Quem tem de 30 anos para cima
deve se lembrar: ao final de cada episódio do desenho animado Scooby –Doo, onde uma turma de
adolescentes e um simpático cachorro esfomeado desvendavam mistérios
aparentemente sobrenaturais, chegava-se à conclusão do enigma com alguma
revelação bombástica quanto ao real vilão da história. “Eu teria conseguido
manter a farsa se não fossem esses garotos bisbilhoteiros e esse vira-latas
pulguento!”, era geralmente a fala do bandido, ao ser desmascarado e também
preso pela polícia.
Na semana passada, quando assisti
ao filme Rua Cloverfield, 10 (2016),
do diretor Dan Tratchtenberg, tive a impressão que ia rolar um revival do ‘final à Scooby-Doo’, mas não foi isso que aconteceu. Quer dizer, até foi. Mas
às avessas, de uma forma genial e acachapante.
O longa apresenta ligação, mesmo
que indireta, com Cloverfield – Monstro
(2008). Os atores e o diretor são outros, mantendo-se apenas o produtor J.J.
Abrams, o cara que ‘apenas’ revolucionou a ficção científica e as séries
televisivas com Lost. Minto. Outras
coisas foram mantidas no filme lançado neste ano. Um monstro que não sabemos o
nome. Ou melhor, monstros.
O que oferece mais medo: a
realidade ou a fantasia? Você teme mais as sombras que aparecem quando as luzes
do quarto são apagadas ou o maluco que disse ter atirado numa delas, matando-a?
A ideia do fim do mundo é mais assustadora do que a realidade em que vivemos?
São sobre essas questões que o longa vai brincando com o espectador durante
1h40. Brincadeira não é a palavra certa para descrever... A não ser que
estejamos falando de uma novíssima modalidade, ‘estátua suada na cadeira da
sala de cinema’.
Muitas emoções com um elenco tão reduzido
quanto entrosado. Michelle – Mary Elizabeth Winstead – é uma mulher que, após
brigar com o marido, resolve sair de casa. Para onde ela vai não sabemos, mas
fica claro que a personagem não conseguirá chegar.
Um acidente entre o veículo de
Michelle e outro carro faz com que a moça perca os sentidos. Ela acorda num
quarto diminuto, sem janelas, acorrentada. Pouco depois de recobrar os
sentidos, Howard – numa interpretação magistral de John Goodman –, que parece
ser o proprietário do local, aparece para dar boas-vindas. Em pouco tempo,
Michelle fica sabendo que está numa espécie de bunker, e que lá em cima, algo estranho aconteceu. Alienígenas?
Ataque terrorista? Catástrofe natural? Ninguém sabe, nem ela, nem Howard e nem
Emmett – John Gallagher Jr. –, o terceiro elemento preso/protegido no abrigo.
A vontade de descobrir o que
aconteceu com o mundo e o que está se passando com as pessoas reunidas quase
que por acaso leva o filme e o espectador às profundezas de um suspense de
respeito, que oferece um final surpreendente e, com algumas ressalvas,
brilhante.
Rua Cloverfield, 10 subverte o ‘final à Scooby-Doo’. Nele, o monstro real pode usar a máscara do bandido
ou, até mesmo, vestir duas fantasias distintas. Mas disso, nós, brasileiros,
estamos cansados de saber... Principalmente em relação ao nosso cenário
político de hoje e sempre. O que teimamos em desconhecer é a capacidade de
fazer um filme pipoca inteligente e tão aberto a interpretações. Que este sirva
de alento. E exemplo.
Por Hugo Oliveira