"There's a fear I keep so deep / Knew it name since before I could speak (...) If some night I don't come home / Please don't think I've left you alone"- Keep The Car Running, Arcade Fire

quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Melhores discos de 2015 - Nacionais

Só ao me organizar para listar os melhores discos do ano percebi que talvez, fora os três primeiros dessa lista, eu tenha me dedicado mais aos lançamentos internacionais do que aos brasileiros. Discos muito elogiados pela crítica e que poderiam me interessar, como o da Roberta Sá; o Carbono, do Lenine; o Estratosférica, da Gal ou Estado de Poesia, do Chico César, não foram sequer ouvidos. Outros como o da Tulipa ou o Euforia, do Pélico, não bateram por aqui como lançamentos anteriores dos mesmos artistas. E ainda há os que ouvi apenas uma ou duas vezes, gostei bem e, se houvesse tempo para me dedicar mais um pouco, fatalmente entrariam nessa lista, como o do Boogarins, o De baile solto, do Siba e O Labirinto e o Desmantelo, do Lirinha.


01 Trovões a me atingir, Jair Naves

Jair Naves é, provavelmente, meu compositor preferido de rock n’ roll atualmente no Brasil. Em seu segundo álbum solo, se há um “amansamento” sonoro (positivo, as canções aparecem mais variadas e bem trabalhadas), lírica e emocionalmente é o álbum mais intenso lançado por Jair até agora. Se no claustrofóbico álbum anterior os sentimentos negativos predominavam, aqui há uma possibilidade de luz no fim do túnel, a redenção pelo amor. Romantismo soando bem em português, passando longe de parecer brega ou piegas.



02 Desterro e Carnaval – Rogério Skylab

No terceiro, e melhor, volume de sua trilogia dos carnavais, Skylab, tal qual Brás Cubas, joga seu cadáver e o que sobrou de sua alma no fundo da tradição musical brasileira, com seus maneirismos e impostações, sua temática e suas idiossincrasias. E, mais do que em qualquer outro momento de sua carreira, emociona e pode encantar o ouvinte que se dispõe a ouvir sem procurar rir a qualquer custo. É um álbum que alterna momentos simples com outros reflexivos e filosóficos e, certamente, o que mais ouvi em 2015.



03 Fortaleza, Cidadão Instigado

Seis anos é tempo demais para esperar por um novo lançamento do Cidadão Instigado, melhor e mais importante banda desse país. Uma banda que deveria ser mais ouvida. Em Fortaleza, aparecem mais “tradicionais” do que nunca, com seus ecos regionais e progressivos, a sensacional guitarra de Catatau e seus versos simples e certeiros em canções indignadas, nostálgicas e belíssimas.



04 Meus Lados B, Erasmo Carlos

Erasmo se juntou a uma banda jovem e sensacional para dar novo gás a canções “esquecidas” de sua discografia, músicas com todo potencial a hit (vocês ainda lembram o que é isso?), mas que, por um motivo ou outro, não “chegaram lá”. Bem, azar o das paradas. O show resultou em um CD e DVD antológicos, com um Erasmo em forma e se ele canta que “está dez anos atrasado”, o que dirá de seu parceiro mais recorrente?



05 Por um pouco de veneno, Carlos Careqa

Para muitos, o que vou afirmar agora é uma heresia, mas preciso confessar: gosto mais das versões do Careqa do que das originais do Tom Waits. Sete anos depois do primeiro álbum com versões do cantor norte-americano, o extraordinário À espera de Tom, aparece esse segundo lote de transposições, não apenas para o português, mas para a realidade brasileira do universo errático e por vezes soturno de Waits. Um trabalho genial, de parte a parte.



06 Pedaço Duma Asa, Mariana Aydar

Em outro que merecia ser mais ouvido e com mais atenção, Mariana Aydar enfileira os “sambas tristes” de Nuno Ramos, em um disco de grande delicadeza, que mostra algumas canções já conhecidas pelas gravações do favorito da casa Romulo Fróes e que aqui aparecem com abordagem distinta e igualmente bela.



07 Conversas com Toshiro, Rodrigo Campos

A estreia, São Mateus não é um lugar assim tão longe, continua imbatível. No entanto, Rodrigo Campos mantém o nível do bom Bahia Fantástica. Mas aqui a viagem é pelo Oriente. E em meio a referências cinematográficas, literárias e sexuais com grande carga oriental, a sonoridade é brasileiríssima, do que de melhor produzimos aqui atualmente e que, infelizmente, não alcança o  “grande público”.



08 A mulher do fim do mundo, Elza Soares

Impossível ficar impassível a esse retorno de Elza Soares às composições inéditas. Elza se cercou da geração paulista dominante na MPB recente (Romulo Fróes, Rodrigo Campos, Clima, Nuno Ramos, Kiko Dinucci etc) e apresenta um disco forte, contundente, com momentos arrepiantes.



09 Uma temporada fora de mim, Hélio Flanders

Em sua estreia solo, o vocalista do Vanguart se entrega ao Romantismo de uma forma tão profunda que, ao contrário por exemplo do que acontece com o Jair Naves, flerta sim com certo sentimentalismo excessivo, resvalando em certa “cafonice”. Mas não importa, é um risco que todo romântico precisa correr. Em meio às baladas e citações de tango (!) do álbum, ouvimos o que poderia ser a definição desse conjunto de canções: “eu não vim nessa terra pra não morrer de amor”. 



10 Frou Frou, Bárbara Eugênia

Se podemos encontrar resquícios bregas na lírica de Hélio Flanders, em Bárbara Eugênia encontramos na sonoridade. E, mais uma vez, a cantora acerta em um disquinho delicioso tal qual seu antecessor, É o que temos. Ela tem o dom de casar dramaticidade e sensualidade de forma tão leve e natural, que aos poucos sentimo-nos íntimos das canções.



11 Derivacivilização, Ian Ramil

Filho direto do estupendo Antes que tu conte outra, disco mais recente da Apanhador Só, Derivacivilização apresenta arranjos e sonoridade por vezes inusitados em um discurso forte, intenso, denso e tumultuado. Após o estranhamento inicial, vale a insistência.



12 Ventre, Ventre

Estreia da banda carioca, surpreende por soar urgente e às vezes agressivo, mas muito bem produzido e com composições cheias de pequenos detalhes que fazem a diferença e ótimas soluções. Lembra por vezes o Radiohead pré Kid A, e não há nenhum demérito nisso. Tivesse eu menos dez anos, perigava tornar-se minha banda preferida.

Por Ricardo Pereira

quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

Melhores discos de 2015 - Internacionais

A cada ano que passa, fica mais difícil elaborar a lista dos melhores discos. A facilidade de acesso aos lançamentos faz com que não tenhamos tempo de ouvir todos com a atenção que dedicávamos há alguns anos. Ouvi uma infinidade de bons discos lançados no ano e muitos pediam mais audições e poderiam estar nessa lista. Destaco esses quinze, álbuns que mereceram audições seguidas e que mais me marcaram durante os últimos meses. Recomendo que procurem os que ainda não conheçam e sugiram, por favor, preferidos de vocês que não estejam na minha lista!




01  The Epic, Kamasi Washington

Um álbum triplo de jazz em que nada é desperdiçado. Desde o título à duração, tudo parece apontar para um excesso de pretensão, um hermetismo pedante. Mas não é o que acontece. O projeto é obviamente ambicioso, mas extremamente bem sucedido ao passear pelas diversas correntes do jazz de forma consistente, com uma atmosfera de encantamento que pode seduzir até quem não está acostumado com o estilo.





02 Grey Tickles, Black Pressure – John Grant

John Grant é o maior compositor pop da atualidade. Grey Tickles, Black Pressure confirma tal sentença, ao manter a qualidade dos álbuns anteriores, ampliando seu espectro musical. Há as baladas lindíssimas e canções mais convencionais, mas também outras de caráter mais experimental, como o David Bowie de Diamond Dogs adaptado ao nosso tempo. E, claro, as letras acima da média, ora tratando de dor e sofrimento, ora divertindo com ironia e cinismo.



03 Star Wars – Wilco

Mais comentado pelas estratégias de marketing (lançamento surpresa, capa com gatinho, chamar-se Star Wars no ano de retorno da franquia cinematogrática), o nono álbum de estúdio do Wilco mostra uma banda em forma, despejando rocks  mais vigorosos do que os de álbuns recentes, em enxutos 35 minutos. Aqui a experiência passa longe de acomodação, o Wilco parece ter alcançado a formação ideal que transparece enorme contentamento em fazer boa música juntos.





04 What a Terrible World, What a Beautiful World – The Decemberists

Após ter alcançado o maior sucesso comercial da carreira com o anterior The King is Dead, o Decemberists repete a fórmula, aprimorando-a. Apostando novamente em uma sonoridade tradicional, canções radiantes como ‘Calvary Captain’, ‘Philomena’ e ‘Easy Come, Easy Go’ misturam-se a momentos reflexivos como ‘Lake Song’ ou ‘Mistral’ em um disco coeso, para se ouvir do começo ao fim.





05 Carrie & Lowell – Sufjan Stevens

O disco mais triste – e belo – do ano. Sufjan Stevens, partindo de um trauma pessoal, constrói canções delicadas e minimalistas, sussurrando letras tão fortes e confessionais de forma que é como se um amigo desabafasse ao seu lado. E o efeito é arrebatador. As canções possuem um caráter hipnótico de tal forma que, mesmo com toda a dor envolvida, voltamos a elas encantados.





06 For Use and Delight – Promised Land Sound

Meu disco “dos anos 70” lançado em 2015 preferido do ano. Country rock de primeira, com belas guitarras e grandes canções, saudando Dylan, Byrds, Grateful Dead, sem abrir mão de personalidade própria.





07 Shadows in the Night – Bob Dylan

Quando li que Dylan iria lançar um disco com canções imortalizadas por Sinatra, temi pelo pior. No entanto, mais uma vez, nosso amigo nos surpreende e mostra que, quando quer, ainda canta “de verdade”. As canções foram “despidas”, revelando interpretações comoventes.





08 Goon – Tobias Jesso Jr.

De todos os álbuns listados, o mais fácil de agradar o ouvinte “de primeira”. São baladas simples e sinceras, com aquela capacidade de atingir uma espécie de inconsciente emocional que a gente têm e se manifesta quando ouvimos uma canção do Paul McCartney ou do Elton John dos anos 70.





09 Hollow Meadows – Richard Hawley

Hawley é um dos caras mais bacanas da música pop recente. Parece viver em um espaço muito próprio, independente de quais tendências musicais ou comportamentais o mundo parece preferir no momento. Ainda bem. Aqui, ele volta a fazer o que sabe de melhor, canções lindíssimas e sensíveis, sem abrir mão da pose de “durão”.





10 Divers – Joanna Newsom

Outra que parecer habitar um universo paralelo, Joanna Newsom apresenta novo conjunto de canções que exigem tempo e atenção do ouvinte. A voz não é convencional, as letras abusam de termos inusitados e muitas parecem mesmo não fazer sentido e as músicas atingem uma delicadeza tão intensa que podem fazer o ouvinte se apaixonar, como meu caso, ou detestá-las, como muitos conhecidos.





11 Sometimes I Sit and Think, Sometimes I Just Sit – Courtney Barnett

Álbum simples e direto, tanto na sonoridade, alternando folk com guitarras pesadas, quanto nas letras bem construídas a partir de eventos cotidianos, numa espécie de descritivismo de uma mente hiperconsciente.





12  If I've Only One Time Askin' – Daniel Romano

Ainda que sem o mesmo aproveitamento do extraordinário álbum anterior, Come Cry With Me, de produção mais simples e eficaz, Romano emociona em seus números de baladas e country tradicional. 





13 I Love You, Honeybear – Father John Misty

Ainda prefiro Fear Fun, sua estreia solo, mas Father John Misty mostra que pode estar começando a construir uma carreira consistente. Suas boas letras sobre relacionamentos e as ótimas soluções para os arranjos constroem um dos discos de destaque desse 2015.





14 The Magic Whip – Blur

Certa melancolia e lentidão em parte das canções faz parecer uma continuação do bom disco solo do Damon Albarn. Mas faixas como “I Broadcast” e “Lonesome Street” não deixam dúvidas, é o bom e velho Blur de volta!





15 Currents – Tame Impala

Currents é uma virada arriscada e inesperada na carreira do Tame Impala. Deixando de lado as guitarras e a psicodelia rock n’ roll que os caracterizavam, a banda investe em sintetizadores e em uma sonoridade calcada em elementos eletrônicos. Para mim, funcionou. É bom ver que Kevin Parker não se acomoda facilmente e a produção é impressionante. Aguardemos os próximos passos.


Por Ricardo Pereira