Hoje Bob Dylan veio me visitar,
apareceu pra beber comigo.
O dia começou estranho desde
cedo, uma solidão que não era só minha. Em um tempo em que a tristeza e a
melancolia deram um tempo de mim, resolveram aparecer juntas sem motivo
aparente. E, durante o dia, liguei umas sete vezes para meus pais; troquei
mensagem com meu amigo Hugo a respeito do livro que ele me emprestou – um pouco
responsável pelo clima disso tudo –; senti vontade de falar com o Pedro, com
meus irmãos. Um modo de não estar tão só no meu canto que normalmente me é mais
do que suficiente.
Cheguei a casa com este sentimento
de incompletude. Amigos de longa data preparando-se para beber a trezentos quilômetros
de distância e minha garota também longe saindo para se divertir com amigos só
aumentaram minha solidão. Até que a campainha toca e Dylan aparece com um
punhado de boas cervejas e as palavras sempre oportunas.
Bebemos juntos, assistimos
futebol, apresentei Cartola a ele – aprovadíssimo –; escutamos Wilco, ele disse
que algumas daquelas canções ele teria escrito aos 30; sobre o Radiohead,
comentou que é provavelmente o que faria se tivesse 30 hoje em dia. Não gosta de
comentar a própria obra, por mais que eu insista... Mostrei-lhe a versão do
Jeff Tweedy para “Simple Twist of Fate”, não proferiu uma palavra, percebi a
aprovação apenas pelo brilho de seu olhar.
Comecei a falar da importância do
Blood on the tracks para mim, o disco
que contém “tudo o que um ser humano pode aprender sobre o amor”, segundo li em
algum lugar que não me lembro agora. Ele julgou a afirmação estúpida e zombou
dos que cultuam toda a dor presente naquelas dez canções.
À medida que fomos ficando bêbados,
seus conselhos pareceram cada vez mais incompreensíveis e encantadores. Sua
voz impregnou de tal forma meus pensamentos, suas frases ecoavam de tal maneira
em minha mente, que não percebi sua retirada. O jogo havia acabado, as cervejas
também, já não me sentia tão só.
Como um mantra ou um disco
arranhado, uma voz roufenha e alcoolizada ocupava meu pensamento: “all that you
can do is do what you must”.
E, desta forma, pude dormir em
paz.
Por Ricardo Pereira
A cara dele falar mal do Blood on the tracks...
ResponderExcluirAcho que ele se sente exposto demais no que há nas faixas ensanguentadas... Como algo que alguem escreve sobre si e depois não quer ler...
As vezes o David Crosby aparece na minha casa também... Não enchemos a cara: Falamos sobre o tempo... As vezes outro cara que escreve demais também aparece na P. do Jardim. Esse a Lú pode ver também. Com esse não apenas falamos, mas vivemos o tempo!
Poxa, Cecel, obrigado, lindo comentário!!
ResponderExcluirExatamente isso sobre o Dylan, e nosso amigo bigode (o gringo, mas tb o Belch hehe) vez ou outra me visita e sempre fala de você!
Abraço
Ricardo
Lindo texto.
ResponderExcluir