"There's a fear I keep so deep / Knew it name since before I could speak (...) If some night I don't come home / Please don't think I've left you alone"- Keep The Car Running, Arcade Fire

sábado, 31 de março de 2012

Sopranos - muito além da máfia


Durante minha infância e parte da minha adolescência, minha série favorita era Anos Incríveis (Wonder Years), as angústias e alegrias de Kevin Arnold somadas ao tom nostálgico dos episódios proporcionavam grande identificação. Mais recentemente, Lost fez minha cabeça, os mistérios sucessivos e, principalmente, a quantidade de bons personagens construídos me deixavam alucinado a cada fim de temporada. Sou dos que achou o final satisfatório, mas, quase dois anos após o fim, penso que, se a série tivesse terminado ao fim da terceira temporada, seria perfeita. Sim, continuei envolvido nos três anos seguintes, e o melhor episódio da série para mim, “The Constant”, faz parte da quarta temporada, porém penso que nada do que veio depois se iguala ao que foi contado na primeira metade do seriado. Ainda assim, pensava ser Lost o que de melhor havia sido criado especialmente para a televisão... Até assistir a Sopranos.

Passei os últimos três meses acompanhando o desenrolar da trama envolvendo a família Soprano e saio desta jornada com a certeza de ter sido a melhor série a que já assisti e, provavelmente, a melhor já realizada. Primeiro motivo, o fato de, em seus 86 episódios, a série manter os 100% de aproveitamento, não há um episódio ruim, que esteja ali “pra cumprir tabela”. É interessante como todos os personagens e sub tramas inseridas têm importância ou consequências dentro da narrativa.

A segunda razão é o excelente personagem que é Anthony Soprano. Interpretado magistralmente por James Gandolfini, Tony Soprano é um personagem complexo e extremamente humano, real. Esse realismo e humanidade, aliás, é o que diferencia Sopranos de clássicos sobre a máfia como, por exemplo, O Poderoso Chefão, homenageado do começo ao fim do seriado. Aqui não há o glamour dos Corleone, nem a violência estilizada ou a idealização da criminalidade. Soprano é um homem que, chefiando uma importante família da máfia americana, tem que lidar com questões como sua depressão, o isolamento proporcionado pelo poder, a pressão decorrente do cargo e conflitos normais de uma família qualquer de classe média alta.

E aí está a grande questão: mais do que sobre a máfia, Sopranos é uma série sobre família. Pouco a pouco o espectador se vê inserido no núcleo dos Soprano, no relacionamento conflituoso de Tony com a mãe, na inveja de seu tio ressentido, na preocupação com os filhos, com as loucuras da irmã e na relação com a esposa, Carmela, ‘dividida’ sempre com casos esporádicos. E, nessa, é impossível não se afeiçoar ao protagonista, mesmo que às vezes não concordemos com ele.

O elenco da série também é fantástico. Steve Van Zandt, Tony Sirico, Vincent Curatola, Lorraine Bracco, Steve Buscemi e Steve Schirripa, entre outros, dão vida a personagens inesquecíveis, de modo que ficamos acostumados aos maneirismos e jeitos de falar de grande parte deles. A trilha sonora é outro ponto forte de Sopranos, desde as canções preferidas de Tony, fã de rock n’ roll, às músicas que encerram tradicionalmente os episódios.

Quanto ao controverso final, gostei bem. É coerente com o desenvolvimento de todo o seriado que termine do jeito que terminou e é, de certa forma, um alívio que os espectadores possam decidir algumas importantes questões.

Sopranos deve ser assistida por todos que se interessam pela cultura popular recente, e, quem vai pensando encontrar apenas histórias sobre a máfia, vai se deparar, na verdade, com uma narrativa sobre como lidar com as loucuras de se viver nesses estranhos primeiros anos de século. Imperdível.

"You've seen your birth, your life & death; you might recall all of the rest...
 Por Ricardo Pereira

2 comentários:

  1. Muito bom, caro mano. Devo destacar, no entanto, que a sua heresia de colocar Lost atrás de Sopranos. Considero que não gozava de suas completas faculdades mentais devido à recente emoção do fim de Sopranos. Dessa vez passa.rs

    Fábio

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  2. haha Pô, Fabinho, entendo sua revolta por tudo que passamos com Lost. Mas, analisando racionalmente, Sopranos é mais série do que Lost, mais bem resolvida, ao menos na minha opinião. Mas isso vai ser bom de discutir num barzinho com umas geladas pra animar o debate hehe

    Abraço!

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