Com longo atraso, finalmente li a
autobiografia de Lobão, 50 anos a mil.
Sempre admirei o grande Lobo por sua inteligência e postura polêmica e direta,
características em falta no cenário cultural brasileiro. Além, é claro, de suas
grandes canções.
Ouvia com gosto seus sucessos dos
anos 80, mas comecei a me interessar de verdade por sua obra a partir do álbum
de 1995, Nostalgia da Modernidade. Lembro
de ter ouvido Lobão tocar uns sambas lindos num programa de rádio ou televisão,
não me recordo, e, ao adquirir o disco, fiquei chapado: pareciam sambas de um
Paulinho da Viola! E misturados a bons pop-rocks. Gostei também do eletrônico Noite, uma espécie de transição para os
dois melhores trabalhos de Lobão, os magníficos A vida é doce e Canções
dentro da noite escura. Ali ficava claro que Lobão não parou no tempo e que
era o único da geração 80 do rock brasileiro atualizado musicalmente ou com
talento (ou coragem) para lançar música nova e instigante e não ficar se
repetindo eternamente como seus colegas de geração.
Conheci Lobão em 2004 por ocasião
de um show seu na lona cultural de Realengo que acabou não acontecendo por
problemas técnicos. Acabei me estendendo no local para tentar trocar meu
ingresso e, quando estava saindo, Lobão saía também. Acabamos trocando ideia
por bastante tempo, falamos sobre literatura, nosso encantamento pelo Radiohead
e Portishead, entre outros assuntos. Fiquei com impressão ainda melhor do cara,
atencioso, educado e sóbrio, em nada parecia com a imagem distorcida que até
hoje parte da imprensa o impinge.
E é exatamente esta desmistificação
uma das grandes qualidades do livro. Lobão conta sua história, pessoal e
musical, com a sinceridade que lhe é característica, não poupando ninguém – nem
a si mesmo – de pesadas críticas, mas também mostrando sua sensibilidade e
doçura, o lado que as pessoas não costumam ter acesso.
O livro é divertidíssimo,
daqueles que não se consegue parar, li suas quase 600 páginas em três dias. Repleto
de episódios hilários, outros dramáticos, a impressão que se tem, durante a
leitura, é de estar conversando com o Lobão num botequim. Embora a maioria dos
leitores destaque as polêmicas, o que mais gostei no livro foi a descrição dos
bastidores de composição e gravação dos discos e a repercussão deles na
imprensa. É bonita também a história de amor entre Lobão e Regina, um
relacionamento verdadeiro, raro, em que os dois se ajudam e seguem alimentando
a paixão.
Senti falta de um detalhamento
maior no período mais interessante e criativo de Lobão, seus álbuns a partir do
Nostalgia da Modernidade, são poucas
páginas dedicadas a seu melhor material, infelizmente pouco conhecido. Ainda
assim, 50 anos a mil é muito bom,
extremamente recomendado a todos que se interessam pela música popular
produzida no Brasil nas últimas décadas.
Por Ricardo Pereira
O Lobão é um cara interessante. Confesso que até hoje não ouvi um disco dele. Mas depois de ler isso fiquei com vontade.
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