"There's a fear I keep so deep / Knew it name since before I could speak (...) If some night I don't come home / Please don't think I've left you alone"- Keep The Car Running, Arcade Fire

terça-feira, 17 de julho de 2012

Treefingers


Não sei se sempre fui assim ou quando me tornei. Hoje, no espelho pela metade, enxergo uma pessoa estreita, sentindo-se velho cedo demais, esperando o tempo passar. Triste, não. Certa vez, uma amiga, ao perder a mãe, afirmou que a mesma nunca fora feliz. Ninguém pode dizer isso de mim.

A metáfora do Michael Jackson é uma boa. Uma bolha. Sim. Há alguns anos, um destes toscos programas sensacionalistas comentava sobre uma bolha que o cantor possuía em casa para que pudesse ficar sem ser contaminado. Nem sei se verdade ou não. Mas a imagem ficou e é numa bolha que me sinto às vezes. Fechado, cercado de livros, discos, filmes, enchendo-me de cultura para me esvaziar de vida. Há quem pergunte sobre claustrofobia, digo que até a pouco ar fui me acostumando a respirar.

Alguns poucos amigos e familiares lidam bem com isso, ora habitando a bolha, ora tirando-me para respirar novos ares. Nela, estou a salvo de grandes tormentos, sofrimentos demais, fico apenas com os inevitáveis. – E, agora, escrevendo isso, pergunto-me: terá sido a bolha uma criação de Ricardo Reis enquanto pessoa?

Gostaria que o tempo passasse diferente aqui dentro. Mas, não. É preciso trabalhar e não posso perder a hora do mundo. Será que o menino parado horas por dia com uma fita virgem no pause esperando que o rádio tocasse alguma música de que gostasse para gravar já habitava a bolha sem saber? Ou apenas, como Penélope/Jacob dos tempos modernos, tecia invisível sua morada permanente de adulto?

Quando alguém cheio de vida, com olhos ávidos pelo mundo, consegue romper tantas barreiras e, por essas ironias tão comuns, acaba envolvendo-se é que esta condição transforma-se em frustração. Triste imagem é uma criatura com asas a se debater em um limite invisível, cerceada pela ousadia de tentar amar um alguém com pés de chumbo e horizontes tão estreitos.

A vida se repete e, com ela, as mesmas canções a ricochetear nas paredes intangíveis da bolha. Mitchell, Gibbons, Marshall – as damas, primeiro –, Young, Yorke, Billy, Tweedy, Dylan e John. Parecem confortáveis aqui dentro, mas são apenas vozes, não apenas vozes – parte do meu coração a reinventar sentimentos e vida das mesmas palavras repetidas. 

                        I got a message I can't read
 Por Ricardo Pereira

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