... preferia não falar. A folha em branco pulsa, instigando e repelindo-me em suas possibilidades infinitas. Como a mulher bêbada e insistente no fim da noite, que seduz e te atrai, te aborrece e afasta, a página em branco é um bilhete de loteria com os cinco números que vão sair no sorteio seguinte.
Minha vida hoje é como a página em branco. Ou melhor, é como uma página cheia de rasuras, emporcalhada de corretivo e que eu preciso continuar escrevendo por cima, antes mesmo de secar. Nunca tive grandes sonhos, nunca quis carro, casa própria, dinheiro nunca foi prioridade por aqui. Se um dia tive um sonho foi viver um grande amor. E não qualquer amor, meu sonho era ter apenas uma mulher para a vida inteira, dedicar a vida a esse amor, compartilhando e fazendo disso a razão do meu viver. Mas ora não se ria, caro leitor, não é de perfeição ou conto de fadas que falo. Sempre pensei em alguém com quem viver os momentos bonitos e que tornasse mais aceitáveis os mais difíceis. Aquele tipo de relacionamento que a gente vê um ou dois durante a vida inteira.
Recentemente li a biografia do Roberto Carlos e fiquei bastante mexido com o capítulo sobre o amor de Roberto e Maria Rita: era aquilo. O encanto, o quanto um dedicava a vida ao outro, senti um pouco daquele amor enquanto lia e um pouco do sofrimento do traumático fim dos dois, por conta da doença e morte dela.
Fiquei pensando no quanto passei parte da vida procurando um relacionamento desses e também no quanto essa procura pode ter arruinado os bons relacionamentos que vivi... A seriedade, a idealização, as expectativas que coloquei em cada uma delas, pode ter apressado o fim.
Hoje não penso tanto nisso, porque é cada vez mais difícil acreditar no modelo de Amor que criei e alimentei em mim. É aquele esquema: “quero respeito e sempre ter alguém que me entenda e sempre fique a meu lado. Mas não, não quero estar apaixonado”. No entanto, é possível, citando o mesmo disco, que não seja desejo, nem saudade, sinceramente, nem seja verdade...
É. A Tempestade tem batido forte por aqui recentemente. Disco que ficou obscurecido pela morte do Renato Russo, está longe de ser dos melhores da banda, mas possui canções muito fortes, que podem espelhar nossos sentimentos em momentos complicados da vida. E desde que comprei a caixinha da Legião e passei a reouvir os discos, certamente foi o que mais tocou aqui.
Às vezes sinto-me como em um lugar amplo, sem qualquer resquício de vento e, em meio a esse descampado, os bons momentos que vivi surgem em flashes como um final de episódio de ‘Anos Incríveis’. Mesmo sendo boas as lembranças, esses fragmentos hoje me fazem mais mal do que bem, mostram o quanto envelheci de maneira diferente do que imaginava, o potencial destruidor do tempo, o quanto cada escolha certa e errada vem, de uma forma ou de outra, cobrar sua dívida.
Prometo voltar ao ritmo normal de postagens, falar de bons discos, filmes, livros, ao invés de despejar esse tipo de coisa em vocês. Eu avisei...
Preferia não falar
falando sério.
I'm not here / This isn't happening |
Por Ricardo Pereira
"(...)Mas ora não se ria, caro leitor".
ResponderExcluirEu nunca vou rir de você, cara. Quer dizer: só nas horas de falação de merda... E hoje até que nós falamos, né?
Abraços.
Latino Ricardio Omnia Vincit.
Hugo
Quero sua volta triunfal logo, sem demora!
ResponderExcluira tempestade também tem batido forte por aqui e tb já quis ter um "amor bonito", mas desencanei desse "sonho fofinho"..não fico atrás de nada e como não consigo estar em um relacionamento sem aquela paixãozinha inicial, aquelas borboletas no estômago, fico sozinha dedicando o tempo que seria de apenas um, para muitos que são meus amigos.
ResponderExcluirbeijos