Sempre tive a nostalgia como
companheira. Desde minha infância, sentindo saudades de uma época que não vivi
ao assistir a Anos Incríveis ou ouvindo
os discos de meu pai. Agora dei para ter nostalgia das séries a que venho
assistindo. Sopranos bateu forte e
deixou um vazio, sinto saudades dos personagens, até sonho com eles. Esta
semana acabei Six Feet Under e, pelo
visto, vai acontecer o mesmo. Acabei, durante o seriado, me apaixonado pela
Claire, mas gostaria de alguém como a Maggie para casar, mas isso é outra
história...
Quero a cumplicidade do Henrique
na época de alojamento, pizza “à moda” em dias de jogo, sua companhia nos shows
do Caetano ou do António Zambujo; ouvir o Paul McCartney cantando “The long and
winding road” abraçado com meu pai num Engenhão quase onírico; cantar “Sem
Fantasia” com minha mãe – eu, Chico, ela, Bethânia –, compartilhando vinhos e
intimidades; levar Sofia ao Maracanã pela primeira vez e ver seu botafoguismo
aflorando.
Quero, em dias de ensino fundamental,
sentar ao lado do Rodrigo ‘Mosquito’ no colégio, descobrindo que a diferença de
personalidades não é impedimento para aproximação e amizade; viver novamente ao
menos uma das várias despedidas da minha turma da oitava série, despedindo-me
de Bangu sem saber o que Angra me reservava; encontrar Alexandra, minha Winnie
Cooper - primeiro amor de cartas, saudades e distância - na rodoviária de Campo
Grande e sentir o afeto oriundo de outra vida em seu sorriso.
Quero andar pelo condomínio com o
Rodrigo, alma alvinegra que se foi tão cedo, descobrindo nossas parecenças e
angústias infantis; falar besteira e ‘não fazer nada’ com Maycon, Nelsinho,
André em dias que pareciam tão mais longos; beber meu primeiro uísque com
Gláucio e me sentir andando nas nuvens.
Quero tocar “Meu amigo Pedro” no
aniversário do Pedro Henrique, dar sorte em decisões do Vasco contra times de
camisa azul ao lado dele e de seu pai; estar com o Rodrigo no lançamento do Bloco do Eu Sozinho num Canecão pela
metade; conhecer o Hugo através do gosto compartilhado por Doors e Smiths e,
bem mais tarde, tentar aprender a virar adulto vivendo fases parecidas;
apresentar Sérgio Sampaio ao Marcel e poder viver ao menos um dos dias da fase
louca que será sempre recordada; estar no show do R.E.M. no Rock in Rio com
Virgílio, grande botafoguense; discutir a diferença entre tristeza e melancolia
com Cecel, quando ambos ainda tínhamos cabelo; virar a noite com Schrit rindo
de vídeos engraçados; estar com o Cadu no show do Nervoso, discutindo
pré-requisitos jovemguardistas para melhor aproveitamento do espetáculo; ouvir
o Roma executar o hit “Celulite” em um violino imaginário; ir para a festa do
peão com o Matheus sem saber onde ficar; fugir com o Rodrigo de algum evento no
colégio de Garatucaia enquanto nos conhecíamos e aprendíamos a lecionar; trocar
confidências com a Carol em um bar no Bracuhy, enquanto percebia ela se
transformar em grande amiga; fazer propagandas insanas com a Mariana num bar ou
enxergar o que só nós víamos num buraco no muro do Aquidabã; estar com a Nina e
a Liana em conversas intermináveis.
Quero sair do cinema em Juiz de
Fora com a Isabella sentindo o mundo só nosso e acreditando pela primeira vez
no “pra sempre”; ler Baudelaire para a Bárbara no meu quarto do alojamento em
um romance de filme; compartilhar com a Camila um vinho de grande simbologia
para meus pais em uma bonita noite em Resende; deixar a segurança do meu mundo
por uma paixão arrebatadora pela Amanda; viver um dia dos namorados perfeito
com a Hortencia, compartilhando o carinho e cumplicidade do meu provável
relacionamento mais maduro.
Quero um dia de garrafas de
vinho, grandes canções e a confirmação de uma conexão que independe de
distância com a Ingrid; encontrar Lívia e Daniel num show do Pato Fu e começar
daí uma bela amizade; quero sair sem rumo com Marcella, minha irmã de loucuras
e depois ouvir as repreensões da Patrícia, mãe de nós dois; estar com a Rosane
na mesa em frente à faculdade ouvindo sua história de amor pela internet que
acabou virando casamento; chegar à noite no alojamento e ficar no corredor conversando com o Ramon por muito tempo sobre o Botafogo; acompanhar as maluquices da Renata; beber com o Leo
em silêncio numa quinta-feira, dia da morte de George Harrison e, depois, já
embriagados, cantar suas canções com um misto de dor e emoção.
Quero chegar na casa do Fábio,
assistir a vários Woody Allens e tirar dali o substrato de nossas reflexões,
queixas e divertimentos; dividir segredos com a Luisa, sair com ela do show do
Moptop bebendo de bar em
bar Botafogo a dentro; ir ao cinema com a Juliana, perder a
primeira sessão, então aproveitar para que os dois primos mais fechados se
aproximassem; ouvir minha madrinha Eugênia falar sobre a vida, discos e livros;
conhecer melhor Acílio, meu padrinho, trabalhando com ele em pesquisas; ir ao
show do Skank com Renato e perceber, orgulhoso, seu crescimento; voltar do
trailer de madrugada com a Giane, minha segunda mãe, ou sentar em frente sua
casa, bebendo cerveja e cantando Roberto Carlos na altura; receber o abraço de
criança do Junior não querendo que eu vá embora; ver o Joaquim nascendo.
Quero chorar bêbado ouvindo
Fagner no meu aniversário, sentindo-me só rodeado de pessoas queridas; assistir
ao final da terceira temporada de Lost sem saber o que me esperava; travar
conhecimento da obra de Saramago via Levantado
do Chão enquanto minha namorada de então fazia uma prova de concurso; sentir
minha alma em fogo ao terminar o último parágrafo de Cem anos de solidão; ouvir o John Lennon cantando alguma coisa, qualquer coisa; descobrir o Radiohead falar por mim, mesmo
quando não há palavras.
Quero assistir a uma aula de
Literatura Portuguesa da Mônica Figueiredo; emocionar uma turma com o que me
emociona; comprar o jornal sexta para ler uma coluna do Dapieve; conhecer
Riobaldo e me embrenhar irreversivelmente no sertão roseano.
Quero um texto sentimental, sem a
mínima ambição literária, me fazendo reviver por segundos em flashes
ininterruptos grandes momentos da minha vida.
Quero o mundo e quero agora.
Quero poder sentir todas estas
sensações de uma só vez nos meus últimos sete segundos de vida. E ao chegar ao
outro lado, caso outro lado exista, quero ser recebido pela Jade; conhecer meu
avô Valter; abraçar minha avó Maria e conversar longamente com seu Joaquim;
assistir a futebol com Otávio; beber cerveja com tio Rui e tia Terezinha;
conhecer melhor tia Nice e, se me for permitido, secar uma garrafa de uísque
num bar celestial discutindo amenidades e a eternidade com Vinicius de Moraes.
Por Ricardo Pereira