Durante minha infância e parte da
minha adolescência, minha série favorita era Anos Incríveis (Wonder Years), as angústias e alegrias de Kevin Arnold
somadas ao tom nostálgico dos episódios proporcionavam grande identificação. Mais
recentemente, Lost fez minha cabeça,
os mistérios sucessivos e, principalmente, a quantidade de bons personagens
construídos me deixavam alucinado a cada fim de temporada. Sou dos que achou o
final satisfatório, mas, quase dois anos após o fim, penso que, se a série
tivesse terminado ao fim da terceira temporada, seria perfeita. Sim, continuei
envolvido nos três anos seguintes, e o melhor episódio da série para mim, “The Constant”,
faz parte da quarta temporada, porém penso que nada do que veio depois se
iguala ao que foi contado na primeira metade do seriado. Ainda assim, pensava
ser Lost o que de melhor havia sido
criado especialmente para a televisão... Até assistir a Sopranos.
Passei os últimos três meses
acompanhando o desenrolar da trama envolvendo a família Soprano e saio desta
jornada com a certeza de ter sido a melhor série a que já assisti e,
provavelmente, a melhor já realizada. Primeiro motivo, o fato de, em seus 86
episódios, a série manter os 100% de aproveitamento, não há um episódio ruim,
que esteja ali “pra cumprir tabela”. É interessante como todos os personagens e
sub tramas inseridas têm importância ou consequências dentro da narrativa.
A segunda razão é o excelente
personagem que é Anthony Soprano. Interpretado magistralmente por James
Gandolfini, Tony Soprano é um personagem complexo e extremamente humano, real. Esse
realismo e humanidade, aliás, é o que diferencia Sopranos de clássicos sobre a máfia como, por exemplo, O Poderoso Chefão, homenageado do começo
ao fim do seriado. Aqui não há o glamour dos Corleone, nem a violência
estilizada ou a idealização da criminalidade. Soprano é um homem que, chefiando
uma importante família da máfia americana, tem que lidar com questões como sua
depressão, o isolamento proporcionado pelo poder, a pressão decorrente do cargo
e conflitos normais de uma família qualquer de classe média alta.
E aí está a grande questão: mais
do que sobre a máfia, Sopranos é uma
série sobre família. Pouco a pouco o espectador se vê inserido no núcleo dos
Soprano, no relacionamento conflituoso de Tony com a mãe, na inveja de seu tio
ressentido, na preocupação com os filhos, com as loucuras da irmã e na relação
com a esposa, Carmela, ‘dividida’ sempre com casos esporádicos. E, nessa, é impossível
não se afeiçoar ao protagonista, mesmo que às vezes não concordemos com ele.
O elenco da série também é fantástico.
Steve Van Zandt, Tony Sirico, Vincent Curatola, Lorraine Bracco, Steve Buscemi
e Steve
Schirripa, entre outros, dão vida a personagens inesquecíveis, de
modo que ficamos acostumados aos maneirismos e jeitos de falar de grande parte
deles. A trilha sonora é outro ponto forte de Sopranos, desde as canções preferidas de Tony, fã de rock n’ roll, às
músicas que encerram tradicionalmente os episódios.
Quanto ao controverso final,
gostei bem. É coerente com o desenvolvimento de todo o seriado que termine do
jeito que terminou e é, de certa forma, um alívio que os espectadores possam
decidir algumas importantes questões.
Sopranos deve ser assistida por todos que se interessam pela
cultura popular recente, e, quem vai pensando encontrar apenas histórias sobre
a máfia, vai se deparar, na verdade, com uma narrativa sobre como lidar com as
loucuras de se viver nesses estranhos primeiros anos de século. Imperdível.
"You've seen your birth, your life & death; you might recall all of the rest... |
Por Ricardo Pereira