"There's a fear I keep so deep / Knew it name since before I could speak (...) If some night I don't come home / Please don't think I've left you alone"- Keep The Car Running, Arcade Fire

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Something else by The... Kinks(?!)



Vez ou outra sou vítima de um sonho delicioso enquanto dura e frustrante quando desperto. Sinto-me em uma loja de discos e encontro algum álbum inédito de uma das bandas de que mais gosto, um bootleg desconhecido com versões alternativas de canções conhecidas e outras inéditas. Já tive sonhos tão reais sobre isso na adolescência que chegava a despertar e procurar pelo disco sonhado na minha coleção até me tocar de que não era real. Posso, inclusive, recordar capas sonhadas de discos imaginários do Radiohead e do Doors.

Pois este ano o sonho, de certa forma, tornou-se realidade quando resolvi me aprofundar no universo da banda inglesa The Kinks. Ao ouvir pela primeira vez o Something Else by The Kinks, tive a sensação de estar em contato com um disco inédito dos Beatles gravado ali logo após o Rubber Soul. Toda aquela inventividade, belas melodias e excelentes letras só poderiam ser obra dos Fab Four - é ou não é o Paul McCartney cantando "Afternoon Tea"? A verdade é que encontrei em Ray Davies um compositor da linhagem da melhor tradição do rock inglês, capaz de compor canções tão impactantes quanto as de Lennon, McCartney ou Pete Townshend. 

Nunca havia me interessado em conhecer mais do Kinks. Conhecia apenas "All day and all of the night" e "You really got me" e, apesar de serem boas músicas, não me instigavam a querer mais. Imaginava o Kinks como banda de bons riffs, rockinhos divertidos e nada mais. Por isso, ao me deparar com as maravilhas contidas em Something Else by The Kinks, fiquei tão impressionado. O álbum, lançado em 67, viaja na contramão dos rivais Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band, Are you experienced?, Forever Changes ou The Doors. Para os irmãos Davies não havia o deslumbramento lisérgico, o desejo de ser vanguarda ou "atravessar para o outro lado". Ao contrário, cantam a nostalgia, a manutenção de uma certa tradição inglesa, o desejo da paz de um campo gramado ou mesmo da solidão. E são, ao mesmo tempo, dotados da típica ironia que associamos ao melhor humor inglês. 

O disco todo é bom. Ray Davies é excelente letrista, compunha crônicas da vida proletária inglesa com talento admirável, como em "David Watts", "Two Sisters" ou "End of the season". De cara, encantei-me por duas canções, a chapada "Lazy Old Sun" e a belíssima "Waterloo Sunset", que fecha essa pequena obra de arte do rock inglês.

Encantado com o disco, fui ao próximo, The Village Green Preservation Society, de 68, e encontrei um trabalho ainda melhor, mais coeso e bem resolvido. Os temas trabalhados no álbum anterior aparecem aqui de forma ainda mais brilhante, como a elegia aos encantamentos da infância na faixa-título; a amarga reflexão sobre os amigos de infância que se distanciam em "Do you remember Walter"; as críticas (cada vez mais atuais) sobre os que se preocupam mais em registrar os momentos do que vivê-los contidas em "Picture Book" e "People take pictures of each other"; e a divertida "All of My Friends Were There", que parece saída de um filme do Monty Python, sobre o medo do palco. Há ainda as nostálgicas "Last of the Steam-powered Trains", "Sitting by the Riverside" e "Village Green", bons rocks como "Johnny Thunder" e "Starstruck", e a esquisitamente graciosa "Phenomenal Cat". Uma obra-prima.

No momento, venho conhecendo o temático Arthur (Or the Decline and Fall of the British Empire) e o algo country Muswell Hillbillies. Dois outros bons álbuns que volto a falar quando estiver mais íntimo. Por enquanto, sigo sonhando acordado com discos tão maravilhosos quanto subestimados desta grande banda.

God Save The Kinks!
Por Ricardo Pereira

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Rick, o lutador

Estou completamente voltado às questões profissionais. A vida vai dando um giro monstruoso por aqui, e a possibilidade de usufruir do chamado ócio criativo é quase nula.

Escutar música? Raramente, tirando algumas audições de discos específicos, a caminho do trabalho - "Jessico", da banda argentina Babasonicos, e "Young Americans", de David Bowie.

Filmes? Consegui assistir ao "O Hobbit", e gostei bem. Mas ficou por isso mesmo.

Livros? Parado em dois volumes - "2666", de Roberto Bolaño, e "Os Últimos Soldados da Guerra Fria", de Fernando Morais.

Discos, filmes, livros... Coisas que eu adoro, mas que estão em segundo plano.

As amizades? Continuam fundamentais.

Esta postagem é dedicada a um grande amigo. Ricardo Pereira, parceiro de blog e da vida. Ele faz aniversário hoje. Como de costume, não poderia deixar de prestar uma simples homenagem.

Grande mano: este ano foi difícil pra cacete, né? Muita gente, em muitos momentos, não conseguiu enxergar o quanto você lutou contra os seus problemas. Ficar dando sugestões e conselhos, como muitas vezes eu fiz, é fácil. Quero ver é encarar as dificuldades de frente. Acordar, viver e dormir com fantasmas te acompanhando, o tempo inteiro. Lidar com a pressão cruel da vida, que não entende e não espera.

Peço perdão por todos os momentos em que não soube te ajudar. Mais ainda: por não ter enxergado em você, em muitas ocasiões, o grande lutador que realmente foi. E é. Mea maxima culpa.

De qualquer forma, não tem muito jeito, amigo: o sol só volta a brilhar depois de muito sangue, suor e porrada na cara.

Você passou por tudo isso. Está vivo e pronto para ter um ano fodidamente bom pela frente, em todos os sentidos.

Parabéns!



Por Hugo Oliveira

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Não aprendi dizer adeus


No Ao vivo no morro, do Revelação, ao apresentar a canção título de seu último álbum de estúdio, “Aventureiro”, Xande de Pilares discursa: “Muita gente diz que essa música é machista. Não é machista, não! Acho que quando a gente não tá a fim, tem que falar mesmo: ‘não quero mais’. Ser sincero não é vergonha. Ser aventureiro também não é vergonha. Basta ser um aventureiro sincero”.

Com sensatez, seu mantra ainda adverte: “muita calma nessa hora!”. Gostaria mesmo de possuir a calma para levar melhor esse momento. Acostumou-se a ser deixado na maioria das vezes, e nem percebia o quanto era fácil fazer-se de vítima, portar-se como um personagem de uma música do Weezer ou do Sopra. Faz um drama, viu que perdeu e chora, ainda tinha a desculpa perfeita para chafurdar no cancioneiro brega que tanto apreciava.

Nunca imaginara o quanto era mais difícil estar do outro lado. A culpa, o incômodo, a sensação de estar errado fazendo o que julgava certo. Não é tão fácil ser um ‘aventureiro sincero’ quando a outra pessoa é tão gente boa, preenche os requisitos imaginados para ser sua verdadeira paixão. Não conseguia deixar de pensar o quanto é pior magoar do que ser magoado.

Sentia-se impotente perante os desígnios das trilhas do amor. Havia deixado o amor entrar na sua vida, conseguira viver o presente, sem se importar com o passado. Sentia o coração radiante, num daqueles momentos em que o amor parece sem fim. A gente sabe, no auge da paixão, sentimo-nos capazes de tudo, e nada de pensar em despedida...

... no entanto como entender as linhas traçadas pelo compasso do amor? As artimanhas de um destino insensato acabaram o levando a novos tempos. Era preciso realmente muita calma para conseguir enxergar através das grades do coração, deixar acontecer naturalmente e entender que as coisas acontecem do jeito que a vida quer.

Os amigos o bombardeavam com todo tipo de conselho, acusavam-no de medo de amar, pediam que ele baixasse a guarda de seu coração blindado. Que esquecesse de esquecê-la, pois poderia nunca mais encontrar a pura essência da paixão.

Talvez, quem sabe? Mas não adiantava mais ficar se culpando. Se tivesse o poder, faria com que tudo fosse mais fácil, mas, como não era o caso, ajoelhou tem que rezar: era o momento de seguir em frente, vestir o manto de sua sinceridade aventureira e errar como todo mundo, afinal o show tem que continuar e sempre podemos escolher entre a madrugada fria e a luz do alvorecer. 


Por Ricardo Pereira

domingo, 16 de dezembro de 2012

Revisitando Twin Peaks


Apenas dois anos após ter assistido a série completa, retornei a Twin Peaks. Foi uma experiência ainda melhor acompanhá-la já sabendo tudo sobre o enredo, sem nenhuma outra preocupação a não ser aproveitar aquela cidadezinha cativante e seus estranhos personagens. O grande desperdício para quem se dispõe a percorrer todos os episódios é se ater à premissa da série, brilhantemente trabalhada no episódio piloto: descobrir o assassino de Laura Palmer. Ainda que tenha sido este mistério o responsável pela 'febre' Twin Peaks durante sua exibição, o grande mérito do programa é expor as singularidades e recessos ocultos por uma aparente normalidade dos moradores de uma pacata cidade interiorana.

Nosso guia pelos tortuosos caminhos de Twin Peaks, o agente especial Dale Cooper, magistralmente interpretado por Kyle MacLachlan, é uma espécie de espelho do espectador, pois vamos descobrindo e encantando-nos com a cidade a partir de seu olhar, suas descobertas, emoções e curiosos métodos de investigação. Sempre bem vestido e com penteado impecável, Cooper vai, pouco a pouco, identificando-se com a simplicidade e beleza que encontra na pequena região. Ao mesmo tempo, os mistérios e excentricidades encontrados revelam a existência de um lado sombrio por trás de tanta 'tranquilidade'. Black Lodge, White Lodge, pedrinhas pretas e brancas. Alguém falou em Lost?

Já se tornou clichê afirmar o quanto de Twin Peaks há em Lost, Fringe, Arquivo X e diversas outras séries. Não só por emendar mistérios, segredos, instigando o espectador a imaginar o que está por vir, criando o perfil de 'viciados' em série tão comum hoje em dia, mas também por englobar uma multiplicidade de gêneros. Como classificar Twin Peaks? Há humor, suspense, drama, terror, romance, nonsense, muitas vezes todas estas características ao mesmo tempo. Ou seria tudo apenas uma grande propaganda de café, como já chegou a se especular?

Outro destaque do programa é a trilha sonora. Angelo Badalamenti criou a atmosfera perfeita para o clima da série, com música soturna, enigmática, envolvente, muitas vezes dialogando emocionalmente ou realçando o mistério das cenas assistidas. E, provavelmente, é a série com o elenco feminino mais bonito da história. Mädchen Amick, Lara Flynn Boyle, Peggy Lipton, Sherilyn Fenn (Ah, Audrey Horne...), todas lindíssimas.  

É opinião quase unânime que a primeira temporada é superior à segunda. No entanto, assistindo pela segunda vez, notei algo que pouco se comenta. A primeira temporada é muito curta - apenas sete episódios, além do piloto - e, se levarmos em conta o mesmo número de episódios da segunda fase, encontramos oito capítulos tão bons ou melhores do que os de apresentação. O problema é que os produtores foram obrigados a revelar a identidade do assassino de Laura Palmer e, depois disso, os criadores da série, David Lynch e Mark Frost, afastaram-se e o programa perde parte da força. O motivo é que o  bizarro lynchiano  e as características surrealistas presentes até então perdem-se em momentos constrangedores como a "volta à infância" de Nadine ou o ridículo ataque da doninha. 

Apesar desses contratempos, a temporada mantém o interesse simplesmente porque o mundo de Twin Peaks é fascinante demais e mesmo episódios menos interessantes são acompanhados com prazer. Sem contar que David Lynch retorna nos capítulos finais e termina brilhantemente com um episódio final destruidor, absurdo e brutal. E ainda deixa um gancho excelente para uma terceira temporada que nunca veio. Devido à queda de audiência, o seriado foi cancelado, deixando um final instigante e perturbador, e, mais do que isso, aberto aos meandros criativos de cada turista habitante desta cidade sombria e encantadora.


Por Ricardo Pereira

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Não faz assim que eu posso até...

E o sujeito se descobre apaixonado pela mulher e descobre, via Trabalho Sujo, que ela anda cantando Beatles/Lennon por aí... 


Tomorrow never knows / Within You Without You

And your bird can sing

(Just Like) Startin' Over

Aí o negócio começa a ficar sério... Onde assino??

Por Ricardo Pereira

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Estrela Solitária: Ben Kweller no Rio

Quando confirmada a vinda de Ben Kweller ao Brasil, foi grande a expectativa. Conheci seu trabalho em 2004 através do segundo disco, On my way, até hoje meu preferido de sua discografia. Em um clima setentista, alternavam-se bons rocks, folks e belas baladas com letras acima da média. Só depois fui conhecer sua estreia, Sha Sha, outro discaço, com sonoridade mais indie e letras mais descontraídas. A partir daí, fui acompanhando sua carreira disco a disco. Veio o terceiro, Ben Kweller, apostando no power pop, um bom álbum, talvez com a produção limpa demais. O quarto lançamento bateu forte por aqui, o country rock Changing Horses chegou na época em que eu conhecia Gram Parsons e o Flying Burrito Brothers e, por isso, suas dez belas canções foram ouvidas incansavelmente por mim. Este ano, foi o lançado seu mais recente álbum, Go Fly a Kite, um apanhado das diversas fases de sua carreira, contendo desde gemas pop como "Gossip", "Free", baladas belíssimas como "I miss you" e faixas com a sonoridade country do disco anterior como "Full Circle" e "You can count on me".

Houve uma certa baixa na expectativa para o show quando soube que o cantor viria só, sem sua banda. Cheguei a achar que a apresentação seria meio 'frouxa' para quem esperou tanto tempo para vê-lo ao vivo, mas felizmente não foi o que aconteceu. Ben Kweller proporcionou um grande espetáculo apenas com seus violões, ora 'puros', ora com distorção nos números mais agitados, o piano e sua voz. Engraçado que, por ter começado muito cedo sua carreira, o compositor é sempre referido como "menino prodígio" ou outros adjetivos juvenis, quando, na verdade, ainda que não pareça, ele já passou dos trinta. E essa maturidade é claramente percebida no palco, por um músico com total domínio do público e do espetáculo.

A primeira música, "Commerce, TX", até dava a impressão que a banda faria falta, mas, na maior parte do show, Ben conseguiu suprir a falta de acompanhamento de forma admirável, apresentando as canções com energia e interpretações vigorosas. O clima no Imperator era o melhor possível, e até o fato de estar vazio - cerca de 500 pessoas - tornou tudo mais especial. Era como ter um artista que admiramos tocando no quintal de casa. O repertório não deixou a desejar, "Walk on Me" veio fazer valer o show logo de cara e seguiu-se um festival de excelentes refrãos e melodias: "Run", "Fight", "Family Tree", "Jealous Girl", "Sawdust Man". Senti falta de "Hospital Bed" e "In other words" - esta, exclusão imperdoável. Mas em compensação fomos surpreendidos com emocionantes versões de "Gypsy Rose", "On her own", "Falling" e "Believer", uma das baladas mais bonitas de todos os tempos e que eu sinceramente não esperava ouvir no show, além do final arrebatador com "Penny on the Train Track".

Como um show inesquecível não se faz só de música, não posso deixar de comentar que tive o prazer de encontrar amigos de longa data e assisti a todo o show com Pedro e Carol, que estiveram comigo no Morrissey, R.E.M. e com quem venho me divertindo cada vez mais a cada show compartilhado. No mais, histórias engraçadas, boas cervejas, polêmicas sobre a firmeza alheia, Marcel ampliado e bigode. Mais? Espero que no próximo, com a banda completa.


Por Ricardo Pereira

Aos pés da Musa

Não é novidade que Céu é a voz feminina mais importante da música brasileira atual. Já era apaixonado por ela como artista e, ao assistir ao show dela transmitido pela MTV nesse fim-de-semana, encantei-me também por ela como mulher. Além de linda, há tempos não via uma cantora com uma performance tão sensual, que me despertasse tanto desejo - pra ficar em uma palavra que não descambe para o mau gosto. Veja se não tenho razão: Por Ricardo Pereira

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Sonho de transatlântico


E foi lançado o Santo Graal de um dos discos da minha vida! Se liga:

MELLON COLLIE & THE INFINITE SADNESS

DELUXE BOX SET:

-5CD +DVD
-Physical Tracks:  106, Digital Tracks: 92
-Original album remastered for the first time
-64 bonus tracks of previously unreleased material or alternate versions of Mellon Collie era songs
-DVD featuring live show filmed at Brixton Academy, London (1996) & bonus performances from Rockpalast (1996)
-Housed in a 12 x 12 lift-top box with magnetic closure, reimagined cover art and velvet-lined disc holder
-2 books containing personal notes, lyrics,  new collage artwork plus a Decoupage kit for creating your own scenes from the Mellon Collie  universe.



Por Ricardo Pereira

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Para o pé do Fado, mais longe que os deuses

Angra dos Reis, 05 de dezembro de 2012

E aí, como anda a vida?

Senti vontade de escrever uma daquelas nossas cartas intermináveis e aqui estou. A dificuldade maior é que tínhamos uma espécie de fórmula pré-definida em que começavamos as missivas a comentar ou simplesmente rememorar os últimos encontros. E, agora, encontros recentes não há.

Andei pensando bastante em você recentemente por conta de conversas com amigos sobre a passagem do tempo e como cada um lida com isso. Por enquanto, envelhecer não tem sido tão difícil, até gosto mais do Ricardo dos trinta do que daquele dos vinte. Uma ou outra má circunstância se faz perceber, mas nada que me traga aflição... ainda.

Devido a problemas recentes por que passei e que não cabe detalhar aqui, andei pensando sobre as vantagens e desvantagens de estar bem ou mal. John Lennon já 'dizia': "No one I think is in my tree, I mean, it must be high or low." É por aí. Quando não estou bem, costumo ver a maioria das pessoas acima do que sou. Já quando estou melhor, como recentemente, meu ego costuma extrapolar a realidade, trazendo uma auto-suficiência que corteja muitas vezes desnecessariamente a arrogância.

Há que se buscar o equilíbrio. O que nem sempre é fácil, pois as boas fases vêm acompanhadas também de doses maiores de álcool, o que, convenhamos, não ajuda a me posicionar realisticamente quanto ao mundo ao meu redor.

Sigo acreditando em que possa haver relacionamentos bonitos, que valham a pena, ainda que mesmo um olhar menos atento teime em me fazer reconsiderar esta possibilidade. Observo casais e suas fragilidades, fissuras entranhadas de forma tão visível ao olhar externo e aparentemente invisíveis internamente. Ou perceptíveis e fingidamente ignoradas, vai saber...

... o que fica, muitas vezes, é uma imagem - idealizada, reconheço - de que com a gente era diferente, um bloco maciço e seguro de amor e infalibilidade. E, por falar em idealização, ando me curando desse mal, o que talvez, mesmo que tardiamente, torne-me mais suscetível ao encantamento e à realização. A conferir.

Esses dias, conheci uma pessoa e me encantei, senti-me atraído, ainda que daquele deslumbramento inicial e por isso tênue se não desenvolvido. Nada aconteceu, ela está em um relacionamento, sendo que, nesse momento, à distância: encontram-se a treze horas um do outro. Tentei me aproveitar dessa brecha, ainda que sem ser invasivo, pelo fato de ter realmente tido vontade de conhecê-la melhor. Daí que um amigo me criticou, acusando-me veladamente de 'canalhice', que deveria procurar me colocar do outro lado. E, não vou negar, isso não me fez bem, por um momento me vi agindo contra o que sempre acreditei. Embora a curiosidade e vontade digam sim; por ora, abraço, desconfiado de que posso estar errado, o não.

Recentemente, uma pessoa querida afirmou que via em nós, daqui alguns anos, O amor nos tempos do cólera. Achei bonita a imagem, lembrei de quando te dei esse livro, no dia em que comprei o primeiro do Strokes, que... (digressiono...) E, mesmo não acreditando nisso, pelo tanto que deixamos passar, por termos mantido o amor, mas transformado a paixão em amizade, e também pela chegada de sobrinhos (não de meus irmãos ainda, mas como se fossem), andei pensando em como vai ser estranho o dia em que você me der a notícia de que está esperando um filho. A seus amores, já me acostumei; como, certamente, acostumou-se aos meus. Mas nunca havia imaginado você mãe do filho de outro alguém.

Então, me diga, viver é ou não é muito perigoso?

Espero que esteja feliz,

       a noite, enfim, não veio para nos preservar jovens.

E por querer dizer o indizível, garrafas ao mar!

once upon a time
Por Ricardo Pereira

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Sangue nas trilhas


Qual o último álbum brasileiro você ouviu dotado de uma honestidade crua e poderosa? Não as belas dores blasés do rock nacional de barba e camisa listrada ou bandas/cantores em busca de voos nostálgicos ou tentativas de emularem o ‘som do momento’. Um conjunto de canções com a força e a sinceridade - ainda que em outro caminho musical - de um Fagner do final dos 70 ou de um Belchior em Coração Selvagem?

Pois foi o que encontrei em E você se sente numa cela escura, planejando a sua fuga, cavando o chão com as próprias unhas, álbum de estreia de Jair Naves. E o extenso título sintetiza com exatidão o clima do disco: desespero, medo, melancolia, o subterrâneo. Numa relação entre álcool e música, associamos uísque a uma audição de Gram Parsons ou Waylon Jennings; umas cervejas aos Ramones ou Kinks, mas aqui o negócio é outro: as canções queimam como o conhaque mais ordinário que, nas dez doses aqui propostas, leva o consumidor à dúvida entre estar no céu ou no inferno.

A primeira talagada, “Pronto pra morrer (o poder de uma mentira dita mil vezes)”, desce rasgando como convém a uma dose inicial. Guitarras agressivas, um rock urgente, a voz grave de Naves apresenta o primeiro personagem, uma espécie de aberração, “pra quem não existe chance de redenção”, arrastando-se entre traumas, desesperos e desilusões. Uma porrada. A segunda dose parece descer com mais facilidade, uma sonoridade mais ‘convencional’, bom refrão, mas o ouvinte olha em volta com cuidado e percebe que o diálogo é tenso, questões de consciência, limites ultrapassados, uma grande canção.

Antes que peça, a terceira é servida, “no fim da ladeira entre vielas tortuosas”. Com o cérebro meio amortecido, a voz e a sonoridade o enganam: “Tom Waits, é você?”. Não importa, mas é como se fosse. A mais bela canção do álbum arrasta o ouvinte para uma narrativa dolorida, uma cena vívida, quase palpável, um bêbado que desabafa e enxerga a mulher que se quer longe, se quer perto, ali, numa cadeira vazia ao lado. Sente bem a dor ouvida e antes que Waits e Pessoa se confundam, pede mais uma.

E o sujeito dirige-se à sua mãe na bonita canção. Faz com que pense na sua, no medo de perdê-la, de que não seja o filho que ela esperou que fosse, pensa em “Lady Laura” sabe-se lá porque e, no meio de tanta angústia, sorri sem jeito. Agarra-se ao copo e é transportado para os anos oitenta em “Carmem, todos falam por você”, um pós-punk perfeito. Está sentado imóvel, mas imagina-se dançando “como eu ando em campo minado” e como seria a reação dos bêbados ao redor.

“Guilhotinesco” segue a sonoridade da anterior, mas com imagens ainda mais fortes, sombrias, numa lírica diferenciada, como quem foge dos lugares comuns sem fazer esforço. De quem esta voz fala, dele, de mim? Como pode saber? Parece um personagem dostoievskiano se apresentando. E ao pensar na “Vida com V maiúsculo, vida com v minúsculo”, o álcool o leva à inevitável euforia, um contentamento desvairado, como se sua solidão e isolamento o fizessem melhor e mais poderoso do que o resto do mundo. Ao menos naqueles pouco mais de três minutos, “não existe em mim nenhum medo”.

Um “covil de cobras” – a evasão de uma realidade asfixiante através da lembrança de um doce momento vivido há tanto tempo, mas, com os olhos fechando de ebriedade, parece logo ali. Olha no espelho e vê-se envelhecido, péssimo momento para pensar na finitude. E quanto falta?

Já chapado de conhaque, pede um uísque, porque “a meu ver” e sua delicadeza merecem uma dose degustada com calma. Já havia escolhido sua preferida, mas como um bêbado tudo pode, elege a nona dose sua mais saborosa. E, sem pensar, brinca de misturar as letras de m e l a n c o l i a. Absorto em seu jogo mental, desperta no crescente do final da canção, como se toda sua solidão doesse de uma vez ali aos cinco minutos e dois segundos. Em sua idiota atividade lúdica, todas as mulheres que amou misturam-se às letras embaralhadas e tudo ao redor parece perder o sentido.

E como a “sonhar acordado”, abandona-se à bebedeira. O magnetismo da canção embala seu torpor, e a letra o faz lembrar um conto de Rubem Fonseca, um filme italiano, um fragmento de vida passado dentro de uma vida que já não o pertence, uma frase de Cohen, um espelho de Borges, uma coda repetitiva de ruídos que o leva ao fim do copo, da lucidez e do álbum.


Por Ricardo Pereira

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Fascinação


Às mães são reservadas intimidade e uma ligação extraordinária, a começar por dois fatores de grande beleza: a gestação e a lactação. Os pais, normalmente porto seguro, confiança e proteção inesgotáveis, podem sentir-se levemente injustiçados em algum momento por esta supremacia materna. Estes ignoram um importante vínculo de ligação entre pai e filho: o futebol. Poucas coisas no mundo podem ser maiores para um pai do que levar o filho ao estádio para ver jogar seu time do coração.

E com este pensamento, o homem entrou no Engenhão de mãos dadas com seu filho. A primeira vez do rapazinho em um estádio de futebol. Um jogo aparentemente sem importância maior, seu Botafogo contra o lanterna do campeonato. E, desde a entrada, o pai, homem feito, acompanhou todo o espetáculo como se voltasse no tempo, admirando cada detalhe pelos olhos de seu filho.

O pequeno camisa sete, ao chegar à arquibancada, era todo ansiedade. Perscrutava tudo com olhos arregalados e certa seriedade respeitosa. Seu primeiro comentário foi: “pai, o campo parece tão menor do que na televisão!”. E, continuou sua observação, detendo-se na torcida, ouvindo os cantos, a tudo observando com uma atenção e concentração de pequeno adulto.

Os times entram em campo, o jogo começa e o pequeno a observar tudo com os olhos brilhando de excitação. “Pai, pai, olha o Seedorf! É diferente dos jogadores comuns, parece um super-herói!” E não é que o menino estava certo? A postura, o caminhar, uma aura de liderança e grandeza diferenciava o craque holandês dos demais atletas. Taí! O super-herói da camisa 10!

Logo no começo da partida, um ataque do adversário, susto e defesa segura de Jefferson. “É muito bom goleiro, né, pai?” “Muito, filho, o melhor do Brasil” Tal declaração peremptória vinda do pai pareceu ao garoto garantia de segurança eterna, na facilidade que as crianças possuem de lidar com a eternidade.

O jogo prossegue e não demora o primeiro gol. Para alegria e êxtase do estreante em estádio, de seu mais novo herói. Após boa trama do ataque alvinegro, Seedorf! E, na comemoração, de mãos para o alto, aquele negro forte parecia mesmo ter super poderes!

Alguns minutos depois, ao bater um escanteio, Seedorf sente a coxa e precisa ser substituído. Sai de campo chorando. E o pai acha tão cedo ter que explicar ao filho sobre a falibilidade, a humanidade de nossos heróis... Mas o filho, felizmente, nada percebe. “Está muito fácil, filho, ele foi armazenar energia para as próximas partidas!”.

No final da primeira etapa, como num filme da sessão da tarde, a inversão de papéis. Cruzamento de Andrezinho, gol de Dória! E o pai até se surpreende ao comemorar de forma tão efusiva o primeiro gol do jovem zagueiro como profissional. Há tanto tempo não gostava tanto de um zagueiro de seu time (Gottardo? Gonçalves? Sandro provavelmente...) e estava realmente curtindo acompanhar o crescimento de uma promessa vinda das divisões de base. E o garoto sorria discreto, ao ver o pai como menino festejando o jovem defensor.

Mal o segundo tempo começa, Jefferson dá uma bola a Gabriel – outra jovem promessa virando realidade –, o volante segue, segue, passa o meio campo, o braço gordinho de criança aponta: “pai, pai, olha, ele tá sozinho!”, nenhum adversário chega na marcação, o chute de longe: gol! E agora o menino arrisca timidamente uma comemoração um pouco mais expansiva, para deleite do pai.

E, para a festa ficar completa, não poderia faltar gol dele. Bruno Mendes, outro menino, este contratado recentemente e começando sua carreira no Botafogo com pé direito, fazendo gols seguidamente. Ao desferir o belo remate ao gol, deixou o filho perplexo: “Mais um, pai, todo jogo ele faz gol!!”.  Seria encantamento parecido com o que ele próprio sentia na adolescência ao ver os gols frequentes de Túlio Maravilha? Cedo pra dizer, mas uma delícia acompanhar.

Saem os dois do Engenhão, pai e filho com cabeça e coração a mil. O homem sente, em suas mãos, a mãozinha quente do filho, lembra dos primeiros anos de vida do menino, em que toda estrela - no céu, em filmes ou livrinhos - era o Botafogo e sorri orgulhoso. Orgulho proporcionado por uma equipe ainda em formação, que não ganhou ainda um título relevante, mas que em um sábado quente no Rio de Janeiro ganhou o coração de uma criança e, com ele, a eternidade.

 Por Ricardo Pereira

Fortuna



Não tenho nada em meu nome
Somente o fado que faço
Meu coração não tem fome
Mora num pequeno espaço
Vive da vida que passa
De amores que vão e vêm
Nada possuo em meu nome
E nem invejo ninguém

Lamento 
Se não me querias por mim
Não vias
O quanto sou rico assim
Um dia virás me dizer 'não vivi'
Só posso ter pena de ti

Fortuna ganhei tanto quanto perdi,
Não tenho posses, nem peço
De outras paixões já sobrevivi
Sei dos meus erros, confesso

Adeus, não olho pra trás
O tempo tudo consome
Perde-se o ouro, o amor se desfaz
Não tenho nada em meu nome

O tempo tudo consome
Não tenho nada em meu nome

(Márcio Faraco)

Por Ricardo Pereira

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

foi o tempo

"(...) já foi o tempo em que via a convivência como viável, só exigindo deste bem comum, piedosamente, o meu quinhão, já foi o tempo em que consentia num contrato, deixando muitas coisas de fora sem ceder contudo no que me era vital, já foi o tempo em que reconhecia a existência escandalosa de imaginados valores, coluna vertebral de toda 'ordem'; mas não tive sequer o sopro necessário, e, negado o respiro, me foi imposto o sufoco; é esta consciência que me libera, é hoje ela que me empurra, são outras agora minhas preocupações, é hoje outro meu universo de problemas; num mundo estapafúrdio - definitivamente fora de foco - cedo ou tarde tudo acaba se reduzindo a um ponto de vista, e você que vive paparicando as ciências humanas, nem suspeita que paparica uma piada: impossível ordenar o mundo dos valores, ninguém arruma a casa do capeta; me recuso pois a pensar naquilo em que não mais acredito, seja o amor, a amizade, a família, a igreja, a humanidade; me lixo com tudo isso! me apavora ainda a existência, mas não tenho medo de ficar sozinho, foi conscientemente que escolhi o exílio, me bastando hoje o cinismo dos grandes indiferentes."

( Trecho de Um copo de cólera, de Raduan Nassar)

Por Ricardo Pereira

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

A menina das três estrelas



Será possível determinar a origem de nossas paixões? Muitas são causas diretas da criação recebida, outras adquiridas nas tortuosas reentrâncias da existência. E há aquelas, das mais bonitas, que já trazemos tatuadas na alma ao chegarmos a este mundo, só esperando o momento de ter seu brilho reconhecido.

Os desfiles carnavalescos, a paixão por uma escola de samba, podem ser vistos como um enigma para quem não os vivencia. Diferentemente de um clube de futebol, que tem o envolvimento renovado semanalmente, ou de um artista cuja obra pode ser contemplada até diariamente, uma escola de samba tem seu grande momento em um evento anual. Toda a paixão concentrada em um ano descarregada ali durante mágicos oitenta minutos.

Fruto apenas aparente do local de sua criação, a Mocidade Independente de Padre Miguel surgiu desde a infância em sua vida como (a primeira?) paixão arrebatadora. A estrela verde e branca do subúrbio carioca coloria seu coraçãozinho infantil com a intensidade deslumbrante que a beleza de um carnaval pode trazer a quem for capaz de o observar com os olhos puros. E ano a ano foi acostumando, emocionada, a se orgulhar, torcer, chorar, sorrir e às vezes se indignar com a passagem de sua Mocidade pela avenida.

Ia crescendo e adquirindo, gradativamente, maior consciência política. E a mudança para uma cidade menor foi o cenário perfeito para a manifestação de sua segunda estrela. Não mais o verde e branco de esperança e inocência dos primeiros anos, mas o vermelho de sangue e luta de uma adolescente encantada com o ideário do Partido dos Trabalhadores. Com o broche no peito – duas letras, uma estrela – acompanhou passeatas, reuniões, expectativa e ansiedade em apurações intermináveis de eleições que foram, aos poucos, entre alegrias e frustrações, redefinindo seus conceitos e pensamentos em seu processo de formação.

A terceira estrela manifestou-se mais tarde, em uma noite de quinta-feira num Maracanã ainda lambendo as feridas de um título tomado no apito apenas quatro dias antes. Com milhares de corações expostos de um amor exacerbado pela injustiça recente, sentiu-se invadida pelo preto e branco daquela estrela gloriosa, solitária no nome, mas não em seu coração. Pois este pulsa iluminado pelo brilho de três estrelas, que às vezes trouxeram, sim, doses de frustração, afinal cada uma delas depende de homens para continuar sua história e muitos a decepcionaram em diferentes circunstâncias. Mas as três possuem luz própria e irradiante maior do que qualquer infeliz momento transitório. E é esta certeza que ilumina o caminho desta menina, mulher acompanhada sempre por três estrelas quando muitos vivem toda a existência a procurar por uma que possa lhes facilitar a travessia.

Por Ricardo Pereira

terça-feira, 9 de outubro de 2012

Não muito distante

Fringe está sempre fazendo referências a outras séries e filmes. Das minhas favoritas, por exemplo, Twin Peaks e Lost vez ou outra são homenageadas durante o seriado. Ando aproveitando cada minuto dessa última temporada e no último episódio, In Absentia, a cena abaixo, rememorando a clássica descoberta do interior da escotilha, foi golpe baixo pra qualquer fã nostálgico de Lost:


Cheguei a emocionar na hora! E ando agora naquelas de 'fim de livro bom', em que misturam-se a ansiedade pela continuidade e a vontade de que passe devagar para aproveitar os últimos momentos da obra.

Por Ricardo Pereira

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Curso disperso

Nem tão de repente assim, a vida não fazia mais sentido. Tudo lhe parecia indiferente, sentia-se verdadeiramente enfastiado, muito mais do que desnorteado. Alguma doença física? Não, perfeitamente saudável – por enquanto. Possuía uma boa família e amigos que o amavam sinceramente. Não tinha uma companheira porque não queria, ou melhor, conseguia. Ainda que estivesse longe do padrão de beleza reinante, possuía atributos encantadores. Era bom no que fazia, quando ainda tinha energia e força para exercê-lo.


No presente, não via mais utilidade em si na vida. Com a cabeça doendo mais do que o resto do corpo acostumou a sentir dor devido à inoperância a que foi submetido, subiu no primeiro ônibus que passou. Nem bem escolheu seu assento, viu tratar-se de uma ideia infeliz. Uma náusea terrível o acometeu, sentiu mesmo como se fosse vomitar, mal o auto se pôs em marcha. Para dominar a súbita vontade, enfiou o rosto na janela e recebeu o ar com toda a força. Em sua mente, a vontade de que fosse a última rajada de vento de sua existência.

No entanto, não é tão fácil assim livrar-se da vida e mais uma vez pensou no que poderia fazer para torná-la suportável. Já havia passado por sua cabeça diversas vezes a ideia de que talvez um casamento pudesse salvá-lo, mulheres desesperadas por isso é o que não falta no mundo e fingir-se apaixonado, convenhamos, não seria grande problema. Depois era deixar o curso desse rio de águas quase paradas seguir... acomodar-se, “ter carro do ano, TV a cores, pagar imposto, (...), filho na escola, (...), ser responsável, cristão convicto, cidadão modelo”, o ‘sonho da casa própria’... Não! De repente, a náusea voltou ainda mais forte e o vento placebo da janela entra de novo em ação.

Passa então a observar as pessoas nas ruas. Tristes figuras fazendo propaganda política, sem nem saber por que, apenas pelo pouco que lhes foi oferecido; crianças com sombrias perspectivas de futuro uniformizadas nos pontos de ônibus; um marceneiro, um técnico debruçado em uma máquina de lavar, uma senhora vendendo salgados, as pessoas em seus trabalhos cotidianos como a reforçar sua inutilidade prática. Vê uma jovem de corpo bem feito em roupas mínimas e os olhares carregados de desejos dos homens ao redor, pensa em seu melancólico pau inútil e pela primeira vez desde que entrou no ônibus esboça uma espécie de sorriso amargo.

Não quer mais nada. Não quer falar, beber, compartilhar, sair, nem continuar se entupindo de ficção, como vem fazendo há anos numa tentativa de trazer um pouco de sentido a seu vazio. Pensa no final do Dama do lotação, queria poder, tal como o marido traído, morrer para o mundo: deitar na cama, unir os pés, entrelaçar as mãos na altura do peito e ficar.

Lembrou então de um sonho recente e sentindo o vento em seu rosto, de olhos fechados, desejou com toda a força que pudesse tornar-se realidade. Nele, sua sempre frequente olheira ia pouco a pouco aumentando e tomando conta de seu corpo. Ia ficando mais e mais escurecido, mas não com a sensibilidade de pele, mas como placas-crateras que, como num tosco efeito de filme b, ao dominar todo o corpo, ia, de cima para baixo, desfazendo-se, esfarelando-se, destituindo sua forma humana de sentido. Alcançando enfim o alívio de alcançar a igualdade entre o que lhe sobrava em corpo e faltava em espírito.


 Por Ricardo Pereira

domingo, 30 de setembro de 2012

Nem todo sorriso é pra valer


É normal, desmentindo o poetinha, conseguir ser feliz sozinho? Estar plenamente satisfeito tão só? Estar em paz sem ver ninguém, sem ouvir uma voz amiga a ponto de, na hora de dormir, pensar que deveria estar mal por estar bem? Desvirtuar a música que o fazia rir na adolescência, trocando, de certa forma, uma menina quente e macia por filmes, livros e discos de gritaria? Querer estar sóbrio num mundo que praticamente implora que se esteja minimamente inconsciente? 'São tantas perguntas que atropelam minha vontade de raciocinar...

... então, um brinde imaginário ao mestre Aldir, que parece saber mais sobre mim do que eu mesmo:

“as coisas que eu sei de mim
são pivetes da cidade
pedem, insistem e eu
me sinto pouco a vontade.

fechado dentro do taxi,
numa transversal do tempo,
acho que o amor é a ausência
de engarrafamento.

as coisas que eu sei de mim
tentam vencer a distância
e é como se aguardassem,
feridas, numa ambulância.

as pobres coisas que eu sei
podem morrer, mas espero
como se houvesse um sinal
sem sair do amarelo.”

Por Ricardo Pereira

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

O começo do fim

Hoje vai ao ar o primeiro episódio da última temporada de Fringe, a série mais instigante em andamento. Pelos teasers divulgados, retoma o excelente "Letters of Transit", melhor episódio da temporada passada. É grande a ansiedade por aqui. Depois de temer o cancelamento e ter a vida prorrogada em mais uma temporada, é torcer para que o final esteja no nível do que foi o seriado até aqui!



Por Ricardo Pereira

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Zambujo Ao Vivo

Aproveitando a passagem de António Zambujo pelo Brasil para divulgar seu último álbum, Quinto - que em breve ganhará texto meu aqui -, deixo o vídeo de uma extraordinária apresentação recente do cantor português:
Live@365 Presents Antonio Zambujo's Portugese Fado por tvnportal Por Ricardo Pereira

Wilco - "Sunloathe"



Muito doido o novo clipe do Wilco, para Sunloathe, uma das mais bonitas do último álbum, The Whole Love.

Por Ricardo Pereira

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Guitarrinhas inofensivas (e deliciosas)

Complicado escrever para o blog com tanto trabalho para fazer. De qualquer forma, segue uma seleção de vídeos musicais de responsa. Guitarrinhas inofensivas e também deliciosas... A fim de deixar o meio semana mais leve.

 

"Criminal Art Lovers", Northern Portrait - A bandeca em questão adora xerocar tudo o que os Smiths fizeram. Não faz muito sentido reviver aquela sonoridade, mas para quem é fã, como eu, o som desce redondinho...

 

 "Feelin'", The La's - Famoso pelo hit "There She Goes", o The La's lançou apenas um disco... E que disco! Cheio de canções influenciadas pelo rock dos anos 60 e power pop, o disco ajudou a moldar as características sonoras do movimento que viria a ser conhecido como Britpop.

 

 "The World Moves On", Jens Lekman - o cantor e compositor sueco, ainda um tanto desconhecido no Brasil, não lança nada ruim. O novo disco, "I Know What Love Isn't", já disponível na internet, é uma belezura só, com letras e canções que obrigam o ouvinte a colocar o álbum no repeat eterno. A faixa escolhida é a minha preferida... Ao menos, desta semana. Escolha a sua.


 Por Hugo Oliveira

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Realismo convincente

Empolgado pelo belo Gosto de Cereja, ando procurando conhecer mais da filmografia de Abbas Kiarostami. E, assim, cheguei a Cópia Fiel, de 2010, primeiro filme "ocidental" do diretor iraniano. Nele, Elle (Juliette Binoche, lindíssima, em interpretação sublime) assiste a uma palestra do escritor inglês James Miller, que, em seu último livro, discute a originalidade e autoria artística.


E questiona: se uma cópia perfeita de uma obra de arte for capaz de emocionar do mesmo modo que a original, por que aquela deve ser considerada 'menor', menos valorosa do que esta? Não estariam as duas cumprindo a mesma finalidade, atingindo o mesmo efeito?

Os dois personagens encontram-se, saem em um passeio de carro pela cidade italiana onde se passa a história enquanto conversam longamente sobre estes e outros temas. Mais uma vez, o diálogo dentro de um automóvel, com realce nas paisagens, recurso utilizado também em Gosto de Cereja e, pelo visto, característico da obra do diretor.

Ao pararem em um café, são confundidos com marido e esposa e passam a agir como tal, tornando-se, então, cópia fiel de um relacionamento em crise. Acabam de tal forma envolvidos em tal representação, as discussões são tão vivas, sentidas, que acabamos nós, espectadores, com a ligeira dúvida sobre a veracidade ou não do que acompanhamos.

Um brilhante desenvolvimento do tema do livro fictício e do próprio filme, que nos põe a refletir ainda o quanto também, em muitas situações, somos nós ali ou uma representação, cópia fiel de um espelho de origem desconhecida, cacos amalgamados de idealização.

Eu, máximo, único, nenhum.
 Por Ricardo Pereira

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Com a perna no mundo


Assim como Hugo, também gostei de À beira do caminho. É um filme que trata de questões pesadas: perdas, dores, traumas, solidão. E o faz de forma bela, ainda que pouco original. As semelhanças com Central do Brasil, por exemplo, são por demais evidentes.

O diretor, Breno Silveira, o mesmo de 2 Filhos de Francisco, na verdade, evita correr riscos. Mesmo com todo o silêncio e certa lentidão, é um filme eminentemente popular. Sem surpresas ou grandes viradas narrativas, entrega exatamente o que o espectador médio espera. O que não chega a ser problema para quem se deixar levar pela emoção.

O que não é difícil, muito devido às grandes interpretações de João Miguel - baita ator! -, mais uma vez excelente; o menino Vinicius Nascimento, com sua simplicidade e carisma, e Dira Paes, além de talentosa, cada vez mais bonita.

No entanto, mais do que qualquer coisa, o grande fator sentimental do filme são as canções de Roberto e Erasmo Carlos. Assim como as frases de caminhão que pontuam momentos importantes da narrativa refletindo os sentimentos do protagonista João, as histórias cantadas/escritas por Roberto guiam o espectador pelos caminhos emocionais dos personagens, sendo grande trunfo narrativo.

Fosse outra trilha sonora, o filme não falaria tão alto ao coração. Por mais que espumem os detratores, Roberto Carlos é a verdadeira voz do Brasil, a que mais representa a alma, o sangue de um povo heterogêneo, mestiço, misturado em tão grande território. Possível síntese emocional de nossas contradições.

E, no final das contas, À beira do caminho é mais uma prova do poder destas canções.

Essas recordações me matam
Por isso eu venho aqui...
 Por Ricardo Pereira

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Cumplicidade silenciosa


Um homem dirigindo um caminhão. Esta é a primeira cena de “À beira do caminho”, novo filme do diretor Breno Silveira. Ele está sozinho na estrada. Não há diálogos, palavras soltas ao vento ou pensamentos altos. O silêncio só é quebrado pela canção “A distância”, de Roberto Carlos, que começa a tocar dentro da cabine.

Nunca mais você ouviu falar de mim
Mas eu continuei a ter você
Em toda esta saudade que ficou...
Tanto tempo já passou e eu não te esqueci

Nem precisa chegar ao refrão. Temos alguém com um coração partido. Uma história mal resolvida. Pausa na música: um pneu do veículo acaba furando. É necessário fazer uma parada para consertá-lo. Ao visualizar a peça que deve ser trocada, o homem ouve um barulho na carroceria. Lá dentro, um menino que viajava escondido é descoberto. Ele revela que só queria uma carona para São Paulo, na intenção de encontrar o pai que ele não conhece.

Prontinho. O encontro inusitado entre o motorista João – João Miguel – e o menino Duda – Vinicius Nascimento –, “dois fodidos”, é tudo que o espectador precisa para embarcar numa viagem tocante, de pouco mais de 1h30. No trajeto, nada de explosões, tiroteios ou efeitos especiais mirabolantes. Apenas um homem e um garoto numa cabine, espremidos entre a culpa do primeiro e a esperança que o segundo carrega. Em algum momento alguém vai ter que descer.

Não existem grandes mistérios relacionados ao longa. As pistas sobre o que aconteceu e o que está por vir na vida da improvável dupla vão sendo apresentadas de forma simples... Como se o filme pudesse ser resumido numa frase de parachoque de caminhão. “Espere o melhor, prepare-se para o pior, aceite o que vier”. Um lugar comum inescapável. E absolutamente crível.

O que faz “À beira do caminho” entrar diretamente na lista de grandes filmes brasileiros de 2012 é a interpretação dos protagonistas. Despidos de maiores afetações e tons exagerados, os atores criam, cena após cena, uma cumplicidade silenciosa. E emocionante. Cada informação oferecida através da película alimenta nossa relação com os personagens. E chegamos ao final querendo mais, desejando abraçá-los, viajar ao lado deles ouvindo “O portão”, clássico do “Rei” que demarca o término de uma história. E o começo de outra.

Enquanto houver vida, haverá sorrisos e lágrimas, redenção e remorso. Os livros, as experiências, os conselhos, o amadurecimento, a religião, nada, nenhum deles poderá nos proteger.

Porque viver é mesmo desenhar sem borracha.



Por Hugo Oliveira

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Direto

Você acha mesmo que eu vou ousar escrever algo depois do texto lindão que o Ricardo postou? Vai nessa. "Alumbramento" não é apenas mais uma postagem do blog: é a representação máxima do diário virtual. Tudo o que a gente queria dizer, mas de uma talagada só, cowboy.

Sinceramente? Um cara que produz um troço genial e emocionante como esse é capaz de qualquer coisa nesta vida.

Feche a conta e passe a régua. Divirta-se antes que tudo acabe em chamas.








Por Hugo Oliveira

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Alumbramento


Sempre tive a nostalgia como companheira. Desde minha infância, sentindo saudades de uma época que não vivi ao assistir a Anos Incríveis ou ouvindo os discos de meu pai. Agora dei para ter nostalgia das séries a que venho assistindo. Sopranos bateu forte e deixou um vazio, sinto saudades dos personagens, até sonho com eles. Esta semana acabei Six Feet Under e, pelo visto, vai acontecer o mesmo. Acabei, durante o seriado, me apaixonado pela Claire, mas gostaria de alguém como a Maggie para casar, mas isso é outra história...


Quero a cumplicidade do Henrique na época de alojamento, pizza “à moda” em dias de jogo, sua companhia nos shows do Caetano ou do António Zambujo; ouvir o Paul McCartney cantando “The long and winding road” abraçado com meu pai num Engenhão quase onírico; cantar “Sem Fantasia” com minha mãe – eu, Chico, ela, Bethânia –, compartilhando vinhos e intimidades; levar Sofia ao Maracanã pela primeira vez e ver seu botafoguismo aflorando.

Quero, em dias de ensino fundamental, sentar ao lado do Rodrigo ‘Mosquito’ no colégio, descobrindo que a diferença de personalidades não é impedimento para aproximação e amizade; viver novamente ao menos uma das várias despedidas da minha turma da oitava série, despedindo-me de Bangu sem saber o que Angra me reservava; encontrar Alexandra, minha Winnie Cooper - primeiro amor de cartas, saudades e distância - na rodoviária de Campo Grande e sentir o afeto oriundo de outra vida em seu sorriso.

Quero andar pelo condomínio com o Rodrigo, alma alvinegra que se foi tão cedo, descobrindo nossas parecenças e angústias infantis; falar besteira e ‘não fazer nada’ com Maycon, Nelsinho, André em dias que pareciam tão mais longos; beber meu primeiro uísque com Gláucio e me sentir andando nas nuvens.

Quero tocar “Meu amigo Pedro” no aniversário do Pedro Henrique, dar sorte em decisões do Vasco contra times de camisa azul ao lado dele e de seu pai; estar com o Rodrigo no lançamento do Bloco do Eu Sozinho num Canecão pela metade; conhecer o Hugo através do gosto compartilhado por Doors e Smiths e, bem mais tarde, tentar aprender a virar adulto vivendo fases parecidas; apresentar Sérgio Sampaio ao Marcel e poder viver ao menos um dos dias da fase louca que será sempre recordada; estar no show do R.E.M. no Rock in Rio com Virgílio, grande botafoguense; discutir a diferença entre tristeza e melancolia com Cecel, quando ambos ainda tínhamos cabelo; virar a noite com Schrit rindo de vídeos engraçados; estar com o Cadu no show do Nervoso, discutindo pré-requisitos jovemguardistas para melhor aproveitamento do espetáculo; ouvir o Roma executar o hit “Celulite” em um violino imaginário; ir para a festa do peão com o Matheus sem saber onde ficar; fugir com o Rodrigo de algum evento no colégio de Garatucaia enquanto nos conhecíamos e aprendíamos a lecionar; trocar confidências com a Carol em um bar no Bracuhy, enquanto percebia ela se transformar em grande amiga; fazer propagandas insanas com a Mariana num bar ou enxergar o que só nós víamos num buraco no muro do Aquidabã; estar com a Nina e a Liana em conversas intermináveis.

Quero sair do cinema em Juiz de Fora com a Isabella sentindo o mundo só nosso e acreditando pela primeira vez no “pra sempre”; ler Baudelaire para a Bárbara no meu quarto do alojamento em um romance de filme; compartilhar com a Camila um vinho de grande simbologia para meus pais em uma bonita noite em Resende; deixar a segurança do meu mundo por uma paixão arrebatadora pela Amanda; viver um dia dos namorados perfeito com a Hortencia, compartilhando o carinho e cumplicidade do meu provável relacionamento mais maduro.

Quero um dia de garrafas de vinho, grandes canções e a confirmação de uma conexão que independe de distância com a Ingrid; encontrar Lívia e Daniel num show do Pato Fu e começar daí uma bela amizade; quero sair sem rumo com Marcella, minha irmã de loucuras e depois ouvir as repreensões da Patrícia, mãe de nós dois; estar com a Rosane na mesa em frente à faculdade ouvindo sua história de amor pela internet que acabou virando casamento; chegar à noite no alojamento e ficar no corredor conversando com o Ramon por muito tempo sobre o Botafogo; acompanhar as maluquices da Renata; beber com o Leo em silêncio numa quinta-feira, dia da morte de George Harrison e, depois, já embriagados, cantar suas canções com um misto de dor e emoção.

Quero chegar na casa do Fábio, assistir a vários Woody Allens e tirar dali o substrato de nossas reflexões, queixas e divertimentos; dividir segredos com a Luisa, sair com ela do show do Moptop bebendo de bar em bar Botafogo a dentro; ir ao cinema com a Juliana, perder a primeira sessão, então aproveitar para que os dois primos mais fechados se aproximassem; ouvir minha madrinha Eugênia falar sobre a vida, discos e livros; conhecer melhor Acílio, meu padrinho, trabalhando com ele em pesquisas; ir ao show do Skank com Renato e perceber, orgulhoso, seu crescimento; voltar do trailer de madrugada com a Giane, minha segunda mãe, ou sentar em frente sua casa, bebendo cerveja e cantando Roberto Carlos na altura; receber o abraço de criança do Junior não querendo que eu vá embora; ver o Joaquim nascendo.

Quero chorar bêbado ouvindo Fagner no meu aniversário, sentindo-me só rodeado de pessoas queridas; assistir ao final da terceira temporada de Lost sem saber o que me esperava; travar conhecimento da obra de Saramago via Levantado do Chão enquanto minha namorada de então fazia uma prova de concurso; sentir minha alma em fogo ao terminar o último parágrafo de Cem anos de solidão; ouvir o John Lennon cantando alguma coisa, qualquer coisa; descobrir o Radiohead falar por mim, mesmo quando não há palavras.

Quero assistir a uma aula de Literatura Portuguesa da Mônica Figueiredo; emocionar uma turma com o que me emociona; comprar o jornal sexta para ler uma coluna do Dapieve; conhecer Riobaldo e me embrenhar irreversivelmente no sertão roseano.

Quero um texto sentimental, sem a mínima ambição literária, me fazendo reviver por segundos em flashes ininterruptos grandes momentos da minha vida.

Quero o mundo e quero agora.

Quero poder sentir todas estas sensações de uma só vez nos meus últimos sete segundos de vida. E ao chegar ao outro lado, caso outro lado exista, quero ser recebido pela Jade; conhecer meu avô Valter; abraçar minha avó Maria e conversar longamente com seu Joaquim; assistir a futebol com Otávio; beber cerveja com tio Rui e tia Terezinha; conhecer melhor tia Nice e, se me for permitido, secar uma garrafa de uísque num bar celestial discutindo amenidades e a eternidade com Vinicius de Moraes. 


Por Ricardo Pereira

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

A hora da estrela

Hoje estou explodindo de felicidade! Acabei de conhecer Joaquim, filho da Luisa e Cecel, meus amados primos, amigos, irmãos! Poucas vezes senti tanta alegria no meu coração!

Saúde, paz e muita vida é o que desejo para esse menino já tão querido.




               "ele está pronto pra mudar a sua vida pra sempre"

Por Ricardo Pereira

domingo, 12 de agosto de 2012

Twilight on the frozen lake



"espere baby não desespere
não me venha com propostas tão fora de propósito
não acene com planos mirabolantes mas tão distantes
espere baby não desespere
vamos tomar mais um e falar sobre os mistérios
da lua vaga
dylan na vitrola dedo nas teclas
canto invento enquanto o vento marasma
espere baby não desespere
temos um quarto uma eletrola uma cartola
vamos puxar um coelho um baralho
e um castelo de cartas
vamos viver o tempo esquecido do mago merlin
vamos montar o espelho partido da vida como ela é
espere baby não desespere
a lagoa há de secar
e nós não ficaremos mais a ver navios
e nós não ficaremos mais a roer o fio da vida
e nós não ficaremos mais a temer a asa negra do fim
espere baby não desespere
porque nesse dia soprará o vento da ventura
porque nesse dia chegará a roda da fortuna
porque nesse dia se ouvirá o canto do amor
e meu dedo não mais ferirá o silêncio da noite
com estampidos perdidos"

(chacal)

"É, os velhos tempos se foram para sempre e os novos não ficam muito para trás."
Por Ricardo Pereira

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Vem coisa boa por aí - The xx

Já havia cantado a pedra por aqui, mas não custa nada repetir: a banda inglesa The xx é uma das coisas mais legais que apareceram nos últimos tempos, em se tratando desse tal rock indie.

O primeiro disco, lançado em 2009, desce muito bem. Minimalismo cool, climão soturno e instrumental esparso. O resultado final surpreende.

Agora, o grupo está prestes a lançar o sucessor do disco homônimo. As expectativas são altas, e algumas pistas já dão a entender que vem coisa boa por aí. Novamente.

A canção aí de baixo, "Chained", é uma delas.


Por Hugo Oliveira

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Vazio e Momento


Este fim-de-semana, assisti a um filme que não me sai da cabeça: Gosto de Cereja (Ta’m e Guillas, 1997), do diretor iraniano Abbas Kiarostami. Nem sei se me sinto à vontade para recomendá-lo, imagino que muitos achariam chato, cansativo. O que, é claro, não invalida uma obra, como vem defendendo Hermano Vianna.

A trama é de grande simplicidade. Badii, um homem de meia idade, circula de carro em uma desértica Teheran procurando alguém que o ajude em seu intuito: pretende suicidar-se e quer a garantia de ser enterrado pela manhã ou resgatado caso ainda esteja vivo. Nisso se resume o enredo, nem ao menos temos acesso aos motivos que o levam a querer despedir-se da vida. Importa a busca por quem o ajude em seu objetivo.

E, assim, somos levados a acompanhar as reações dos candidatos à tão insólita proposta, caronas temporárias nas angústias do protagonista. Um jovem e assustado soldado; um seminarista cujos princípios religiosos o impedem de compactuar com o plano de Badii; e, por fim, o senhor Bagheri, velho taxidermista turco que, com uma mistura de sapiência e simplicidade, discursa longamente em defesa da vida, a partir de uma tentativa de suicídio que não levou em frente graças ao gosto de amoras, à vivência da natureza. Nesse ponto específico não pude deixar de pensar em Riobaldo.

Apesar da forte carga temática, o filme não resvala em sentimentalismos. Ao contrário, o tempo todo predomina a razão, representada pela aridez da paisagem e pelos olhares e silêncios do protagonista. Inclusive nos momentos primorosos que expressam a angústia da possível morte vindoura, como as vezes em que o homem se pega a observar as aves sobrevoando cadáveres de animais, ou quando, agachado no meio de uma obra, as sombras das pedras desabando simulam magistralmente seu próprio sepultamento.

Há um epílogo desnecessário, com uma cena dos bastidores da filmagem em um clima de leveza antitético ao que fora mostrado até então. Causa certa estranheza, mas não diminui os efeitos de uma obra de grande impacto reflexivo.

Maybe you did. Maybe you walk. / Maybe I drive to get off, baby.
 Por Ricardo Pereira