Este fim-de-semana, assisti a um
filme que não me sai da cabeça: Gosto de
Cereja (Ta’m e Guillas, 1997), do diretor iraniano Abbas Kiarostami. Nem
sei se me sinto à vontade para recomendá-lo, imagino que muitos achariam chato,
cansativo. O que, é claro, não invalida uma obra, como vem defendendo Hermano
Vianna.
A trama é de grande simplicidade.
Badii, um homem de meia idade, circula de carro em uma desértica Teheran
procurando alguém que o ajude em seu intuito: pretende suicidar-se e quer a
garantia de ser enterrado pela manhã ou resgatado caso ainda esteja vivo. Nisso
se resume o enredo, nem ao menos temos acesso aos motivos que o levam a querer
despedir-se da vida. Importa a busca por quem o ajude em seu objetivo.
E, assim, somos levados a
acompanhar as reações dos candidatos à tão insólita proposta, caronas temporárias
nas angústias do protagonista. Um jovem e assustado soldado; um seminarista
cujos princípios religiosos o impedem de compactuar com o plano de Badii; e,
por fim, o senhor Bagheri, velho taxidermista turco que, com uma mistura de
sapiência e simplicidade, discursa longamente em defesa da vida, a partir de
uma tentativa de suicídio que não levou em frente graças ao gosto de amoras, à
vivência da natureza. Nesse ponto específico não pude deixar de pensar em
Riobaldo.
Apesar da forte carga temática, o
filme não resvala em
sentimentalismos. Ao contrário, o tempo todo predomina a razão,
representada pela aridez da paisagem e pelos olhares e silêncios do
protagonista. Inclusive nos momentos primorosos que expressam a angústia da
possível morte vindoura, como as vezes em que o homem se pega a observar as
aves sobrevoando cadáveres de animais, ou quando, agachado no meio de uma obra,
as sombras das pedras desabando simulam magistralmente seu próprio
sepultamento.
Há um epílogo desnecessário, com
uma cena dos bastidores da filmagem em um clima de leveza antitético ao que
fora mostrado até então. Causa certa estranheza, mas não diminui os efeitos de
uma obra de grande impacto reflexivo.
Maybe you did. Maybe you walk. / Maybe I drive to get off, baby. |
Por Ricardo Pereira
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