitivo e deslumbrado. O Radiohead é uma banda que me encanta não só pelas músicas, letras, mas também pelo modo como conduz sua carreira, a intensidade e o cuidado com cada passo dado. Costumo dizer que até o ‘Ok Computer’ eles são como os Beatles até o ‘Rubber Soul’ ou, forçando uma barra, até o ‘Revolver’. Se eles tivessem terminado ali, seriam considerados uma grande banda, com um cantor acima da média e refrãos muito bons. Mas o que veio depois é que os faz uma das maiores bandas da história da música. Eles resgatam o que tem de melhor no bom progressivo, mas com muito mais feeling, além de dar um panorama perfeito dos nossos tempos. Se o REM é, para mim, a maior banda de todos os tempos (Beatles não conta, não comparo, pois não são desse planeta. Aliás, menos de um mês para fazer contato com um extraterrestre, mas isso é assunto para outro post...), Radiohead é a ‘minha banda’, a que eu ouviria pela última vez se soubesse que iria morrer e que teria direito a um último disco.

Por Ricardo Pereira

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Mesa de bar ou “adeus temas menores”

Influenciado pela última postagem do Ricardo, sobre a película do Freddy Krueger, pensei em escrever algo a respeito de livros policiais. Sim, porque a literatura policial, da mesma maneira que os filmes de terror, sofre preconceito por parte da “intelligentsia”. É uma arte menor? Não merece ser levada a sério? Deve ser percebida apenas como entretenimento? Discordo. Têm coisas ótimas ali. De Conan Doyle a Bukowski, de John Dunning a Luiz Alfredo Garcia-Roza e de Stieg Larsson a P.D James, para ficar apenas em exemplos óbvios, uma infinidade de histórias apaixonantes está vagando por aí, em livrarias, sebos e similares, prontas para serem descobertas.

Não deu. Fui tocado pela magia fulminante que resulta da seguinte equação: álcool + velhos amigos + cartão de crédito. Alguém aí consegue resistir? Mande a receita!

Não consigo pensar num momento mais adequado para acreditar que a vida é realmente bela senão quando estou numa mesa de bar. Tudo é divino e maravilhoso com nove chopes, uma porção de aipim e um filé aperitivo. Eu e meus amigos viramos poetas, rock stars e cineastas exatamente na hora em que entramos em algum recinto que serve bebidas e aperitivos. Discutir, debater, parafrasear, imaginar, citar, pensar... E tome verbo! E dá-lhe alegria, saudosismo, ironia e achismo. Tem gente que não gosta, por vários motivos. Eu adoro, por um milhão de razões. É isso. Estou um pouco bêbado, um bocado feliz e muito, muito satisfeito pelo papo de hoje. Sobre o que eu e meus amigos falamos? Fácil: música, cinema, sentimentos, família, sexo, situações esdrúxulas e sobre mulheres. Não poderia ser diferente, né? Três caras por volta dos 30 – ok, eu 32 –, mais ou menos encaminhados profissionalmente, querendo apenas um momento de distração e de diversão. O resultado? Risadas fáceis, conselhos valiosos e promessas de que aquele encontro tem que se repetir, em outras ocasiões. Que assim seja.

O sistema é mau... Mas a minha turma é legal pra cacete!

E os volumes policiais ficam para depois...

Por Hugo Oliveira


Pede a conta ou rola uma saideira?

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

In the arms of sleep


Não gosto de filmes de terror. A maioria me parece um exercício de estupidez, diálogos bobos, personagens rasos e banho de sangue. Mas há uma exceção: Freddy Krueger. Sabe-se lá porque este ficou, era meu anti-herói preferido da infância, lembro de assistir empolgado com meus irmãos, muitas vezes torcendo pelo vilão, devido a seu sarcasmo e seu carisma. É verdade que ríamos mais que nos assustávamos, apesar de lembrar ligeiramente de minha irmã não gostar da música que as menininhas cantavam -1,2 Freddy's coming for you... – rs

Ano passado eu e meu irmão assistimos aos dois primeiros da série e saímos meio decepcionados... São filmes divertidos e tudo, bem feitos pra época, mas nossa nostalgia tinha criado filmes melhores... Esse fim-de-semana naquela de ‘alugue três e leve um filme grátis’ acabei trazendo o remake do primeiro ‘A hora do pesadelo’, que foi lançado há pouco. E, talvez por ir sem grandes expectativas... gostei!

Não há nada demais. Estão lá os clichês todos dos maus filmes de terror, personagens sem graça, diálogos e situações inverossímeis, quase tudo que me afasta de cara do gênero. Mas conseguiu divertir e retomar um pouco do meu encantamento infantil pela série. É consenso que falta ao novo Freddy o humor tosco, irônico e sarcástico de antigamente, mas o personagem é tão forte no meu imaginário que funcionou! Além disso, o filme trabalha um pouco melhor o que mais gosto na premissa dos filmes da série: o medo de dormir para não ser morto. Algumas cenas, como o a da menina se queimando com o cinzeiro do carro para não dormir ou a excelente cena da farmácia com ‘All I have to do is dream’ dos Everly Brothers de fundo, funcionaram que é uma beleza.

As possibilidades de Krueger dentro dos sonhos das vítimas poderiam ter sido mais bem exploradas e se o filme fosse meu deixaria em aberto o passado do vilão, seria muito mais interessante se nos puséssemos a imaginar qual a real motivação por trás dos seus crimes. Mas não é a isso que o filme se propõe. E daí? O Ricardo de 13 anos aprovaria, é o que importa.

Por Ricardo Pereira


"ask me why, and I'll spit in your eye"

domingo, 24 de outubro de 2010

Sitting on a fence

Rob Fleming, personagem do livro “Alta fidelidade”, de Nick Hornby.

“(...) Algumas das minhas canções favoritas: “Only Love Can Break Your Heart”, de Neil Young; “Last Night I Dreamed That Someboby Loved Me”, dos Smiths; “Call Me”, com Aretha Franklin; “I Don’t Want To Talk About It”, com qualquer um. E há também “Love Hurts” e “When Love Breaks Down” e “How Can You Mend A Broken Heart” e “The Speed Of The Sound Of Loneliness” e “She’s Gone” E “I Just Don’t Know What To Do With Myself” e… algumas destas canções eu ouvi cerca de uma vez por semana, em média (trezentas vezes no primeiro mês, e de vez em quando depois disso), desde os dezesseis ou dezenove ou vinte e um anos de idade. Como é que isso pode não deixar você magoado de alguma forma? Como é que isso pode não transformá-lo no tipo de pessoa passível de se quebrar em pedacinhos quando seu primeiro amor dá todo errado? O que veio primeiro, a música ou a dor? Eu ouvia música porque estava infeliz? Ou estava infeliz porque ouvia a música? Esses discos todos transformam você numa pessoa melancólica? As pessoas se preocupam com o fato das crianças brincarem com armas e dos adolescentes assistirem a vídeos violentos; temos medo de que assimilem um certo tipo de culto à violência. Ninguém se preocupa com o fato das crianças ouvirem milhares – literalmente milhares – de canções sobre amores perdidos e rejeição e dor e infelicidade e perda. As pessoas afetivamente mais infelizes que conheço são as que mais gostam de música pop; e não sei se foi a música pop que causou tal infelicidade, mas sei que elas vêm ouvindo as canções tristes há mais tempo do que vêm vivendo suas vidas infelizes”.

Tom Hansen, personagem de Joseph Gordon-Levitt em “500 dias com ela”, grosso modo, desabafando sobre os cartões postais que eram feitos na empresa em que ele trabalhava.

“(...) E esse, com os corações bonitinhos? Acho que sei que tipo de cartão é esse. ‘Feliz dia dos namorados, docinho. Eu te amo’. Não é lindo? O amor não é ótimo? É exatamente disso que estou falando. O que isso significa, amor? Você sabe? Você? Alguém? Se alguém me desse esse cartão, Sr. Vance, eu o comeria. São esses cartões, os filmes e as músicas pop, eles são os culpados por todas essas mentiras e pela dor, por tudo. Nós somos responsáveis. Eu sou responsável. Acho que nós fazemos uma coisa ruim aqui. As pessoas deveriam poder dizer como se sentem, como realmente se sentem, e não, como vocês sabem, usar palavras que um estranho coloca em suas bocas. Palavras como amor, que não significam nada”.

Tradução da música “Sad Songs”, de Elton John.

Canções tristes
Acho que, às vezes, todos precisamos compartilhar nossas dores
E ajustar os pontos difíceis
É a pior parte quando as memórias permanecem
E é em momentos como esse que precisamos ouvir o rádio
Pois dos lábios de algum cantor antigo
Nós podemos compartilhar os problemas que já conhecemos

Ligue, ligue
Ligue naquelas músicas tristes.
Quando toda esperança se for
Por que você não sintoniza e liga?

Elas penetram dentro seu quarto,
Apenas sinta seu toque gentil.
Quando toda esperança está acabada,
Canções tristes dizem tanto...

Se alguém mais está sofrendo o suficiente para por isso no papel,
Quando cada simples palavra faz sentido,
Então fica mais fácil ter aquelas canções por perto
O impulso interior está naquela frase que conquista você
E parece tão bom se magoar tanto
E sofrer apenas o suficiente para cantar as tristezas...

Canções tristes, elas dizem...
Canções tristes, elas dizem...
Canções tristes, elas dizem...
Canções tristes, elas dizem tanto...



Acredito que, de uma forma ou de outra, todas as citações inclusas nesta postagem têm ligação com o ótimo texto do Ricardo, intitulado “Não adianta”.

Se seríamos mais felizes hoje, se conseguiríamos levar o mundo de forma mais leve, se pensaríamos menos, enfim, se aproveitaríamos mais a vida estando longe da cultura pop? Acho que teremos que conviver com a dúvida. Não dá para voltar atrás. Somos aquilo que nossos pais, familiares e amigos nos ensinaram, mas também somos o que lemos, ouvimos e assistimos. Logo, mesmo se fizéssemos um “regime pesado”, essas músicas/filmes/livros continuariam lá, no nosso corpo, como um punhado de pele flácida. A sorte é que não estamos sozinhos nessa. Não estamos sozinhos em estar sozinho nesse mundão cruel.

Por Hugo Oliveira    

Ei, é uma camisa do Joy Division? Isso não é um bom sinal...






Não adianta


Há algumas semanas comecei a assistir à sexta temporada de House. Após um primeiro episódio duplo excelente, vieram alguns de enrolação apresentando um processo de humanização do protagonista que ainda estranho um bocado. Mas ao chegar ao nono episódio, “Ignorance is Bliss”, deparei-me com uma questão que é tema recorrente em conversas com meus amigos: o quanto a aquisição de cultura nos faz crescer e ao mesmo tempo nos torna cada vez mais angustiados.

Na verdade, este aparente paradoxo inteligência/felicidade é constante na série, visto House ser tão genial quanto infeliz. Mas, dessa vez, o foco é um paciente: um físico com um QI 178, com trabalhos geniais em sua juventude, que resolve trabalhar como entregador e se afasta completamente do meio acadêmico. No desenrolar do episódio, vemos que o paciente se drogava com uma mistura de álcool e um medicamento com a finalidade de “emburrecer” e conseguir viver uma vida normal com sua esposa. O motivo é que, com sua inteligência extraordinária, não conseguia conviver com sua companheira, sem diminuí-la constantemente.

Foi inevitável lembrar as conversas citadas no primeiro parágrafo, sobre o quanto os livros, discos, filmes podem formar pessoas melhores, mais críticas e ao mesmo tempo mais angustiadas, infelizes por pensar demais. No meu caso, penso nos artistas fundamentais em minha formação, que me fizeram ser o Ricardo de hoje. Será que se aos 7, 8 anos eu não estivesse ouvindo Legião Urbana – “eu quis o perigo e até sangrei sozinho” pode ser pesado para um pré-adolescente – eu seria mais feliz hoje? Se eu não me apaixonasse por Machado aos 14, se não aprendesse inglês traduzindo Beatles e Smiths na mesma época, se não tornasse Dostoievski minha bíblia aos 19, se aos 20 e pouco não mergulhasse no universo de Rubem Fonseca, se aos 23 não me apaixonasse por Saramago – sem contar Borges, Yorke, Corgan, McEwan, Young, Allen... – se não fossem esses e outros tantos ‘ses’, seria mais feliz hoje, conseguiria levar o mundo de forma mais leve, pensaria menos, ‘aproveitaria’ mais?

Não há resposta para essa pergunta. Meus amigos e eu, vez por outra, desabafamos e nos iludimos pensando em como seria bom pensar menos, contentarmo-nos com pouco, sermos mais ignorantes e, por consequência, mais felizes. Mas ao nos depararmos com o comportamento da maioria absoluta de idiotas ao redor, acabamos voltando atrás envergonhados, envergando, sem um pingo de orgulho, um sorriso melancólico.

Esse texto pode parecer arrogante ou presunçoso para quem não me conhece ou me conhece pouco. Estou longe de ser um gênio como o personagem motivador deste texto e penso que as poucas referências citadas anteriormente apenas confirmam isso por tratarem-se basicamente de cultura pop, o combustível de minhas angústias e de minhas glórias.

Ou, como escreveu Jeff Tweedy, outro de meus heróis: “I wonder why we listen to poets when nobody gives a fuck”.

Por Ricardo Pereira
"I fear that I am ordinary,  just like everyone"

sábado, 23 de outubro de 2010

Os tempos da minha vida

Este blog, como o próprio título faz alusão, veio ao mundo para que eu e meu amigo, Ricardo Pereira, falemos sobre nossas paixões. Uma delas, indiscutivelmente, é a música. Meu primeiro texto no “Talking about the passion” versa sobre o retorno da banda americana Green Day ao Brasil, mais precisamente, ao Rio de Janeiro. No dia 15 de outubro, quase 12 anos depois da primeira passagem do trio pop/punk pela capital carioca, Billie Joe – guitarra e voz –, Mike Dirnt – baixo – e Tré Cool – bateria –, voltaram à Barra da Tijuca para uma apresentação tão agitada quanto milimetricamente ensaiada. Eu estava no antigo Metropolitan naquele 6 de novembro de 1998; também marquei presença no HSBC Arena, numa agradável sexta-feira. O que mudou? Muitas coisas. Eu, principalmente.

Flashback, por favor!
1998: Hugo Oliveira morava em Angra dos Reis. Era auxiliar de serviços gerais naquela época. Trabalhava na drogaria Farmasim, localizada no centro. Ganhava uns R$ 200,00 – era pouco. Tinha 20 anos. Era vocalista da banda de punk rock Malkavianos. Pesava uns 60 quilos. Usava brincos nas duas orelhas. Havia acabado de romper com a namorada.  Amigos inseparáveis: Gláucio, Squitch e Rafael Ramones. Foi ao show de carro, de carona com amigos. Usava uma camisa com a capa de “Dookie”, 3º disco do Green Day. Antes da apresentação, perambulou pelo Barra Shopping e comprou o CD – importado – “Meat is Murder”, do grupo inglês The Smiths. Assistiu ao show na pista, bem perto do palco. Não bebeu uma gota de álcool. Teve medo de tomar porrada no começo. Dançou durante quase toda a performance da banda. Músicas prediletas no show: She, Basket Case, When I Come Around, Nice Guys Finish Last, Hitchin a Ride e Good Riddance (Time of Your Life), sendo que a última fechou a apresentação. Voltou encharcado de suor. Teve uma forte cãibra na volta. Não dormiu quase nada, mas teve histórias para contar no trabalho.

Voltando ao presente
2010: Hugo Oliveira mora em Angra dos Reis. É jornalista e ainda faz uns bicos como discotecário. Trabalha na subsecretaria de Comunicação do município, localizada no centro. Recebe quase dez vezes mais do que ganhava – é pouco. Tem 32 anos. Não canta em nenhuma banda. Pesa 87 quilos. Tem marcas de brincos pelo corpo. Completou recentemente quatro anos e 11 meses de namoro. Amigos inseparáveis: Ricardo e Pedro. Para chegar ao show pegou táxi, barca, metrô e ônibus do metrô – integração –, acompanhado de amigos e da namorada. Usava uma camisa polo preta com listras coloridas – com uma insígnia de rato. Antes da apresentação, se apressou para ir ao bar e comprou algumas fichas de bebidas. Assistiu ao show da arquibancada superior, bem longe do palco. Bebeu quase dois litros de álcool. Viu uma briga de longe, no começo. Agitou pouco o corpo durante a performance da banda. Músicas prediletas no show: She, Basket Case, When I Come Around, Nice Guys Finish Last, Hitchin a Ride e Good Riddance (Time of Your Life), sendo que a última fechou a apresentação. Voltou com fome. Tirou uma bela soneca ao retornar. Dormiu muito, e quase não fez menção ao show no trabalho.

Conclusões
O tempo é agridoce. Faz rir e chorar, igualzinho ao show do Green Day. Sim, porque é engraçado ver uma banda que começou baseada no punk à Husker Dü/Buzzcocks se profissionalizar de tal forma que acaba parecida com, sei lá, o Kiss – grupo de rock clássico dos anos 70. Explosões no palco, poses e pulos ensaiados, cabelos estrategicamente desgrenhados... Isso sem contar com o número de integrantes, que praticamente dobrou – músicos de apoio. A música, infelizmente, é o de menos agora. Não que eu não soubesse que imagem é tudo, mas algo mudou. Isso não impediu que eu presenciasse momentos ainda emocionantes, como o já citado número final, “Good Riddance (Time of Your Life)”. A letra da música, um pequeno achado sobre a perda da inocência, fala sobre a passagem do tempo. Sobre se tornar adulto e ter que conviver com as inesquecíveis memórias da juventude.
Um dos meus amigos inseparáveis, o Pedro, estava do meu lado no momento em que a canção foi apresentada. Ele me ouviu cantar um pedaço da música e, de pronto, juntou as mãos, como se fosse um microfone, apontando-o em minha direção.
Eu balancei a cabeça e sorri, meio sem graça. Não cantei.
Aquele cara magrelo, com brincos na orelha e com a camisa do “Dookie”, cantaria.
Pena que ele não estava mais lá.

Por Hugo Oliveira

O trio (?) punk/pop (?) Green Day: temos todo o tempo do mundo?
                                                    







Começou!

Em vez de criarmos um texto longo e pomposo, falando sobre os motivos que influenciaram a criação deste blog, decidimos - Hugo Oliveira e Ricardo Pereira - ir direto à ação. Logo, a partir de agora, textos sobre música, cinema, literatura e cultura pop, em geral, serão figurinhas fáceis no "Talk About The Passion" - ou TATP, para os íntimos.

Divirta-se!